Antonio Celso Nunes Nassif vê incerteza na garantia de diploma e na oferta de ensino de qualidade
No dia 28 de agosto foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria n.º 365, da Secretaria de Regulação e Supervisão
da Educação Superior do MEC, autorizando o funcionamento do curso de Medicina da Faculdade Ingá (Uningá), com a disponibilização
de 100 vagas anuais no período diurno. O Ministério da Educação (MEC), que em 2008 indeferiu a solicitação de abertura do
curso, foi temporariamente derrotado pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da Primeira Região, que concedeu permissão de funcionamento
após a apelação cível interposta pela instituição.
"O Paraná tem um bom sistema médico de ensino. Não temos problemas estruturais no mesmo nível de outros estados. Porém,
com a situação atual do curso de Medicina da Uningá, que recebeu autorização judicial para funcionar, abre-se um precedente
para que outras entidades, interessadas apenas no viés econômico, corram para a justiça para requerer o mesmo direito", afirma
Antonio Celso Nunes Nassif, doutor em Medicina, membro da Comissão de Especialistas do Ensino Médico do MEC e ex-presidente
da Associação Médica Brasileira.
Antonio Celso Nunes Nassif é responsável pelo site
href="http://www.escolasmedicas.com.br" target="_blank">"Escolas Médicas", que traz informações sobre o panorama da
educação médica no País. De acordo com ele, estão previstas mais duas escolas no Paraná, uma em Francisco Beltrão e outra
em Foz do Iguaçu, ambas nos campi da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste). "A saída para a implantação desses
cursos é a abertura na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que permite que os conselhos estaduais de educação
autorizem cursos criados e patrocinados pelas universidades estaduais. Nesses casos, o MEC não pode interferir".
Porém, o problema maior não está na abertura de vagas através de universidades públicas - o que vem acontecendo também
em outros estados -, mas na concessão de autorização para entidades privadas, como é o caso da Uningá. "Esta exceção é prejudicial.
O MEC precisa agir rapidamente, pois o maior interesse dessas instituições privadas é o econômico, e aí está o problema, pois
não há garantia efetiva de um ensino de qualidade". O MEC já entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a
autorização dada pelo TRF. "Outro problema é a demora na Justiça. Enquanto esses processos tramitam, alunos estão sendo mal
preparados. Além da incerteza de garantia do diploma, a preparação para a prática médica é desestruturada e incerta", afirma.
Vagas adicionais regulares?
De acordo com a Edital n.º 10, de 23 de agosto de 2011, a Uningá divulgou a abertura de mais 300 vagas para o curso de
Medicina. Enquanto a decisão judicial referiu-se à liberação de 100 vagas anuais, para início de curso, a Uningá interpretou
a liminar como possibilidade de preencher também as cadeiras do 2.º, 3.º e 4.º anos, já que em 2012 a única turma atual do
curso de Medicina estará iniciando o 5.º ano.
Com a decisão do TRF, o MEC precisou publicar a portaria autorizando a abertura de 100 vagas. "Essa é a ordem oficial.
Mas, é possível que haja irregularidades na oferta dessas cadeiras adicionais. Teoricamente não poderiam ter alunos de segundo
e terceiro ano, pois quando o curso foi barrado pelo MEC, foi permitido apenas que a turma que iniciou continuasse até o fim.
Mas, pelo jeito, parece que houve migração de alunos de outros cursos, como Odontologia e Enfermagem", afirma Antonio Celso
Nunes Nassif.
Projeto do governo compromete qualidade
No dia 30 de agosto, durante uma aula inaugural de um curso de Medicina em Pernambuco, Dilma Rousseff anunciou que o governo
pretende formar mais 4.500 médicos por ano e interiorizar a profissão. A presidente já solicitou aos ministérios da Educação
e da Saúde um "plano nacional de educação médica", a ser apresentado até outubro desse ano, com o objetivo de suprir a falta
de médicos no país, principalmente no interior.
"É um erro querer corrigir as distorções do SUS criando mais médicos. Ao invés de fazer esse plano nacional de ensino
superior, deveriam fazer um plano nacional de avaliação do ensino médico no Brasil. Precisamos descobrir com precisão a qualidade
dos médicos que estão sendo formados. Mais 4.500 médicos ao ano, como foi anunciado, é uma loucura. É formar profissionais
sem qualidade", comenta Antonio Celso Nunes Nassif.
De acordo com o ex-presidente da Associação Médica Brasileira, o Ministério da Saúde está querendo obrigar o médico a
permanecer dois anos no interior, em uma falsa tentativa de suprir a deficiência do sistema de saúde pública nessas regiões.
"Não tem como suprir a falta de médicos com profissionais mal formados. Não é assim que consertaremos o sistema de saúde no
País. É com qualidade de formação e estrutura", afirma.
Hoje, o Brasil forma cerca de 16 mil médicos por ano. "Não precisamos de mais. Se deixar, o governo formará 20 mil por
ano. Precisamos de médicos bem formados e que tenham estrutura para trabalhar. É preciso uma equipe completa para atender
as demandas de saúde de uma região. O médico não trabalha sozinho". Ainda conforme Antonio Celso Nunes Nassif, essa tentativa
de aumentar o número de cadeiras nos cursos de Medicina no Brasil é resultado de uma força política que quer jogar a culpa
da deficiência da saúde nos médicos para dar uma resposta à sociedade. "Ou se faz um projeto decente ou não sairemos desse
círculo. Precisamos fazer uma avaliação eficiente das 181 escolas no Brasil e ter liberdade de ação mediante o resultado avaliado".