20/07/2009
Taxa de cesarianas cresce na rede privada de saúde
Aumento contraria iniciativas do governo para diminuir índice de cirurgias.No ano passado, 84,5% dos partos cobertos
por planos de saúde foram cesarianos; em 2004, a taxa era de 79%, e no SUS a taxa é de 31%
Apesar das iniciativas do governo federal para diminuir a taxa de cesarianas na rede privada, a ANS (Agência Nacional
de Saúde Suplementar) registrou aumento de 2004 a 2008.
No ano passado, 84,5% dos partos cobertos por planos de saúde foram cesarianos. Em 2004, a taxa era de 79%. No SUS,
essa proporção é de 31%. A Organização Mundial da Saúde recomenda máximo de 15%.
Além de ser um procedimento mais caro e que demanda maior tempo de recuperação, a cesárea acarreta mais riscos para
a mãe e para o bebê.
Neste período de aumento na já alta proporção em planos de saúde, a ANS fez campanhas a favor do parto normal e passou
a usar a taxa de cesarianas como um dos critérios de avaliação das operadoras.
A agência também incluiu no rol de procedimentos cobertos pelos planos a presença de uma enfermeira e de um acompanhante
durante o parto, fatores associados a um aumento dos partos normais.
Mas as ações ainda não surtiram efeito, e o país, em vez de se aproximar da meta de reduzir cesarianas, teve aumento.
Para Martha Oliveira, gerente da ANS, a taxa de cesarianas ainda não cai porque há vários fatores que influenciam a
preferência de médicos, e até de gestantes, por essa prática.
"Os patamares ainda estão muito altos. É preciso mudar a cultura médica, a estrutura dos hospitais e até mesmo a formação
dos profissionais para trabalharem com parto normal."
Ela diz, no entanto, que há sinais positivos: "Há maior mobilização de mulheres e o CFM (Conselho Federal de Medicina)
montou uma comissão para tratar da questão".
José Maia Vinagre, coordenador da comissão de parto normal do CFM, reconhece que o percentual de cesarianas no Brasil
foge do padrão.
Ele diz, no entanto, que não se pode colocar toda a culpa no médico. Em sua avaliação, é comum as gestantes preferirem
a cirurgia, por acharem que o parto normal é mais doloroso.
O ginecologista Thomaz Gollop, professor da USP, diz que as cesarianas aumentam não só no Brasil, mas também nos Estados
Unidos e na Europa, porque a cirurgia é cada vez mais simples e muitas mulheres optam por ela.
Os especialistas citam como motivo para o percentual ser tão mais alto na rede privada no Brasil o fato de que o parto
costuma ser feito por um médico particular, que acompanha a mulher por toda a gestação.
No SUS, e em outros países com taxas menores, é mais comum o parto ser feito por um plantonista. Como o parto normal
tende a demorar mais, o médico particular, muitas vezes, opta pela cesariana porque, assim, não precisa desmarcar um dia inteiro
de atendimento em seu consultório.
Por essa razão, Maia Vinagre diz que a comissão de parto normal sugeriu mudanças como o aumento da remuneração de médicos
por parto normal e a criação de serviços de referência em hospitais privados. Esses serviços fariam o primeiro atendimento
a gestantes em início de trabalho de parto.
Maia Vinagre aponta ainda a formação médica como um dos entraves para reduzir cesarianas. "Normalmente, as maternidades
onde os alunos aprendem são de alto risco, com maioria de partos cesarianos."
Gollop discorda neste ponto: "Nas faculdades brasileiras, também ensina-se o parto normal como a melhor via. O problema
é a dissociação entre o que é ensinado e o que se pratica depois no setor privado."
Para ter parto normal, grávida troca de médico
Quando engravidou pela primeira vez, Renata Rose, 35, que está grávida novamente, trocou de médico para garantir que sua
opção pelo parto normal seria respeitada. "Era meu ginecologista há dez anos, mas, quando fomos conversar sobre o parto, ele
começou falando que o melhor era planejar o nascimento antes de 36 semanas, pois uma outra paciente que preferiu esperar perdeu
o bebê. Achei aquilo um terror desnecessário", conta.
No caso de Paula Vargas, 28, o médico foi mais direto. "Ele me disse que não fazia parto normal porque o plano de saúde
pagava apenas R$ 500 pelo procedimento."
Maria de Lourdes Teixeira, professora de ioga de Paula e Renata e que há 31 anos trabalha com gestantes, diz que as
grávidas estão mais conscientes de seus direitos.
"Tenho conversado muito com as gestantes para não se colocarem numa posição de pacientes. Elas são clientes e têm direitos",
diz.
Olivia Tolentino, 29, cujo filho nasceu no ano passado nos EUA, faz um relato diferente. Ela diz que a médica estranhou
sua pergunta sobre o melhor tipo de parto.
"Ela me disse que a cesariana não era uma opção, mas uma indicação médica, e me alertou que o plano não pagaria o parto
se eu fizesse cesariana apenas por vontade própria."
Olivia diz que várias amigas ficaram grávidas ao mesmo tempo no Brasil. "Me surpreendeu que, no Brasil, todas diziam
preferir parto normal, mas, por algum motivo, fizeram cesáreas."
Pesquisa da Fiocruz com 430 mulheres atendidas em hospitais particulares do Rio mostra que, no início da gestação, mais
de 70% diziam preferir parto normal, mas apenas 10% conseguiram.
Fonte: Folha de São Paulo