Defasagem no valor dos recursos repassados pela União causa déficit de R$ 5 milhões por mês na rede estadual de atendimento
público
Nos últimos dois anos, 39 de 69 municípios paranaenses que recebem recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) para atendimentos
de média e alta complexidade - como consultas, exames, internações e transplantes - não tiveram um único centavo de reajuste
dos valores repassados pelo governo federal. Segundo a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) e o Conselho de Secretarias Municipais
de Saúde do Paraná (Cosems-PR), o déficit mensal do sistema de saúde pública no estado é de R$ 5 milhões.
De acordo com dados do Sistema de Controle de Limite Financeiro da Média e Alta Complexidade (Sismac), do Ministério da
Saúde, foram repassados R$ 1,017 bilhão aos municípios paranaenses neste ano para custeio e investimentos - 22% a mais que
o total repassado em 2010. Esse aumento, porém, atendeu apenas 22 das 69 cidades. Para a gestão direta do governo estadual,
o aumento teria sido de 13% (R$ 747 mil em 2012 ante R$ 662 mil há dois anos).
Apesar desses reajustes, tanto municípios quanto estado dizem que os repasses do SUS para procedimentos de alta e média
complexidade estão defasados. O rombo motivou, inclusive, a formalização de uma carta de reivindicações, batizada de Carta
de Cornélio Procópio, que foi encaminhada ao Ministério da Saúde no último dia 14.
Descaso
Segundo Márcia Huçulak, superintendente de Atenção à Saúde da Sesa, o governo federal não tem cumprido com a parte que
lhe cabe no financiamento da saúde no estado. "O ministério deveria financiar 50% das ações de saúde, mas hoje temos políticas
nas quais ele financia 40% e, às vezes, até 30% do custo", afirma.
Para Antônio Carlos Nardi, secretário de Saúde de Maringá e presidente do Cosems-PR, o déficit dos repasses do SUS impedem
maiores investimentos no setor. "Se esse recurso [da União] fosse ampliado, poderíamos melhorar o atendimento à demanda do
sistema. É um déficit que vem vindo há mais de um ano e meio sem recomposição suficiente."
Mesmo tendo encaminhado o pleito, Márcia reconhece ser difícil que a União aumente o teto do SUS no estado com o orçamento
atual. "Se o governo federal colocasse 10% [das receitas correntes brutas da União para a saúde pública] ampliaria em mais
de R$ 35 bilhões por ano seus investimentos na saúde", argumenta.
O movimento Saúde-10, idealizado por servidores, técnicos e gestores da saúde de todo o Brasil, tenta coletar 1,5 milhão
de assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular que assegure repasse efetivo e integral de 10% das receitas brutas
da União para a saúde pública.
Questionado a respeito do pedido paranaense, o Ministério da Saúde informou que os pleitos ainda estão em avaliação das
áreas técnicas e, por isso, não poderia dar mais detalhes.
Paraná almeja cobertura total do Samu
Os municípios do Paraná também pediram ao governo federal que seja estabelecido um cronograma para implantação da Rede
de Urgência e Emergência (Samu) e da Rede Cegonha em todo o estado. A prioridade atual das redes é para municípios de regiões
metropolitanas brasileiras. "Como os investimentos já foram anunciados, as pessoas acham que o gestor municipal não consegue
os recursos. Hoje, Maringá já tem o Samu, mas são os municípios vizinhos que seriam mais beneficiados com a implantação dessas
redes na região", explica Antônio Carlos Nardi, secretário de Saúde de Maringá e presidente do Cosems-PR.
A Rede de Urgência e Emergência foi lançada na gestão do ex-presidente Lula. Neste ano, de acordo com dados do Sismac,
serão destinados R$ 73,2 milhões para implantá-la em cinco municípios da Região Metropolitana de Curitiba (RMC).
Gestantes
Já a Rede Cegonha, que visa melhorar o atendimento de gestantes antes, durante e após o parto, conta com R$ 9,3 bilhões
para serem investidos até 2014. No Paraná, estão habilitados os mesmos cinco municípios da RMC, mas apenas três deles já têm
recursos garantidos (R$ 14,9 milhões em 2012).
Segundo Márcia Huçulak, superintendente de Atenção à Saúde da Sesa, Helvécio Miranda Magalhães Júnior, secretário nacional
de Atenção à Saúde, esteve no 28.º Congresso do Cosems-PR e teria dito que a Rede Cegonha será aberta para Maringá, Londrina
e Guarapuava. O Ministério da Saúde, porém, não confirmou.
Confira a lista dos municípios
que tiveram reajuste zero.
Desequilíbrio
Custos aumentam, mas repasses não
Fernando Mânica, doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP), diz que a concentração da receita tributária
com a União causa um desequilíbrio financeiro do sistema de saúde do país e os reajustes necessários para cobrir despesas
do sistema muitas vezes não são garantidos. "Como a maior parte da receita tributária vai para a União, é ela quem formula
políticas públicas. Com isso, estados e municípios precisam se adequar às exigências feitas por ela." Segundo o especialista,
a cobrança dos municípios paranaenses tem razão. "A saúde, por ser gratuita, não tem reajuste garantido pelo Estado, ao contrário
do que ocorre em muitos serviços públicos pagos pela população, como energia, saneamento...", afirma.
Fonte: Gazeta do Povo