15/07/2014

Quadros médicos

Editorial da Folha de S. Paulo

Já há algum tempo formou-se um consenso entre especialistas em saúde pública: é prioritário enfrentar o deficit de médicos nas periferias das metrópoles e em áreas distantes dos centros urbanos.

Se parece forçoso buscar redistribuir no território nacional os profissionais já existentes, é necessário, ao mesmo tempo, formar um número maior de pessoas aptas a praticar a medicina --o que demanda a abertura de novos cursos.

De um ponto de vista superficial, o governo Dilma Rousseff parece dedicar atenção ao tema. A atual gestão já liberou a criação de 44 cursos, o que equivale a 76% do total autorizado nos mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e ultrapassa em 63% os aprovados na administração Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

Um olhar um pouco mais aprofundado, contudo, basta para diagnosticar problemas nesse quadro. Especialistas manifestam, com razão, receios quanto à qualidade do ensino nessas instituições.

Fazer a saúde pública avançar vai muito além de multiplicar as vagas no ensino superior --uma das principais diretrizes do programa Mais Médicos, lançado com estardalhaço por Dilma no ano passado.

No campo educacional, é fundamental, por exemplo, proporcionar condições mínimas para que os formados tenham um bom nível.

Não se trata de aspecto trivial; mesmo em São Paulo os jovens profissionais ficam aquém do recomendável. No último exame do Conselho Regional de Medicina, 59% dos graduandos foram incapazes de acertar 60% das questões.

Reverter esse quadro depende de bons professores e de estrutura básica para a aprendizagem da medicina. Encaixam-se nessa categoria as recomendações de que todas as universidades disponham de hospitais-escola e de que as vagas de residência médica sejam ampliadas e se tornem obrigatórias.

Não basta, aliás, fazer intervenções na academia. Oferecer condições adequadas de trabalho é uma forma de incentivar médicos a buscar trabalho em zonas afastadas dos grandes centros.

Sem que contem com o atrativo dos resultados imediatos, contudo, é improvável que o governo se dedique a essas tarefas. Nesse ritmo, o país até poderá formar mais médicos, mas poucas pessoas desejarão se tratar com a maioria deles.

Editorial publicado em 15/07/2014 no jornal Folha de S. Paulo

* As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

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