30/08/2013
Medida anunciada por prefeitos e secretários de saúde pode ameaçar a principal bandeira do plano: a redução da carência de médicos nesses lugares
Para aliviar as contas dos municípios, médicos contratados por diferentes prefeituras no país serão trocados por profissionais do Mais Médicos, programa do governo Dilma Rousseff (PT) para levar estrangeiros e brasileiros para atendimento de saúde no interior e nas periferias.
Na prática, a medida anunciada à Folha por prefeitos e secretários de saúde pode ameaçar a principal bandeira do plano: a redução da carência de médicos nesses lugares.
A reportagem identificou 11 cidades, de quatro Estados, que pretendem fazer demissões para receber as equipes do governo federal. Segundo as prefeituras, essa substituição significa economia, já que a bolsa de R$ 10 mil do Mais Médicos é totalmente custeada pela União.
O plano de Dilma foi lançado em julho e provocou polêmica na classe médica principalmente devido à vinda de estrangeiros --incluindo 4.000 cubanos, que devem ser deslocados para 701 cidades que não despertaram interesse de ninguém na primeira fase do Mais Médicos.
Outro atrativo alegado por prefeituras para a troca de equipes é a fixação desse novo médico no município por um período mínimo de três anos. Prefeitos reclamam da alta rotatividade dos médicos, que não se adaptam à falta de estrutura nessas localidades.
As cidades que já falam em trocar suas equipes estão no Amazonas (Coari, Lábrea e Anamã), Bahia (Sapeaçu, Jeremoabo, Nova Soure e Santa Bárbara), Ceará (Barbalha, Cascavel, Canindé) e Pernambuco (Camaragibe).
Hoje, as prefeituras recebem da União cerca de R$ 10 mil por equipe no programa Saúde da Família. Complementos de salários e encargos, porém, são pagos com recursos de cada cidade.
Um exemplo é Coari, no Amazonas, a 421 km de barco de Manaus, onde a prefeitura paga R$ 25 mil para médicos recém-formados e R$ 35 mil para os especialistas.
"Somos obrigados a pagar esse valor ou ninguém aceita. Vamos tirar alguns dos nossos médicos e colocar os profissionais que chegarão do Mais Médicos", diz o secretário da Saúde, Ricardo Faria.
A prefeitura diz que vai demitir um médico de seu quadro para trocá-lo por outro que chegará já na primeira fase do programa federal.
Plano igual ao de Lábrea (a 851 km de Manaus), que tem seis médicos. "Pago R$ 30 mil para cada um deles. [Substituí-los] diminuiria os gastos da prefeitura", diz o prefeito Evaldo Gomes (PMDB).
Infográfico sobre a substituição de mão de obra.
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“Se possível, botaríamos todos pelo Mais Médicos”, diz secretário
Em Barbalha (a 564 km de Fortaleza), dois médicos contratados pela prefeitura serão demitidos para dar lugar a outros dois do Mais Médicos. Ela é uma das quatro do Ceará que confirmaram à Folha que farão a substituição.
"Eles só serão dispensados quando os novos se apresentarem, para poder fazer a permuta", afirmou a secretária-adjunta de Saúde do município, Desirée de Sá Barreto.
Dos quatro profissionais do programa Mais Médicos a que Camaragibe, na região metropolitana do Recife, terá direito, apenas dois são novos. Os outros já estão na cidade e vão deixar de receber pela prefeitura para ter o salário pago pelo governo federal.
A troca de médicos da prefeitura por outros do Mais Médicos é aprovada pelo secretário da Saúde do município, Caio Melo.
Dos 42 médicos que atuam na atenção básica do município, metade, segundo a Secretaria de Saúde, não é concursada. A ideia é substituí-los gradativamente pelos contratados pelo ministério.
"Se fosse possível, botaríamos todos [pelo] Mais Médicos, porque não teríamos o custo do salário mensal dos profissionais."
Além da economia, Melo aponta a obrigação de cumprir horários como outro benefício, já que os médicos serão acompanhados pelo governo federal.
MINISTRO
A possibilidade de que houvesse troca de mão de obra era uma preocupação do Ministério da Saúde.
Em audiência na Câmara, no dia 14, o ministro Alexandre Padilha afirmou que os quadros das prefeituras são monitorados para evitar que isso ocorra. "Esse programa é Mais Médicos, não troca de médico", disse à época.
Fonte: Folha de S. Paulo