11/07/2006
Portaria 971 gera reação das entidades médicas pelos riscos à saúde e à vida
Polêmica
A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde, implementada há pouco
mais de dois meses com a edição da Portaria 971 continua gerando muita polêmica e reações de repúdio e resistência das entidades
médicas representativas, que denunciam o aval do Ministério da Saúde para que os pacientes da rede pública tenham acesso a
uma assistência barateada, sendo levados a terapias sobre as quais não existem evidências científicas de eficácia. Apesar
de toda a pressão emanada da própria sociedade e sob o alerta do meio médico do que é entendido como gesto de irresponsabilidade
pelos riscos iminentes à população, o Ministério da Saúde ainda não dá indicativos de aceitar a reformulação da norma, deixando
o temor de que sua posição estará atrelada aos reflexos da "experiência".
A Portaria 971 tem origem em proposta elaborada pelo corpo técnico do MS, com referendo do Conselho Nacional de Saúde,
mas sem levar em consideração a opinião das entidades médicas. Com a política, a recomendação é para que secretarias estaduais
e municipais de saúde implementem os chamados tratamentos alternativos, alcançando áreas como acupuntura, homeopatia, fitoterapia
e termalismo. Com isso, abriu a possibilidade - por exemplo de a acupuntura ser aplicada no SUS por qualquer profissional
de saúde, ignorando-se que o disgnóstico clínico prévio ao tratamento é ato privativo do médico. Como advertem os especialistas
da área, é um procedimento invasivo que pode provocar até morte quando realizado sem diagnóstico ou com diagnóstico incorreto.
O Conselho Federal de Medicina e seus Regionais, a Associação Médica Brasileira, a Fenam e as Sociedades de Especialidade
tem se manifestado oficialmente pela contrariedade aos efeitos da Portaria Ministerial, tema hoje presente em todos os eventos
médicos no País e com perspectiva de chegar à esfera da Justiça. Os Conselhos de Pernambuco e Espírito Santo já editaram Resoluções
que proíbem médicos a participarem de equipes que adotem a Portaria 971. Também outros Conselhos, como de São Paulo, Maranhão
e Paraná repudiam a política adotada no SUS por entendê-la como grave risco à saúde e à vida das pessoas e que deixa "a opção
perigosa de atendimento sem qualidade e segurança mínima necessária para tratamento dos pacientes". As instituições vêem ainda
na medida uma afronta à Constituição, por estabelecer paliativo num sistema de origem universal, integral e igualitário, e
também ao movimento médico que visa a sua regulamentação.
O presidente do Conselho de Medicina do Paraná, Hélcio Bertolozzi Soares, exibe seu inconformismo: "Grandes são as nossas
bandeiras e maiores as dificuldades de sua implementação. A Portaria 971, do Ministério da Saúde, é verdadeira afronta aos
interesses da sua assistência, na melhor qualidade do diagnóstico e do tratamento aos pacientes do Sistema Único de Saúde.
A decisão adotada em maio último, sob amparo do Conselho Nacional de Saúde, revela, realmente, que para aqueles que buscam
os serviços do SUS não precisam de médicos para atendê-los.
Infelizmente, o exercício da medicina não exercido por médicos
expõe a saúde da população. Não é só a acupuntura e a homeopatia que perdem nesse momento. Isto representa o primeiro passo
para se investir na desqualificação da assistência àqueles menos aquinhoados pela cultura e pelo poder de escolha."
O dirigente alerta que o exercício de qualquer ato médico por aqueles não habilitados pode representar riscos à saúde
da população. E adverte: "O ato médico que está implícito nessa Portaria será a porta de entrada para que tenhamos cada vez
mais a hipótese, por exemplo, de Casas de Parto, em que não se conta com participação de nenhum médico, ainda mais considerando
que se trata de uma especialidade que prima pelo sistema de urgência e emergência.Estejamos todos nós, médicos e pacientes,
atentos para as decisões de nossas competências, para salvaguardar as incompetências daqueles detentores das decisões de governo.
Endossamos a postura do Dr. Edson de Oliveira Andrade, presidente do CFM, durante audiência pública no Senado, que insistiu
que nós médicos apenas queremos a isonomia e um tratamento igualitário às demais profissões de saúde, em relação à definição
de nossas competências. Não precisamos - e tampouco pretendemos - que nos sejam ofertadas vantagens ou privilégios."
Preocupação com comércio de cursos
Os efeitos da Portaria 971, em especial os tratamentos oferecidos por pessoas inabilitadas, a proliferação do comércio
de cursos e os riscos a que a população está sendo exposta, foram motivo de reunião de representantes da Sociedade Médica
Brasileira de Acupuntura, Seção do Paraná, com a Presidência do CRM-PR. O encontro ocorreu na manhã de 6 de junho último,
com deliberação de ações conjuntas para melhor esclarecer a sociedade sobre a maleficência da proposta de oferta de terapias
alternativas, praticadas por pessoas sem a formação adequada e sem responsabilidades por seus atos, e pelas conseqüências
previsíveis.
Na análise dos representantes da Sociedade, o movimento que se legaliza é o de comércio de cursos associado ao estímulo
ao charlatanismo. Imediatamente após a edição da Portaria, vários cursos começaram a ser divulgados e que, com certeza, não
poderão oferecer formação adequada pois sequer são exigidos requisitos mínimos. Ressaltam os especialistas que a parte da
população com menor poder de discernimento será a mais prejudicada pela ação desses "técnicos", imunes aos rigores da lei
que alcançam os profissionais efetivamente habilitados e preparados para atuar.
A reunião no Conselho, com o presidente Hélcio Bertolozzi Soares, teve as participações do presidente da Sociedade do
Paraná, João Gabriel Felippe, do vice Mauro Carbonar, da secretária-geral Cláudia H.U. Manuel, do tesoureiro Francisco Vairo
e do diretor-superintendente Augusto Vebia.
Ameaça a população porque:
Prevê que profissionais da saúde, não-médicos, possam diagnosticar, prescrever e realizar tratamentos em Acupuntura
e Homeopatia, especialidades médicas reconhecidas que exigem conhecimentos e técnicas específicas.
Introduz no SUS práticas sem nenhuma evidência científica ou valor terapêutico comprovado, a exemplo do "termalismo
social/crenoterapia" e de plantas medicinais.
Privilegia tratamentos que, sem diagnóstico prévio seguro, podem retardar a assistência correta e colocar em
risco os pacientes diante da possibilidade de evolução da doença.
A prática de atos médicos por pessoas não habilitadas configura exercício ilegal da Medicina e pode representar
sérios riscos à saúde e à vida da população.
Alerta-se aos médicos que a prática de "terapias" não comprovadas pela comunidade médica e científica caracteriza infração
ética no exercício profissional da Medicina.