05/01/2023
País já conta com 389 cursos e mais de 40 mil vagas de ingresso. Suspensão de norma restaura moratória prevista no Mais Médicos, mas existem mais de 200 pedidos de liminar para abertura de escolas
O CRM-PR realiza sessão plenária temática na próxima quinta-feira (12/01), a partir de 13h30 e em formato presencial e online, com o objetivo de debater o cenário atual dos cursos de Medicina, num momento em que a revogação de portaria do MEC, editada ao final do governo anterior, restaura a legislação que mantém até o início de abril a moratória de abertura de escolas decretada em 2018. No mesmo compasso, vê-se na iminência de o Supremo Tribunal Federal decidir sobre a constitucionalidade ou não de artigo da Lei do Mais Médicos, o que tende a refletir em pelo menos duas centenas de ações em trâmite judicial visando criação de cursos e vagas sem conexão com as demandas do SUS.
A 90ª plenária temática está a cargo da Comissão de Ensino Médico e terá a apresentação do conselheiro e professor José Knopfholz, presente nas discussões nacionais sobre formação e que atua como avaliador da Comissão de Acreditação de Escolas Médicas da Abem e CFM. No dia 4, em meio à repercussão da revogação da Portaria 1.061/2022 do MEC, o tema já tinha merecido análise preliminar durante a 12ªreunião da Comissão de Ensino do CRM-PR, deliberando-se pela exposição junto à comunidade médica para fortalecer posição em prol da qualidade da formação e de ações objetivas para fixação de profissionais nos – hoje – vazios assistenciais, como infraestrutura de serviços, carreira médica e acesso a recursos tecnológicos e de atualização de conhecimento.
CONFIRA ENTREVISTA DO PRESIDENTE DO CFM SOBRE O TEMA.
Entendendo a questão
O conteúdo da Portaria 1.061, embora publicada somente no final do governo Bolsonaro, foi definido ainda em meados de 2022, em consonância com o que foi debatido pelo Grupo de Trabalho (GAT) envolvendo todos os atores interessados no tema, incluindo Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação, Inep, CFM, AMB, Conselho Nacional de Educação, Abem, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) e pesquisadores com expertise no assunto.
A Portaria buscou redefinir o padrão decisório para autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos superiores de Medicina. Observou parâmetros do modelo do programa Mais Médicos, criado em há uma década no governo de Dilma Rousseff (PT) e que, em 2019, foi substituído pelo Médicos pelo Brasil. Neste formato, a abertura de cursos se restringia ao chamamento público e de fortalecimento do SUS, em direção oposta ao modelo convencional, de via administrativa, sustentado em indicadores de avaliação de qualidade e alheio à observância dos requisitos sociais.
Como anunciado pelo novo ministro da Educação, a portaria foi revogada para que possa ser melhor avaliada. Na concepção do CFM, que também realizou reunião interna em 4 de janeiro, a norma definia conceitos fundamentais para a área, contemplando critérios para o bom desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem da Medicina. Dados do CFM indicam que, hoje, são 389 escolas médicas no Brasil, distribuídas em quase 250 municípios. Juntas, as instituições oferecem 41,8 mil vagas por ano. Do total de cursos, 42,9% (167) foram criados depois de 2013, sendo que 53,4% (208) estão no Sul e no Sudeste. Do total, 81,1% (315) estão em capitais e municípios de grande porte.
Atualmente, duas ações paralelas tramitam no Supremo Tribunal Federal sobre a abertura de cursos de Medicina ou de autorização para ampliação de vagas. E seguem direções opostas quanto à constitucionalidade ou não de artigo da Lei do Programa Mais Médicos. Na iminência de uma decisão, o ministro Gilmar Mendes realizou, em 17 outubro de 2022, audiência pública para ampliar a análise do tema, o que vai refletir nas muitas ações com pedido de liminar que visam assegurar abertura de cursos e vagas sob aval da justiça. A Portaria do MEC, revogada, propunha “combater” esse caminho. São 205 ações, 18 delas propondo novos cursos para o Paraná, cinco somente em Curitiba, onde já existe igual número de escolas em atividade e ofertam 759 vagas de ingresso. O total de escolas no Estado é de 21 (12 privadas, seis estaduais e três federais), com 2.279 vagas/ano.
Com a revogação da portaria, ficam restabelecidos os efeitos da “moratória” determinada pela Lei do Mais Médicos, que se estende até 5 de abril (observe-se que 52 escolas foram abertas desde a tal moratória, em 2019; nenhuma no Paraná). De acordo com estatísticas, o Brasil conta com proporção populacional e de médicos compatível com países do Primeiro Mundo. Os indicadores projetam 25% a mais de médicos a cada cinco anos, com o que os atuais 550 mil profissionais passarão de 1 milhão no próximo já na década seguinte, posicionando o Brasil (que já é o segundo em número de cursos, perdendo só para Índia) num dos países com maior patamar da relação médico/habitantes, mas, a considerar o cenário de hoje, com ínfimo investimento per capita em saúde e consequente precária infraestrutura.
De acordo com análise de entidades que participaram do GAT (grupo de trabalho), a Portaria 1.061 tinha em sua essência componentes para resolver a questão que está hoje para ser julgada no STF e, ainda, oferecer caminho de avanço no modelo de abertura de cursos médicos, em investimentos nos serviços públicos regionais e no planejamento de vagas em residências médicas mais necessárias, dentro do previsto Plano de Qualificação de Residências Médicas. Outro importante diferencial seria o Plano de Contrapartidas à rede local de saúde. Assim, a instituição mantenedora do curso deveria destinar ao menos 10% de sua receita bruta auferida a título de mensalidades e cobradas na forma da Lei 9.870/1999, alcançando infraestrutura de serviços, ações, programas e infraestrutura de saúde que tenham conexão com o funcionamento do curso e que constem do Plano de Inserção na Rede Local de Saúde. Além disto, o Plano de Oferta de Bolsas previa a destinação de bolsas de estudos integrais, no quantitativo de 10% do total das vagas ofertadas a cada ano, para estudantes que preenchessem os critérios fixados.
Como debatido pelos integrantes da Comissão, sem entrar no mérito dos dois modelos de abertura de escolas médicas, o principal aspecto está fincado na qualidade da formação, que vem sendo prejudicada exatamente pela ausência de instrumentos legais assertivos sobre o processo de inauguração de cursos e vagas, controle das diversas etapas até a conclusão e retaguarda com estrutura técnica, hospital-escola e corpo docente qualificado. Foi nesta seara que surgiu o Sistema de Acreditação de Escolas Médicas (SAEME-CFM), onde são reafirmados os compromissos com o exercício profissional ético e a formação de médicos competentes e adequados às necessidades do País. Em outra vertente, ressurge a preocupação com tentativas de suprir regiões desabastecidas de assistência com a figura física do médico, nem sempre com o preparo técnico, recursos e supervisão de que necessita. As entidades da classe médica são enfáticas ao combaterem o quantitativo em detrimento do qualificativo, que inclui as retaguardas secundárias e terciárias aos profissionais lançados à linha de frente dos serviços primários.
A Comissão
A Comissão de Ensino Médico do CRM-PR, criada pela Portaria 002/2022, é integrada pelo conselheiro-presidente Roberto Issamu Yosida e pelos conselheiros Maurício Marcondes Ribas, José Knopholz, Carlos Roberto Naufel Junior e Alcindo Cerci Neto, todos professores de cursos de Medicina. Também acompanham os trabalhos o vice-presidente Wilmar Mendonça Guimarães e o secretário-geral Luiz Ernesto Pujol.
CONFIRA A ÍNTEGRA DA RESOLUÇÃO 1.061/2022, QUE FOI REVOGADA.
Plenária Temática sobre Cursos Médicos
O Conselho de Medicina do Paraná convidou para a Plenária Temática os coordenadores de cursos de Medicina do Estado, representantes das Sociedades de Especialidade, Associação Médica do Paraná, Sindicato dos Médicos, Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), Federação das Unimeds do Paraná e Unimed Curitiba. Os representantes das mais de 100 representações regionais do CRM-PR foram convidados a participar da apresentação do atual cenário da formação, bem como todos os demais profissionais médicos interessados, desde que previamente inscritos, pois há limitação no número de vagas pelo sistema remoto.