26/03/2020

Pandemia é a maior da história recente e exige isolamento social, diz presidente da SBI

Médico paranaense Clóvis Arns da Cunha entende que não é possível prever prazos para relaxamento de medidas de combate ao novo coronavírus e que ações no Paraná são positivas

Presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o médico e professor Clóvis Arns da Cunha participou na tarde de quarta-feira (25 de março) de entrevista coletiva com jornalistas do Paraná por meio de uma vídeoconferência, promovida pelo Hospital Nossa Senhora das Graças, de Curitiba. No bate-papo com a imprensa, deu uma série de esclarecimentos sobre a COVID-19, doença provocada pelo novo coronavírus, e também tratou de ressaltar a gravidade do momento, destacando que essa é “a maior pandemia da nossa história recente”.

“É a maior pandemia da nossa história recente. Nenhum de nós estávamos aqui na gripe espanhola. Na ocasião, até o Presidente da República, Rodrigues Alves, morreu. Para nossa geração, essa está sendo a pior. Por isso é importante que a população confie nessas medidas (que o Ministério da Saúde e as Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde estão tomando). Estamos muito preocupados com o impacto social, mas é o seguinte: ou tomamos essas medidas agora, ou depois vai ser pior e vamos ter de tomar medidas ainda mais duras.”

De acordo com o professor da UFPR, Clóvis Cunha, na maior parte dos pacientes, algo em torno de 80%, a doença vai se manifestar de maneira leve, como se fosse um resfriado, uma gripe ou mesmo uma pneumonia leve, que não leva à falta de oxigênio. Já 15% terão de ir para o hospital, sem necessidade de internação em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs); e outros 5% terão a forma crítica, necessitando, então, ir para a UTI.

Sobre a necessidade da adoção do isolamento social em larga escala, com a manutenção em funcionamento apenas dos serviços essenciais, ele explica que a doença é facilmente transmitida e que o contágio, se não controlado, acontece como numa progressão geométrica, exponencial.

“Essa Covid tem sua principal transmissão por gotículas aéreas. Quando a pessoa tem a doença, tosse, espirra, pode transmitir o vírus. Por isso, o cuidado número um é que os pacientes sejam isolados em casa, não fiquem junto do convívio de outras pessoas. Se tiver domicílio de um quarto, que (a pessoa) fique a um metro de distância daqueles pacientes com sintomas respiratórios”, recomenda o especialista. “Outra medida importante é a higienização das mãos, com água e sabão ou álcool 70.”

clique para ampliarclique para ampliarMédico paranaense Clóvis Arns da Cunha, presidente da Sociedade de Infectologia. (Foto: Arquivo)

Necessidade de isolamento social

Ainda segundo o presidente da SBI, o contágio da doença acontece de forma exponencial. Uma pessoa com o vírus, por exemplo, transmite para outras três, que irão transmitir para outras três (já seriam nove infectados), que irão ainda transmitir para outras três. Por isso, segundo ele, é necessário, a partir da constatação de que já há transmissão comunitária em todo o país, a adoção de restrições sociais e medidas de isolamento.

“O vírus chegou na transmissão comunitária no Brasil e semana passada se observou o aumento vertiginoso, quase exponencial, dos pacientes com a doença. Chega a dobrar a cada dois ou três dias. A partir deste momento é importante a restrição social, é absolutamente necessário (permanecer em casa)."

Ainda conforme o médico, a comparação do Covid-19 com um resfriado ou uma gripe não é adequada. Primeiro por conta da mortalidade da nova doença, estimada em torno de 3% e que chega a 15 e até mesmo 20% entre as populações de risco, principalmente idosos.

“No Paraná e em Curitiba, vamos ter uma situação ímpar de evitar esse aumento exponencial do contágio do vírus, achatando a curva e fazendo com que o número de casos seja pequeno e os de óbitos, menor. Temos de olhar para os outros países, replicar o que deu certo e evitar o que deu errado.”

Elogios ao ministro da Saúde

Nos últimos dias, em especial depois do pronunciamento feito pelo Presidente Jair Bolsonaro, aumentaram as especulações sobre uma possível demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Na visão de Clóvis Cunha, porém, o médico e político tem feito um trabalho “muito bom” na gestão da crise do coronavírus.

“Fomos convidados para participar dos debates, todas essas medias que o ministério está tomando agora, incluindo fechar as escolas, comércio não essencial, indústria, foi muito discutido. O ministro Mandetta foi muito feliz, está mantendo toda a sociedade médica envolvida. Várias reuniões por teleconferência, principalmente para tratar dos EPIs, como usar, quando usar. E também discutimos sobre os testes diagnósticos. O Ministério da Saúde está tomando medidas muito adequadas”, diz o especialista.

Curitiba e o Paraná podem surpreender positivamente

A estimativa da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) é de que o Paraná registre cerca de 30 mil casos no pico da doença. As medidas que estão sendo tomadas no âmbito estadual e municipal, contudo, dão esperança de que o número de casos seja menor.

“A preocupação maior, hoje, é São Paulo e o Rio de Janeiro. Por outro lado, em Curitiba e no Paraná vamos ter uma chance única, em termos de ser confiante nessa medida, por ter feito o lockdown, fechado tudo que não é essencial, de evitar que essas cidades tenha a mesma situação que São Paulo está vivendo hoje. Talvez a gente possa se surpreender, positivamente, graças a essas medidas que foram tomadas. Estou otimista que talvez a gente não chegue ao pico de 30 mil casos em poucas semanas.”

Ainda segundo ele, o grande problema para a saúde pública é justamente ter um número de casos muito grande em pouco tempo. “Vivemos nisso na H1N1, foi quase um caos na saúde pública. Você não tem médico para atender pronto socorro, não tem UTI, leito hospitalar para internar. Se nada fosse feito, o pico no Brasil aconteceria entre duas e quatro semanas. Com todas essas medidas, em uma semana teremos a ideia se as medidas foram eficazes, porque o período de incubação do vírus é curto. Ao longo dessa semana, começo da próxima, os números já vão dizer por si se conseguimos controlar essa curva, ou se mesmo tomando todas as medidas drásticas, e a Itália, a Espanha, estão passando por isso, a curva não reduziu.”

Isolamento social deve durar de quatro a quatro semanas, mostra experiência de outros países

Baseando-se principalmente na experiência chinesa, o presidente da SBI estima que o período de isolamento social no Brasil deva durar entre quatro e seis semanas, podendo chegar a até dois meses.

“Hoje a China não tem mais casos novos de Covid, ou os que têm são pacientes que vieram de fora da China, casos importados. Na China, todo esse processo, principalmente na região de Wuhan, levou em torno de oito semanas. No Brasil, acredito que serão de quatro a seis semanas isolamento social. Mas o Brasil é país continental, tem vários outros pontos que podem interferir. Podemos ter medidas distintas para diferentes regiões do país. As medidas não precisam ser uniformes, desde que cada secretaria de saúde municipal e estadual possa conhecer sua epidemiologia, possa fazer testes. Se não tivermos testes diagnósticos, não tem como fazer uma previsão epidemiológica correta.”

Ainda de acordo com ele, na medida em que a curva de contágio for achatando, a normalidade será retomada gradativamente. “Nesse momento de ascensão da transmissão comunitária, fica em casa. A curva achatou, começa a liberar gradativamente. Vamos fazer um lockdown progressivo para que as pessoas possam voltar. Quem é mais velho, tem, comorbidade, deve ficar mais tempo (em isolamento)”.

Quem deve usar máscara cirúrgica?

Por fim, o uso das máscaras cirúrgicas são recomendadas para pacientes com sintomas respiratórios. “Quem está tossindo, com dor de garganta, quem está espirrando. Claro, tem aquelas pessoas que sempre espirraram, tem rinite alérgica. Mas se começou com dor de gargante, febre, síntomas de uma síndrome gripal, pode transmitir e aí tem de usar a máscara.”

Fonte: Bem Paraná

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