28/10/2010

Os obstetras têm motivos para comemorar?

30 de outubro é o dia do obstetra. O nascimento de um filho é o um momento maravilhoso na vida de todo ser humano. Às vezes a gestação é bem planejada, às vezes surge de surpresa - fruto de um amor ardente. Às vezes acontece na adolescência, inconsequente curiosidade sem responsabilidade. Seja da maneira que for, a espera de um filho traz uma enorme alegria e ansiedade que são extensivos a todos os familiares. Mães e pais, avôs e avós de primeira viagem! Tudo novidade: - é menino? - é menina? Será loirinho? Olhos azuis ou orientais como o pai?

E surge uma enxurrada de gastos. Tem de pintar o quarto do bebê, comprar o enxoval, o berço branquinho laqueado, as lembrancinhas, o cestinho, os sapatinhos, as roupinhas.

E o obstetra? Esse é escolhido a dedo, indicado por uma colega de trabalho, por um amigo. Não importa: tem de ser atencioso, competente, prestativo, esclarecer todas as dúvidas, fornecer o celular e estar disposto a atender qualquer queixa emergencial. Tem que dar o carinho e a atenção como se você fosse sua melhor amiga e ao mesmo tempo ter o conhecimento e transmitir toda a segurança de que você precisa.

E o plano de saúde? Paga "tudo". Você já parou para pensar o que seu plano de saúde realmente paga? Quanto você acha que seu obstetra deveria receber pela responsabilidade de cuidar de você e do seu bebê durante os nove meses em que ocorrem tantas transformações no seu corpo e na sua mente?
Intercorrências acontecem: diabetes, hipertensão, sangramentos em qualquer fase da gravidez, rotura da bolsa, descolamento de placenta, trabalho de parto falso, a terrível eclâmpsia.
Afinal quanto vale o trabalho de seu obstetra? Quanto você pagaria pela tranqüilidade e segurança em ter um profissional que abdica de sua própria família para atender esse seu momento?

Vamos aos fatos: os planos de saúde há muito tempo não reajustam os honorários médicos. Nos últimos 10 anos a Agência Nacional de Saúde (ANS) concedeu correção dos valores mensais pagos aos planos de saúde de aproximadamente 131%, para uma inflação calculada em 90% (IPCA). Para os médicos, entretanto, concedeu uma correção nos valores de honorários de menos da metade da concedida aos planos:aproximadamente 60%. Ou seja, o médico é a única classe de trabalhadores neste país cujo trabalho feito hoje vale menos da metade do realizado há dez anos.

Os valores são pagos segundo uma tabela de valor fixo. A maioria dos convênios adota a Tabela da Associação Medica Brasileira, edição de 1992. Poucos adotam a CBHPM - que é a mais nova tabela editada pela Associação Médica Brasileira. Os poucos convênios que a adotam lançam mão de um redutor nos valores que os planos pagam ao médico. Esse redutor é cerca de 30 % a menos do valor de honorário lançado na ultima edição da CBHPM de setembro de 2008, a qual já está defasada dois anos.

Não importa se sua gestação é normal, de alto risco. O Obstetra recebe exatamente a mesma coisa. Então se sua gestação der muito ou pouco trabalho, seu obstetra receberá exatamente a mesma coisa.

Sabe aquela emergência em que você sangrou ou que achou que a bolsa tinha rompido e passou no consultório para o médico dar uma olhadinha? Seu médico não ganhou nada por isso. Para seu plano de saúde isso não importa e preocupa menos ainda se seu médico está com a agenda lotada, sobrecarregado, insatisfeito e trabalhando de graça.

Você tem idéia de quanto as operadoras de saúde pagam aos obstetras? Sabe que para fazer uma cesariana o médico ganha menos que num parto normal e muitas vezes ganha menos do que a instrumentadora?

Sabe que para atender uma paciente com direito a internação em acomodação do tipo quarto coletivo ou enfermaria os médicos recebem metade do valor do que em acomodação individual ou tipo apartamento?

Os valores pagos pelos honorários de atendimento de cesariana giram em torno de R$ 180 e o médico auxiliar recebe 30% do valor do cirurgião, neste caso R$ 54. Existem planos que pagam melhor. Um ótimo plano de saúde, desde que a acomodação seja individual, pode remunerar em torno de R$ 1.000 o parto. Mas esses planos são raras exceções em consultórios.

Nós obstetras não temos o que comemorar. Estamos sendo humilhados pelos planos de saúde. Desvalorizados, mutilados em nossa essência. Não é de estranhar que um percentual elevado de médicos deixou de atender obstetrícia. Ou ainda, aumentam o índice de cesariana no Brasil, pois vergonhosamente marcam cada vez mais cirurgias eletivas- são mais rápidas e não se corre o risco de cancelar outro compromisso. Nós médicos obstetras estamos de luto.


PARABÉNS A TODOS OS MÉDICOS QUE AJUDAM UMA VIDA
A SE TRANSFORMAR EM DUAS. VIVA O OBSTETRA!



Artigo publicado no Jornal Gazeta do Povo de autoria da Diretora de Defesa Profissional da SOGIPA -
Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Paraná, Dra. Dulce Cristina P Henriques. E-mail: dulcehen@gmail.com.

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