18/10/2014
Mauricio Marcondes Ribas
Dia do Médico pressupõe uma oportunidade para o profissional comemorar, confraternizar com familiares e amigos ou simplesmente sonhar com novos cenários para si ou para o exercício da atividade, voltado sempre ao melhor para os pacientes. Talvez, sendo um sábado, seja um pouco diferente da rotina que lhe exige conhecimento atualizado, destreza, paciência e disponibilidade. Porém, à espera da maioria, inevitavelmente, estarão o convívio com o sofrimento alheio, a sobrecarga de trabalho e toda a gama de dificuldades hoje impostas à boa prática da medicina.
Ossos do ofício”, direis. É verdade. Afinal, a medicina é um desafio, pois a conduta médica está sob observação e avaliação constante. Exige do praticante um comportamento exemplar, benevolente, cordial, compassivo, solidário e, sobretudo, com o uso da técnica adequada para cada caso. Foi sob essas expectativas que a “instituição médico” construiu seu alicerce de credibilidade e foi alçada à condição de protagonista das diretrizes na atenção à saúde da população.
A histórica luta de garantia de infraestrutura e condições de igualdade e equidade na qualidade de assistência à população, sob norte de nossa Constituição, foi corroída sob a falsa propaganda de que nossos médicos viraram as costas para os vazios assistenciais abertos nas regiões carentes. Ao que parece, salvo-conduto para se implementar programa eleitoreiro, satisfazer ideologias e dar vazão a outros interesses não claros ainda.
A classe médica não é contra a presença de médicos graduados no exterior, desde que comprovadas as suas competências para bem atender a população. Também não é contra a abertura de escolas, desde que assegurada a formação de qualidade. Sem visão estratégica para o futuro da assistência médica e da medicina, nossos governantes estimulam a abertura desenfreada de cursos médicos, colocando o Brasil, hoje com suas 242 escolas, na liderança mundial proporcionalmente ao índice populacional. Projeta, assim, um futuro iminente com médicos insuficientemente preparados e ausência de docentes capacitados a formar as novas gerações.
Lamentamos que os avanços tecnológicos e científicos da Medicina que elevaram a expectativa de vida dos seres humanos não encontraram o mesmo eco no campo político, em que pese o grito de insatisfação com a saúde levado às ruas. Parece que a doença a ser combatida está na ignorância política há muito semeada na sociedade, desprezando direitos cidadãos e impondo desigualdades na assistência à saúde. O item inaugural dos princípios fundamentais do nosso código de ética ensina que “a medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza”. Assim, não podemos ser benevolentes com ações ou decisões que contrariem os ditames éticos e também constitucionais da saúde como dever do Estado e direito de todos.
Por certo, a questão da saúde é muito mais complexa que a comoção pelas mortes desveladas às falhas da assistência. Envolve saneamento, equilíbrio social, segurança e, sobretudo, a educação em toda a sua essência, que inclui a construção de consciência de que a vida não tem preço, mas a doença sim. E custa muito.
Qual o médico que queremos? O bem formado, humanista e ético, de compromisso com as pessoas, que, via de regra, são os que construíram a história da medicina do Paraná que nos orgulha. São 35 mil profissionais sob os registros do Conselho, quase 22 mil em plena atividade. Qual o paciente que queremos? Que tenha pleno acesso à assistência, que exercite sua autonomia e cidadania incluindo-se nos espaços de poder decisório , que adote hábitos saudáveis e esteja atento a todo o aparato de informações técnicas hoje disponíveis em benefício da sua saúde. Para ambos, médico e paciente, queremos a relação de transparência e respeito sob a gestão de saúde tratada com responsabilidade.
Mauricio Marcondes Ribas é presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná.