03/04/2017
Miguel Srougi
A medicina exige sacrifícios e comprometimento permanente, características frequentemente ignoradas ou incompreendidas pela sociedade
A medicina oferece aos seus principais protagonistas um privilégio sem paralelo na existência humana: a chance de aliviar o sofrimento e resgatar seres para a vida. A sensação proporcionada por esses momentos é arrebatadora e isso acontece no cotidiano da vida médica.
Infelizmente, esses momentos não se perenizam porque os médicos são frequentemente açodados pelas imperfeições da natureza humana e pelos efeitos de uma sociedade injusta e desigual, dirigida por governantes incapazes de compreender que sem saúde não existem seres livres.
Profissão que exige o comprometimento pessoal permanente, a separação da família e a convivência com o sofrimento. E que, muitas vezes, é vítima de incompreensões desapiedadas da sociedade, que nem sempre reconhece as limitações da medicina ou a existência de fatos inexoráveis que envolvem a existência humana, como a morte inexorável, a decadência pelos anos ou a ocorrência de doenças sem cura.
Como atenuar esses aspectos menos inebriantes da profissão? Não tenho dúvidas: expondo honestamente as imperfeições que envolvem a ciência médica e os seus profissionais, frágeis como os outros seres. Muito mais do que isso, denunciando o apequenamento daqueles que nos dirigem, com a dignidade que a posição de médico nos confere. Sem a vergonha de protestar, de espernear e fazendo brotar na sociedade a consciência crítica e os sentimentos da cidadania e da indignação.
E sempre lembrando o arcebispo Desmond Tutu: “Se ficarmos neutros numa situação de injustiça, teremos escolhido o lado do opressor”.
Artigo escrito por Miguel Srougi, Professor titular de Urologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e Presidente do Conselho do Instituto Criança é Vida, publicado no blog Letra de Médico, da Revista Veja, no dia 28/03/2017.
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