14/08/2006

Onde andará o meu doutor?

Hoje acordei sentindo uma dorzinha,


aquela dor sem explicação, e uma palpitação,


resolvi procurar um doutor,


fui divagando pelo caminho...


lembrei daquele médico que me atendia vestido de branco


e que para mim tinha um pouco de pai, de amigo e de anjo...


o Meu Doutor que curava a minha dor,


não apenas a do meu corpo mas a da minha alma,


que me transmitia paz e calma!



Chegando à recepção do consultório,


fui atendida com uma pergunta:


QUAL O SEU PLANO? O MEU PLANO?


Ah, o meu plano é viver mais e feliz!


é dar sorrisos, aquecer os que sentem frio


e preencher esse vazio que sinto agora!


Mas a resposta teria que ser outra...




o MEU PLANO DE SAÚDE...


Apresentei o documento do dito cujo


já meio suado, tanto quanto o meu bolso, e aguardei...


Quando fui chamada corri apressada,


ia ser atendida pelo Doutor,


aquele que cura qualquer tipo de dor,


entrei e o olhei, me surpreendi,


rosto trancado, triste e cansado...


será que ele estava adoentado?


é, quem sabe, talvez gripado


não tinha um semblante alegre,


provavelmente devido à febre...


dei um sorriso meio de lado e um bom dia...


sobre a mesa, à sua frente, um computador,


e no seu semblante a sua dor,


o que fizeram com o Doutor?




Quando ouvi a sua voz de repente:


O que a senhora sente?


Como eu gostaria de saber o que ELE estava sentindo...


parecia mais doente do que eu, a paciente...


Eu? ah! sinto uma dorzinha na barriga e uma palpitação


e esperei a sua reação,


vai me examinar, escutar a minha voz


auscultar o meu coração...


para minha surpresa apenas me entregou uma requisição e disse:


peça autorização desses exames para conseguir a realização...


quando li quase morri...




TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA,


RESSONÂNCIA MAGNÉTICA


e CINTILOGRAFIA!




ai, meu Deus! que agonia!


eu só conhecia uma tal de abreugrafia...


só sabia o que era ressonar (dormir),


de magnético eu conhecia um olhar...


e cintilar só o das estrelas!


estaria eu à beira da morte? de ir para o céu?


iria morrer assim ao léu?


naquele instante timidamente pensei em falar:


terá o senhor uma amostra grátis


de calor humano para aquecer esse meu frio?


que fazer com essa sensação de vazio? e observe,
Doutor,


o tal Pai da Medicina, o grego Hipócrates, acreditava que


A ARTE DA MEDICINA ESTAVA EM OBSERVAR.




Olhe para mim...


bem verdade que o juramento dele está ultrapassado!


médico não é sacerdote...


tem família e todos os problemas inerentes ao ser humano...


mas, por favor, me olhe, ouça a minha história!v

preciso que o senhor me escute, ausculte


e examine!




estou sentindo falta de dizer até aquele 33!


não me abandone assim de uma vez!


procure os sinais da minha doença e cultive a minha esperança!


alimente a minha mente e o meu coração...


me dê, ao menos, uma explicação!v

o senhor não se informou se eu ando descalça... ando sim!


gosto de pisar na areia e seguir em frente


deixando as minhas pegadas pelas estradas da vida,


estarei errada?


ou estarei com o verme do amarelão?


existirá umas gotinhas de solução?




será que já existe vacina contra o tédio?


ou não terá remédio?


que falta o senhor me faz, meu antigo Doutor!


cadê o Sccot, aquele da Emulsão?


que tinha um gosto horrível mas me deixava forte


que nem um Sansão!


e o Elixir? Paregórico e categórico,


e o chazinho de cidreira,


que me deixava a sorrir sem tonteiras?


será que pensei asneiras?




Ah! meu querido e adoentado Doutor!


sinto saudades


dos seus ouvidos para me escutar,


das suas mãos para me examinar,


do seu olhar compreensivo e amigo...


do seu pensar...


o seu sorriso que aliviava a minha dor...


que me dava forças para lutar contra a doença...


e que estimulava a minha saúde e a minha crença...


sairei daqui para um ataúde?


preciso viver e ter saúde!


por favor, me ajude!




Oh! meu Deus, cuide do meu médico e de mim,


caso contrário chegaremos ao fim...


porque da consulta só restou uma requisição


digitada em um computador


e o olhar vago e cansado do Doutor!


precisamos urgente dos nossos médicos amigos,


a medicina agoniza...


ouço até os seus gemidos...




Por favor, tragam de volta o meu Doutor!


estamos todos doentes e sentindo dor...


e peço, para o ser humano, uma receita de calor,


e para o exercício da medicina uma prescrição de amor!



Tatiana Bruscky é médica e mora em Recife (PE) -tbruscky@yahoo.com.br

Publicada no Portal do Envelhecimento no mês de março de 2006.

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