23/04/2019

Novo Código de Ética Médica estabelece limites, compromissos e direitos a profissionais e pacientes

Versão atualizada do documento prevê, entre outros temas, o respeito à autonomia do paciente, a preservação do sigilo profissional e o direito de o médico exercer a profissão de acordo com sua consciência

O respeito à autonomia do paciente, inclusive na fase da terminalidade da vida; a preservação do sigilo profissional na relação entre médico e paciente; o direito de o médico exercer a profissão de acordo com sua consciência; e a possibilidade de recusa de atender em locais com condições precárias, que expõem ao risco pacientes e profissionais. Esses são alguns dos pontos previstos no novo Código de Ética Médica que o Conselho Federal de Medicina (CFM) apresentou em coletiva nesta terça-feira (23), em Brasília.

NOVO CÓDIGO MANTÉM PROIBIÇÃO A CONSULTAS À DISTÂNCIA OU POR COMUNICAÇÃO DE MASSA  

clique para ampliarclique para ampliarNovo Código de Ética Médica foi apresentado nesta terça-feira (23) em coletiva de imprensa realizada pelo CFM (Foto: CFM)
Trata-se da versão atualizada de um conjunto de princípios que estabelece os limites, os compromissos e os direitos assumidos pelos médicos no exercício da profissão. O início da vigência (em 30 de abril) acontece 180 dias após a publicação da Resolução CFM Nº 2.217/2018 no Diário Oficial da União (DOU), que aconteceu no dia 1º de novembro do ano passado.

Essa é a etapa final de um processo de quase três anos de discussões e análises que atualizaram a versão anterior que vigorava desde abril de 2010 (Resolução CFM Nº 1.931/2009). Os debates, que foram abertos à participação de toda a categoria médica – seja por meio de entidades ou pela manifestação individual dos profissionais – permitiram modernizar o texto anterior, incorporando artigos que contemplam mudanças decorrentes de avanços científicos e tecnológicos, assim como novos contextos na relação em sociedade.

Avanços

Para facilitar a compreensão das novas diretrizes, o novo texto mantém o mesmo número de capítulos, que abordam princípios, direitos e deveres dos médicos. Entre as principais novidades está o respeito ao médico com deficiência ou doença crônica, assegurando-lhe o direito de exercer suas atividades profissionais nos limites de sua capacidade e também sem colocar em risco a vida e a saúde de seus pacientes.

Também ficou definido que o uso das mídias sociais pelos médicos será regulado por meio de resoluções específicas, o que valerá também para a oferta de serviços médicos à distância mediados por tecnologia.

Placebo e Sigilo

clique para ampliarclique para ampliarConselheiros do CFM Nemésio Tomasella de Oliveira (à esquerda), Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti e Donizetti Dimer Giamberardino Filho (representante do PR) (Foto: CFM)
No âmbito das pesquisas em medicina, o novo Código de Ética Médica manteve a proibição do uso do placebo de maneira isolada em experimentos, quando houver método profilático ou terapêutico eficaz.

Outro avanço incorporado ao Código é a obrigação da elaboração do sumário de alta e entrega ao paciente quando solicitado (documento importante por facilitar a transição do cuidado de uma forma mais segura, orientando a continuidade do tratamento do paciente e realizando a comunicação entre os profissionais e entre serviços médicos de diferentes naturezas).

Da mesma forma, o CEM autoriza o médico, quando for requisitado judicialmente, a encaminhar cópias do prontuário sob sua guarda diretamente ao juízo requisitante. No código anterior, esse documento deveria ser disponibilizado ao perito médico nomeado pelo juiz.

Tradição 

O processo de revisão do CEM aliou o espírito inovador à preservação dos princípios deontológicos da profissão, possibilitando a discussão, avaliação e manutenção de avanços instituídos no código de 2009 e dos princípios basilares da atividade médica previstos em versões anteriores e na história da ética médica.

Entre as diretrizes mantidas, estão a consideração à autonomia do paciente e o respeito à sua dignidade quando em estado terminal, a preservação do sigilo médico-paciente e a proteção contra conflitos de interesse na atividade médica, de pesquisa e docência.

Diretrizes

clique para ampliarclique para ampliarJosé Fernando Maia Vinagre (esq.), corregedor-geral do CFM e coordenador adjunto da Comissão Nacional de Revisão, Carlos Vital, presidente, e Hermann von Tiesenhausen, 1º secretário (Foto: CFM)
“Tanto na revisão do Código realizada em 2009, como desta vez, mantemo-nos fiéis às diretrizes norteadoras estabelecidas em 1988, baseadas na dignidade humana e na medicina como a arte do cuidar”, ressalta o coordenador da Comissão Nacional de Revisão do Código de Ética Médica e presidente do CFM, Carlos Vital, ao avaliar a forma de condução dos trabalhos.

Com o intuito de assegurar o cumprimento do Ato Médico, o Código de Ética garante ainda a valorização do prontuário como principal documento da relação profissional; a proibição à cobrança de honorários de pacientes assistidos em instituições que se destinam à prestação de serviços públicos; e o reforço à necessidade de o médico denunciar aos CRMs aquelas instituições públicas ou privadas que não ofereçam condições adequadas para o exercício profissional ou não remunerem digna e justamente a categoria.

“Valores de personalidade somente são possíveis em uma sociedade que efetivamente inclui. E, no nosso Código de Ética Médica, esses valores estão presentes: dignidade, privacidade, imagem, intimidade e honra”, disse José Eduardo de Siqueira, também membro da Comissão Nacional.

Debates abertos a toda a categoria médica subsidiaram a revisão do Código de Ética Médica

A atual revisão resulta de uma ampla discussão com a classe médica, iniciada em março de 2016. Com o objetivo de garantir a participação qualificada da comunidade médica e da sociedade, um processo de consulta pública foi aberto em julho daquele ano para que médicos e entidades organizadas da sociedade civil pudessem expressar suas opiniões e sugestões.

Foram realizados 671 cadastros e encaminhadas 1.434 propostas até o prazo-limite de 31 de março de 2017. As sugestões recebidas puderam indicar alteração, inclusão ou exclusão de texto do código em vigor. Elas foram analisadas pela Comissão Nacional e pelas Comissões Estaduais de Revisão do Código de Ética Médica.

O trabalho foi coordenado pelo CFM e contou com a participação dos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), conselheiros, representantes de entidades e consultores especialistas das áreas de Bioética, Filosofia, Ética Médica e Direito, entre outras, os quais formaram a Comissão Nacional e as Comissões Estaduais de Revisão. Foram promovidos, além das reuniões de trabalho locais e nacionais, três encontros regionais e três nacionais para debater e deliberar sobre exclusão, alteração e adição de itens ao texto vigente.

Encontros

Os encontros regionais aconteceram no final do ano de 2016. O primeiro (Nordeste) aconteceu em 25 de outubro, em Recife (PE); o segundo (Sul e Sudeste), em 29 de novembro, em São Paulo (SP); e o terceiro (Norte e Centro-Oeste), em 16 de dezembro, em Brasília (DF).

As três conferências nacionais aconteceram nos anos de 2017 (março) e 2018 (abril e agosto), esta última deliberando em votação eletrônica a redação final dos textos incorporados.

“Trata-se de um momento significativo do movimento médico conselhal em que nos propusemos a revisar e atualizar a principal normatização do exercício médico no Brasil. Esse trabalho é fruto da contribuição da categoria médica, que participou diretamente enviando mais de mil propostas para edição deste documento”, destacou o secretário-geral do CFM, Henrique Batista e Silva.

Coordenando o processo de votação, o corregedor-geral do CFM e coordenador adjunto da Comissão Nacional de Revisão, José Fernando Maia Vinagre, destacou a honra de ter sido parte de tão importante mudança: “Participar desse processo de revisão do Código de Ética Médica é um momento que marca a minha carreira profissional. É um trabalho que repercute diretamente no cotidiano de cada médico brasileiro”.

Em 1º de novembro de 2018, menos de dois meses depois da última conferência nacional, o Diário Oficial da União trouxe o texto do novo Código de Ética Médica (CEM), que passa a vigorar 180 dias após sua publicação, em 30 de abril deste ano.

CEM 2019 é o nono a estabelecer os princípios éticos para a medicina no Brasil

A medicina brasileira é permeada há quase um século por documentos que nortearam a ética médica. Embora na história mundial tenhamos referências desde a época greco-romana, como o Juramento de Hipócrates (460-370 a.C.), no Brasil, as primeiras tentativas de codificação partiram do movimento sindical, que elaborou textos em 1929, 1931 e 1945 (veja na linha do tempo).

De fato, embora os documentos oficiais do CFM só tenham surgido a partir de 1965, existem vários outros que foram referência nesse período, como o Código de Moral Médica (1929), o Código de Deontologia Médica (1931), que já previa a criação de um “conselho de disciplina profissional” e o Código de Ética da Associação Médica Brasileira (AMB), elaborado em 1953 e considerado a última referência importante antes de passar a vigorar os códigos do Conselho Federal de Medicina, em 1965.

Ylmar Corrêa Neto, membro da Comissão Nacional de Revisão do Código de Ética Médica, ressalta, em artigo publicado em “A Medicina para além das normas”, livro editado pelo CFM em 2010, que a experiência acumulada nesse período e o estudo da história da ética médica “nos faz compreender nossas atitudes mais íntimas, o que move nossas ações perante os pacientes e o que move suas relações”.

Alguns princípios hipocráticos, por exemplo, como a relação médico-paciente alicerçada no sentimento de confiança, a não-maleficência e a beneficência, e o sigilo, resistiram ao avanço da história e ao passar dos séculos e estão presentes até hoje nos códigos contemporâneos. De fato, o juramento hipocrático é considerado até hoje um patrimônio da humanidade por seu elevado sentido moral.

Veja quais foram os documentos referenciais para a ética médica desde 1929 até agora:

LINHA DO TEMPO REVELA 90 ANOS DA ÉTICA MÉDICA NO BRASIL

1929

O Boletim do Sindicato Médico Brasileiro publica o Código de Moral Médica, uma tradução do código de mesmo nome aprovado pelo VI Congresso Médico Latino-Americano.

1931

É aprovado no 1º Congresso Médico Sindicalista o Código de Deontologia Médica, que também estabeleceu a criação de um “conselho de disciplina profissional” para “conhecer, julgar e sentenciar sobre qualquer infração as disposições do presente Código”.

1945

O Decreto-lei nº 7.955 institui os conselhos de medicina e estabelece que, enquanto não fosse instalado o primeiro conselho federal permanente, vigoraria como Código de Deontologia Médica, documento aprovado pelo IV Congresso Sindicalista Médico Brasileiro em 24 de outubro de 1944.

1953

É elaborado o Código de Ética da Associação Médica Brasileira (AMB), baseado no juramento de Hipócrates, na Declaração de Genebra de 1948 adotada pela Associação Médica Mundial (WMA, na sigla em inglês), em códigos internacionais existentes, e nas leis e regulamentos vigentes no pais e na tradição médica.

1965

Primeiro Código de Ética aprovado pelo Conselho Federal de Medicina, nos termos do Art. 30, da Lei nº 3.268 de 30 de setembro de 1957. Entrou em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União, em 11 de janeiro daquele ano.

1984

Entra em vigor um novo documento intitulado Código Brasileiro de Deontologia Médica, sob a forma da Resolução CFM nº 1.154/1984, publicada em 27 de abril daquele ano no Diário Oficial.

1988

Quatro anos mais tarde, a Resolução CFM nº 1.246/88 revoga o Código Brasileiro de Deontologia Médica de 1984. O novo texto é baseado nas propostas formuladas ao longo dos anos de 1986 e 1987 pelos Conselhos Regionais de Medicina, pelos médicos e por instituições científicas e universitárias e nas decisões da I Conferência Nacional de Ética Médica. O texto – que vigorou pelos 20 anos seguintes – foi considerado bastante avançado para a época, por contemplar questões amplas no âmbito da medicina, da saúde e da sociedade.

2009

Ano de publicação de um novo documento após um trabalho de revisão de 22 meses, sob o qual se debruçaram conselheiros e especialistas, que fizeram estudos, participaram de eventos e analisaram 2.757 sugestões de médicos, conselhos regionais de medicina (CRMs), entidades da sociedade civil organizada e instituições científicas e universitárias. Como resultado, a versão do Código de Ética Médica sob a forma da Resolução CFM nº 1.931/2009, que vigorou por nove anos – de abril de 2010 a abril de 2019.

2018

Ano de publicação do código vigente, sob a forma da Resolução CFM nº 2.217/2018. Os trabalhos de revisão duraram 18 meses e seguiram metodologia similar à revisão do Código de 2009, com ampla participação da comunidade médica e da sociedade.

Tradição e modernidade

Confira algumas das novidades do Código de Ética Médica

- O novo código transfere a regulação da telemedicina e do uso das mídias sociais para resoluções avulsas, passíveis de frequentes atualizações, impondo ao médico a obrigatoriedade do respeito às normas emanadas pelo CFM. (Cap. V Art. 37. § 1º O atendimento médico a distância, nos moldes da telemedicina ou de outro método, dar-se-á sob regulamentação do Conselho Federal de Medicina. § 2º Ao utilizar mídias sociais e instrumentos correlatos, o médico deve respeitar as normas elaboradas pelo Conselho Federal de Medicina.)

- Garante respeito ao médico com deficiência ou doença crônica, garantindo suas atividades profissionais nos limites de sua capacidade e segurança do paciente. (É direito do médico: Cap. II XI – É direito do médico com deficiência ou com doença, nos limites de suas capacidades e da segurança dos pacientes, exercer a profissão sem ser discriminado.)

Nas pesquisas, manteve a vedação ao uso de placebo isolado. (É vedado ao médico: Cap. XII Art. 106 Manter vínculo de qualquer natureza com pesquisas médicas em seres humanos que usem placebo de maneira isolada em experimentos, quando houver método profilático ou terapêutico eficaz.)

- Criou normas de proteção de sujeitos participantes em pesquisa vulneráveis. (Cap. XII Art. 101 § 1º No caso de o paciente participante de pesquisa ser criança, adolescente, pessoa com transtorno ou doença mental, em situação de diminuição de sua capacidade de discernir, além do consentimento de seu representante legal, é necessário seu assentimento livre e esclarecido na medida de sua compreensão. Cap. XII Art. 105 É vedado ao médico: Realizar pesquisa médica em sujeitos que sejam direta ou indiretamente dependentes ou subordinados ao pesquisador.)

- Nas pesquisas, passou a permitir o acesso a prontuários, sem TCLE, em estudos retrospectivos quando autorizados por comissões de ética em pesquisa em seres humanos. (Cap. XII Art. 101 § 2º O acesso aos prontuários será permitido aos médicos, em estudos retrospectivos com questões metodológicas justificáveis e autorizados pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) ou pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).)

- Institui a obrigação da elaboração do sumário de alta e entrega ao paciente quando solicitado. (Cap. X Art. 87 § 3º Cabe ao médico assistente ou a seu substituto elaborar e entregar o sumário de alta ao paciente ou, na sua impossibilidade, ao seu representante legal.)

- Agora, quando for requisitado judicialmente, deve encaminhar cópias do prontuário sob sua guarda ao juízo requisitante. (Cap. X Art. 89 § 1º Quando requisitado judicialmente, o prontuário será encaminhado ao juízo requisitante.)

Veja os pontos tradicionais que se mantiveram, entre muitos outros:

- A consideração para com a autonomia do paciente. (Cap. V Art. 31 É vedado ao médico: Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. Cap. I XXI – No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas.)

- A proteção aos ditames de consciência do profissional. (Cap. I VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente. Cap. II IX – É direito do médico: Recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência.)

- O respeito à dignidade do paciente terminal. (Cap. I XXII – Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados. Cap. V Art. 41 Parágrafo Único – Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.)

- A importância da preservação do sigilo do paciente. (Cap. I XI – O médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha conhecimento no desempenho de suas funções, com exceção dos casos previstos em lei. Cap. IX Art. 78 – É vedado ao médico: Deixar de orientar seus auxiliares e alunos a respeitar o sigilo profissional e zelar para que seja por eles mantido. Cap. X Art. 85 – É vedado ao médico: Permitir o manuseio e o conhecimento dos prontuários por pessoas não obrigadas ao sigilo profissional quando sob sua responsabilidade.)

- A proteção do paciente contra conflitos de interesse do profissional. (É vedado ao médico: Cap. III Art. 20 – Permitir que interesses pecuniários, políticos, religiosos ou de quaisquer outras ordens, do seu empregador ou superior hierárquico ou do financiador público ou privado da assistência à saúde, interfiram na escolha dos melhores meios de prevenção, diagnóstico ou tratamento disponíveis e cientificamente reconhecidos no interesse da saúde do paciente ou da sociedade.)

- A vedação à cobrança de pacientes atendidos pelo SUS. (É vedado ao médico: Cap. VIII Art. 65 – Cobrar honorários de paciente assistido em instituição que se destinam à prestação de serviços públicos, ou receber remuneração de paciente como complemento de salário ou de honorários.)

- A valorização do prontuário médico como principal documento da relação profissional. (É vedado ao médico: Cap. X Art. 87 – Deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente. § 1º O prontuário deve conter os dados clínicos necessários para a boa condução do caso, sendo preenchido, em cada avaliação, em ordem cronológica com data, hora, assinatura e número de registro do médico no Conselho Regional de Medicina.)

Direitos dos médicos estão entre os principais temas abordados no novo CEM

A nova versão do Código de Ética Médica (CEM), que entra em vigor no próximo dia 30 de abril, atualiza o conjunto de princípios que norteiam o comportamento profissional. A atualização é resultado de ampla discussão com a classe médica, alicerçada em preceitos das áreas técnico-científicas e de humanidades, como Filosofia, Sociologia, Antropologia, Teologia, Direito e Bioética.

Como resultado, o CEM é composto de 26 princípios fundamentais do exercício da medicina, 11 normas diceológicas, 117 normas deontológicas e quatro disposições gerais. A parte diceológica (dos direitos dos médicos) está entre os itens de destaque. O Capítulo II é inteiramente dedicado ao tema.

Entre os itens destaque estão o direito a exercer a medicina sem ser discriminado, o direito a recusar-se a exercer a profissão em instituição onde as condições de trabalho não sejam dignas, e o direito a recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência.

Também encontramos entre os princípios fundamentais que compõem o Código algumas prerrogativas importantes como escolher livremente os meios cientificamente reconhecidos a serem praticados para o diagnóstico e o tratamento, e a proteção para que o trabalho médico não seja explorado por terceiros com objetivos de lucro, finalidade política ou religiosa.

Estes e os demais princípios fundamentais cumprem o papel “suporte e libelo em defesa dos direitos humanos de médicos e pacientes, do meio ambiente e da liberdade individual e coletiva, fundamentados por princípios bioéticos e humanistas”, explicam os editores da revista Bioética Sidnei Ferreira e Dora Porto, em artigo publicado na edição de dezembro de 2018.

A professora Nedy Cerqueira Neves, no livro Ética para os futuros médicos, do Conselho Federal de Medicina (CFM) comenta a importância da concepção de que direitos e deveres são complementares e inseparáveis. “Não há nem pode haver direito sem dever, nem dever sem direito. De acordo com este pensamento, a deontologia e diceologia seguem como categorias axiológicas dialéticas”, ensina.

Confira na tabela abaixo os principais pontos que versam sobre os direitos dos médicos. Eles abordam garantias referentes ao exercício da profissão, das condições de trabalho, da conduta profissional do médico, além de questões como o direito a remuneração justa:

Direitos dos Médicos assegurados pelo Código de Ética Médica

- Exercício da medicina sem discriminação. 
(Cap. II I – Exercer a medicina sem ser discriminado por questões de religião, etnia, cor, sexo, orientação sexual, nacionalidade, idade, condição social, opinião política, deficiência ou de qualquer outra natureza. XI – É direito do médico com deficiência ou com doença, nos limites de suas capacidades e da segurança dos pacientes, exercer a profissão sem ser discriminado.)

- Trabalho não pode ser explorado. (X – O trabalho do médico não pode ser explorado por terceiros com objetivos de lucro, finalidade política ou religiosa.)

- Exercício da profissão em condições adequadas. (III – Apontar falhas em normas, contratos e práticas internas das instituições em que trabalhe quando as julgar indignas do exercício da profissão ou prejudiciais a si mesmo, ao paciente ou a terceiros. IV – Recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a própria saúde ou a do paciente, bem como a dos demais profissionais. V – Suspender suas atividades, individualmente ou coletivamente, quando a instituição pública ou privada para a qual trabalhe não oferecer condições adequadas para o exercício profissional ou não o remunerar digna e justamente, ressalvadas as situações de urgência e emergência.)

- Exercer a medicina conforme sua consciência. (IX – Recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência. Princípios Fundamentais: Cap. V Art. 36 § 1° - Ocorrendo fatos que, a seu critério, prejudiquem o bom relacionamento com o paciente ou o pleno desempenho profissional, o médico tem o direito de renunciar ao atendimento, desde que comunique previamente ao paciente ou a seu representante legal, assegurando-se da continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informações necessárias ao médico que o suceder.)

Código é aliado da prática médica segura

“Para exercer a medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa”. Este é um dos preceitos do novo Código de Ética Médica (CFM), que entra em vigor neste dia 30 de abril, e que exemplifica porque o documento se reafirma, década pós década, como um aliado importante para o ato médico seguro.

Entre outras diretrizes que atuam como aliadas para o exercício profissional estão o direito do médico de “apontar falhas em normas, contratos e práticas internas das instituições em que trabalhe quando as julgar indignas do exercício da profissão ou prejudiciais a si mesmo, ao paciente ou a terceiros” e o direito de “recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas”, entre inúmeras outras.

Defesa - Para Nívio Lemos Moreira Júnior, membro da Comissão de Integração do Médico Jovem do CFM, o Código de Ética Médica é um “instrumento de defesa do médico, pois quando se tem regras claras de seus direitos e deveres, o profissional fica bem protegido e consciente das ações dele do dia a dia”.

“O Código impõe limites, inclusive os próprios direitos constitucionais como o da liberdade e o da isonomia, que são direitos fundamentais, têm um limite. O limite são os direitos e as liberdades do outro, que no caso do médico, é o seu paciente. Então, o CEM é limitador, mas também é protetor da atividade médica”, ressalta Livia Maria Armentano Koenigstein Zago, membro da Câmara Técnica de Bioética do CFM.

Médico-paciente – O Código de Ética Médica incorporou ainda, em suas últimas revisões, avanços que consideram que o exercício da autonomia pelos doentes modificou definitivamente a relação médico-paciente e, em consequência, o padrão de comportamento moral do médico.

“Nós estamos discutindo cada vez mais – e o Conselho tem esse papel – a relação médico-paciente e as mudanças dessa relação, que ao invés de ser vertical, ela precisa ser mais horizontal e esse código ajuda muito nesse sentido para que possamos discutir mais amplamente, extrapolando o CEM para discutir ética e bioética das relações humanas”, defende Dirceu Bartolomeu Greco, membro da Câmara Técnica de Bioética.

Para Sigisfredo Luis Brenelli, ex-presidente (gestão 2016-2018) da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem) e membro da Comissão de Ensino Médico do CFM, a medicina muda seus conceitos em uma velocidade extremamente rápida e “nesses novos tempos, o médico tem que estar se atualizando, se adaptando e se refazendo. O Código vai te dar um norte do que é possível fazer, do que está dos limites ético-legais”.

Educação – Henrique Caetano Mingoranci Bassin, coordenador regional da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem), lembra que muito tem se discutido sobre a relação entre erro médico e a importância da educação médica na sua prevenção. Ele lembra artigo da Revista Brasileira de Educação Médica que aponta que “a insatisfatória formação ética do médico contribui para a ocorrência de desvios na conduta durante o exercício da profissão”.

Ao comentar esse tema, Beatriz Rodrigues Abreu da Costa, membro da Comissão de Integração do Médico Jovem do CFM, defende que o médico conheça o código desde a sua formação. “Esse documento vai ser o pilar e o norteamento de sua conduta, um instrumento de defesa do profissional e um norte para seguir com ética”, diz.

A opinião é partilhada por Pauline Elias Josende, presidente da Associação Nacional de Médicos Residentes (ANMR): “Vemos defasagem em muitas universidades. O médico sai da faculdade sem conhecer o seu próprio Código de Ética e isso tem repercussões na vida profissional. Se eu pudesse sugerir algo, principalmente para quem ainda está na faculdade, é que conheça o seu Código de Ética”, defende.

Fonte: CFM

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