Nenhum profissional se inscreveu para participar da última edição do Provab, programa criado para incentivar o trabalho
na rede pública
Atrair médicos para trabalhar na saúde pública, especialmente na atenção básica, tem se revelado uma tarefa bastante difícil
para municípios, de grande ou pequeno porte, em todo o Brasil. Nem o apoio do governo federal, com suporte financeiro e programas
para melhorar o acesso de profissionais à rede pública, tem dado resultado.
Um exemplo é o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab), criado em 2011 com o objetivo de reverter
o quadro de déficit de profissionais. Nesta semana, um edital convocou 1.614 profissionais de saúde para atuar em 480 municípios.
Em todo país, nenhum médico se inscreveu para participar do concurso, que selecionou apenas cirurgiões-dentistas e enfermeiros.
No Paraná, foram 33 profissionais, distribuídos em 13 cidades de pequeno e médio porte.
Desde o início, o programa enfrentou problemas. Em uma primeira etapa, o Provab previa a contratação de 3,7 mil profissionais,
sendo 1,7 mil médicos. Naquela fase, foram selecionados 1,4 mil médicos em 1.293 municípios. Mesmo com a aprovação, no entanto,
vários profissionais descobriram que as prefeituras para as quais haviam sido chamados não estavam contratando.
Remuneração
Uma das causas aparentes para a desistência na contratação foi o fato de que o próprio município deveria arcar com as
despesas de remuneração e auxílio-moradia. No Paraná, por exemplo, 22 cidades selecionaram profissionais e somente uma, São
Miguel do Iguaçu, no Oeste do estado, efetivou a contratação - de apenas um médico.
Em uma nova tentativa, o ministério passou a oferecer uma bolsa-auxílio de R$ 2.384,82 para os futuros contratados, o
que fez com que várias cidades voltassem a sinalizar o interesse em contar com esses profissionais em seus quadros. Ao todo,
foram 618 cidades no Brasil que se inscreveram no programa, mas só 480 efetivamente tiveram profissionais contratados. O ministério
considera que a seleção atendeu às expectativas, mas ainda está avaliando as razões do desinteresse da classe médica.
Para o chefe do Setor de Emergência do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Eduardo Ferreira
Lourenço, embora o programa tenha uma boa intenção, esse tipo de iniciativa é pouco efetiva para resolver o problema da saúde
pública no país. "É interessante o profissional ir para o interior, se aprimorar, dar a sua contribuição social, mas não é
só isso. Se você não tem condição técnica para exercer a profissão, é difícil", considera. A concorrência da iniciativa privada,
que oferece salários melhores, também é um fator de risco para o sucesso da iniciativa, afirma Lourenço.
Avaliação semelhante faz o diretor de ensino, pesquisa e extensão do HC, o médico Ângelo Luiz Tesser. "A questão salarial
é importante, mas as condições de trabalho são muito primárias e precárias. O profissional não pode se expor a trabalhar num
lugar onde não vai conseguir reverter uma situação local", argumenta. De acordo com ele, outro fator que afasta os médicos
é a falta de um plano de carreiras atraente para os profissionais generalistas. Ele cita como exemplo o próprio Sistema Único
de Saúde, em que a tabela de remuneração prevê o menor pagamento para a consulta básica.
Paraná contrata só um doutor pelo Provab
A cidade de São Miguel do Iguaçu foi um dos 90 municípios paranaenses que se inscreveram no Programa de Valorização do
Profissional da Atenção Básica (Provab) e a única que contratou um médico no estado por meio da ação, ainda antes do oferecimento
de bolsa-auxílio pelo Ministério da Saúde. A 44 quilômetros de Foz do Iguaçu, a cidade de pouco mais de 25 mil habitantes
contou com pelo menos dois médicos interessados nas vagas do programa, mas só um foi efetivado no cargo.
Renato Migliore, de 26 anos, foi o contratado e atualmente trabalha em um dos postos de saúde mantidos pela prefeitura
de São Miguel do Iguaçu. O outro candidato era sua mulher, Carla Tatiana Cides Pereira, que também entrou para o quadro da
saúde municipal, mesmo sem o Provab, e trabalha em outra unidade básica de saúde.
Embora ache baixo o valor da bolsa, Renato considera a experiência oferecida pelo programa importante. Formado pela Universidade
de Taubaté, no interior de São Paulo, em 2011, ele soube do Provab por meio de um colega do Piauí. "Sempre quis trabalhar
com saúde da família e tinha interesse em fazer residência. O Provab uniu as duas coisas", conta. Munido de uma lista de municípios
que haviam se inscrito no programa, Migliore selecionou algumas opções no Paraná, em Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais.
Ele ligou para várias cidades, mas muitas prefeituras ignoravam o que era o Provab.
Frustração
Segundo Migliore, o novo trabalho exige paciência. Ainda não há uma instituição de ensino para dar o auxílio necessário
ao novo médico, que tem aprendido muito por conta própria. Além disso, há o desafio de ajudar a consolidar o atendimento básico
na cidade. "Trabalhar na rede pública, na atenção primária, às vezes é um pouco frustrante. A gente tenta ajudar o paciente,
mas temos limitações e poucos recursos", avalia.
Para ele, o Provab é um incentivo para quem sai da faculdade e deseja trabalhar na rede pública. O bônus na nota da prova
de residência oferecido pelo programa também pesou na decisão de Migliore: ele quer fazer especialização em cirurgia. Ainda
assim, cogita voltar à sua cidade depois de concluir a formação.
Fonte: href="http://www.gazetadopovo.com.br/saude/conteudo.phtml?tl=1&id=1264992&tit=Nem-com-apoio-federal-municipios-atraem-medicos-de-atencao-basica
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