30/07/2007
Negado Habeas Corpus impetrado para autorizar aborto por anencefalia do feto
A 1ª Câmara Criminal do TJRS, por maioria de votos, negou autorização para a prática de interrupção terapêutica da gestação
de feto com cinco meses com diagnóstico de ausência de calota craniana e dos hemisférios cerebrais - anencefalia.
Os pais, casados há um ano, solicitaram ao Juiz da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre autorização para a prática do aborto
buscando a inibição de eventual responsabilização penal. O pedido foi indeferido pelo Magistrado Luis Felipe Paim Fernandes.
Apontando o Juiz como autoridade coatora, a mãe impetrou Habeas Corpus no plantão do Tribunal de Justiça, quando a liminar
também foi indeferida pelo Desembargador Roque Miguel Fank. Distribuída a ação à 1ª Câmara Criminal, o julgamento de mérito
ocorreu nessa quarta-feira (25/7).
Argumentaram os pais que "uma gravidez dessa espécie, para a família importa em grande dor psicológica, em virtude de
se aguardar uma gestação, por aproximadamente 40 semanas, de uma criança que certamente não sobreviverá". Referiram que a
mãe possui o dobro de líquido amniótico, significando alto risco para a gestante.
Relatou o Desembargador Ivan Leomar Bruxel que em 14 de junho foi realizada ecografia obstétrica que concluiu pela "gestação
compatível com aproximadamente 15 semanas de evolução de acordo com exame prévio"; e com a seguinte observação: "Na revisão
da anatomia fetal não se observa presença de calota craniana e dos hemisférios cerebrais (Anencefalia)".
Outros exames posteriores também confirmaram o diagnóstico. Médicos do Hospital de Clínicas colocaram-se à disposição
para realizar a interrupção terapêutica da gestação, de acordo com vontade expressa pelos pais, caso haja decisão judicial
favorável.
Votos
Para o relator, a utilização da ação tipo Habeas Corpus revela "uma total inversão de propósito - em lugar de ser buscada
a proteção da liberdade, pretende-se aqui autorização judicial para livrar-se alguém de um alegado sofrimento psicológico,
ou para afastar dito risco à integridade física da gestante". Em respeito a julgado do STJ, enfrentou o mérito do Habeas.
"Os direitos do nascituro, até aqui olimpicamente ignorados, estão a merecer consideração", afirmou o Desembargador Bruxel.
"Ao nascituro não foi dado o direito de defesa, salvo a intervenção do Ministério Público (...)", observou. O Magistrado citou
vários estudos a respeito do aborto em fetos anencéfalos. Para a Professora Wanda Franz, PhD, (in O que é a síndrome Pós-Aborto),
"o aborto é, antes de tudo, um procedimento físico, o qual produz um choque no sistema nervoso e que deve provocar um impacto
na personalidade da mulher".
Lembrou o Desembargador Bruxel que "o Conselho Federal de Medicina, mediante Resolução (1752/04), autorizou o reconhecimento
da morte prematura, para fins de transplante, mas do tema aqui não se trata (...) - não se trata de antecipar o parto para
utilização de órgãos".
"Legalmente, ao menos de forma explícita, não há mesmo possibilidade de deferimento da pretensão", concluiu o relator.
"A pretensão não encontra amparo no sistema do Código Penal, pois a ausência de punição encontra expressa previsão, e não
pode ser ampliada - não está demonstrado o risco concreto para a gestante".
O Desembargador Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, que presidiu a sessão de julgamento, acompanhou as conclusões do relator.
Já o Desembargador Marcel Esquivel Hoppe, deferiu a autorização para a interrupção da gravidez. Citando voto do Desembargador
Manuel José Martinez Lucas, em processo julgado em abril de 2003 (70006088090), afirmou que não vê razão jurídica relevante
para desacolher a pretensão do casal.
Observou o Desembargador Martinez Lucas que o Código Penal de 1940, quando a medicina não dispunha dos recursos técnicos
que hoje permitem a detecção de malformações e outras anomalias fetais, indicativas de morte logo após o parto ou de irrecuperáveis
seqüelas físicas ou mentais, "não poderia prever uma situação inexistente na realidade e incluí-la entre as causas de exclusão
da ilicitude do aborto".
"A jurisprudência sensível à realidade da vida e suas constantes mudanças, como não poderia deixar de ser, tem feito uma
interpretação extensiva do disposto no art. 128, I, do estatuto repressivo, admitindo o aborto, não só quando indispensável
para salvar a vida da gestante, mas quando necessário para preservar-lhe a saúde, inclusive psíquica", considerou o Magistrado.
Diz o art. 128, I, do Código Penal: Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico: I - se não há outro meio de
salvar a vida da gestante". (Os dados do processo não foram fornecidos pela fonte).
Fonte: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul