01/03/2011
Michele Caputo Neto diz que saúde vive cenário sombrio a ser revertido
Na foto, Luiz Carlos Sobânia, ex-secretário de Saúde e ex-presidente do CRM-PR; Vinicius Filipak, diretor de Políticas de
Urgência e Emergência da Sesa; Michele Caputo Neto, secretário Estadual de Saúde; Carlos Roberto Goytacaz Rocha, atual presidente
do CRM-PR; Alexandre Gustavo Bley, vice-presidente do Conselho; e o conselheiro do CFM Gerson Zafalon Martins.
Michele Caputo Neto participa de plenária no Conselho, que apresenta documento com preocupações com o setor e as condições
de trabalho médico.
O secretário Estadual de Saúde, Michele Caputo Neto, foi o convidado-palestrante da 19.ª Sessão Plenária do Conselho Regional
de Medicina do Paraná, realizada na noite da última segunda-feira (28 de fevereiro) no Auditório Raquele Rotta Burkiewicz,
na Casa do Médico em Curitiba. Na função desde o início deste ano, o secretário apresentou as propostas a serem cumpridas
no mandato do governador Beto Richa e também fez um balanço das atividades da Pasta, indicando um cenário sombrio a ser revertido
diante das dificuldades herdadas da gestão anterior, em especial pelo déficit orçamentário e por obras de custos vultosos
que estão inoperantes ou inviabilizadas no cumprimento pleno de seus projetos.
No encontro, o secretário recebeu uma carta-ofício do Conselho de Medicina, que manifesta suas preocupações com a saúde
pública paranaense e as condições de trabalho do médico e de acesso à assistência pela população. No documento, lido e entregue
pelo vice-presidente do CRM-PR Alexandre Gustavo Bley, são destacados dois pontos cruciais: o aumento dos recursos e o planejamento
estratégico de gerenciamento, com ênfase no fortalecimento da atenção básica, na estruturação e resolubilidade dos hospitais
regionais e universitários e também dos serviços de urgência e emergência, em harmonia com a Central de Resolução Médica e
de Leitos Hospitalares. Recursos humanos e a violência que alcança profissionais nos locais de trabalho foram outros temas
assinalados.
RECURSOS E PLANEJAMENTO
Michele Caputo Neto analisou cada um dos itens apresentados e asseverou que todos estão contemplados nas propostas da
atual gestão. Ressaltou a postura do Conselho por seu comprometimento com a profissão e com as políticas públicas de saúde
e reforçou o diagnóstico de que a saúde tem problemas sérios de gestão e de recursos, não poupando crítica aos rumos dados
ao setor nos últimos anos, que contrastam faltam de planejamento e desperdício. O secretário diz que o novo governo recebeu
uma dívida de quase R$ 57 milhões em bens e serviços contratados, sendo que a metade já foi paga. Como diz, pior herança,
contudo, está nas obras sem planejamento de gestão, como os pseudos hospitais regionais, as 146 unidades das Clínicas da Mulher
e da Criança e o Centro Hospitalar de Reabilitação, há muito inaugurado na Capital e que nunca teve um dos seus 60 leitos
ocupados.
O secretário manifestou a sua posição de cumprimento pleno da Emenda Constitucional 29, independente de sua regulamentação.
Disse que este é um compromisso do novo governo e que a partir do orçamento de 2012 será possível vislumbrar um cenário otimista
com os recursos a serem alocados. Em 2011, emendas substitutivas ao orçamento tendem a minorar problemas, mas, por enquanto,
a Sesa enfrenta um "estouro" mensal de R$ 7 milhões no teto financeiro do Estado. Michele Caputo Neto diz que a base de trabalho
será nas redes de atenção, priorizando básica, a urgência e emergência, a saúde mental - com especial atenção ao problema
do crack -, a extensão dos programas materno-infantil, com a criação do programa Mãe Paranaense, e os de apoio à pessoa idosa
ou portadora de deficiência.
Sobre as parcerias para suprir o sistema, defendeu a não-discriminação dos prestadores de serviços, vendo no cadastramento
ao programa Hospsul, embora restrito aos hospitais públicos e filantrópicos, uma importante ferramenta de incentivo. Sobre
as unidades hoje ociosas e não funcionais, manifestou a disposição de buscar formas de gestão não ortodoxas e sob estímulo
de exemplos que vêm dando certo, inclusive em outros Estados, como fundações, OS e Oscips.
Analisando questões pontuais nas reivindicações apresentadas pelo Conselho de Medicina, o secretário falou sobre plano
de carreira e atualização no sistema público, sobre a violência que intimida profissionais e também que superlota os serviços
de urgência e emergência, a judicialização na saúde e necessidade de diálogo e mais transparência na relação entre os atores
que formam a rede pública de assistência. Outra preocupação manifestada pelo secretário envolve a eficácia da comunicação
dentro do sistema, com o que espera agregar avanços tecnológicos para aperfeiçoar programas e serviços, como o da Central
de Regulação e de urgência e emergência, com proximidade do Siate e Samu. Ao encerrar sua fala, Michele Caputo realçou o momento
de dificuldade em decorrência de equívocos nas políticas de saúde de antecessores, citando o recrudescimento da dengue por
falta de planejamento efetivo de controle. Também se comprometeu a entregar ao CRM-PR um documento mais analítico em resposta
às preocupações manifestadas pelos representantes da classe médica.
O secretário compôs a mesa diretora da plenária com o diretor de Políticas de Urgência e Emergência da Sesa, Vinicius
Filipak; com o ex-secretário de Saúde e ex-presidente do CRM-PR, Luiz Carlos Sobânia; com o presidente e vice atuais do Conselho,
Carlos Roberto Goytacaz Rocha e Alexandre Gustavo Bley; e o conselheiro do CFM Gerson Zafalon Martins. Ao fazer o encerramento
da sessão, o presidente do Conselho ressaltou a importância da proximidade entre as instituições, lembrando ações exitosas
registradas em Curitiba, onde Michele Caputo Neto foi secretário municipal. Também assinalou que o CRM continuará cumprindo
o seu papel de zelar pela boa prática médica e, assim, coloca-se como parceiro para discutir e contribuir para que sejam dadas
condições de trabalho ao médico para melhor refletir na qualidade da assistência. Ele enalteceu a iniciativa da Sesa em buscar
parcerias com os hospitais São Lucas, Salete e Santa Catarina de modo a desafogar a demanda no Universitário do Oeste, em
Cascavel. Prestigiaram a reunião plenária conselheiros, diretores e delegados das Regionais do CRM.
DOCUMENTO ENTREGUE AO SECRETÁRIO
Senhor Secretário:
O Conselho Regional de Medicina do Paraná, Autarquia Federal supervisora da ética profissional em todo o Estado e ao mesmo
tempo, julgadora e disciplinadora da classe médica, vem através deste Ofício demonstrar sua preocupação em relação à saúde
pública dentro de nosso estado. Como bem explicita a Lei n.º 3.268/57, a esta casa cabe o zelo e trabalho com todos os meios
ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético da Medicina e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos que a exerçam
legalmente, até porque o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano. Nesta toada, enumeramos alguns pontos a
serem discutidos com mais profundidade, no sentido de contribuirmos com a melhora da qualidade da assistência à saúde da população.
1) Aumento de recursos para saúde:
A Constituição Federal Cidadã, que em seu artigo 6º garante a saúde como um direito social, expressa em seu artigo 196
que é um dever do Estado, mediante políticas sociais e econômicas, prover esta garantia. A Emenda Constitucional 29, aprovada
em 13 de setembro de 2000, trouxe maiores elementos sobre a responsabilidade de cada esfera executiva, porém carece de regulamentação.
Por outro lado, tanto o Estado do Paraná, quanto os municípios que o compõe, não necessitam desta regulamentação para aplicar
os recursos necessários, desde que exista vontade política para priorizar o bem maior que é a saúde. Sem esta visão, qualquer
discussão se esvazia e mantém-se o estado das coisas. O mínimo que se espera da participação do Estado seria de 12% de seu
orçamento, efetivamente empregado na saúde.
2) Planejamento Estratégico para gerenciar os recursos:
Apesar das dificuldades em relação aos recursos financeiros que sustentarão todo o sistema público de saúde, cabe uma
reflexão maior sobre o gerenciamento destes recursos. Não se trata somente de valores, mas também de como estes serão aplicados.
De regra geral a carência na assistência à saúde se equilibra nas diversas regiões do estado, porém cada uma com suas particularidades.
Urge um projeto de recuperação com o estabelecimento de prioridades, de forma pactuada regionalmente, ouvindo os agentes que
executam o trabalho e a população que a priori deveria de se beneficiar deste. Necessidade do estabelecimento dos três níveis
de atendimento, com fluxo adequado em cada região, de acordo com dados demográficos e epidemiológicos. Como desafios principais,
elencamos alguns tópicos que merecem um cuidado maior:
a) Fortalecimento da Atenção Básica à Saúde
Como função indireta da Secretaria Estadual, incentivo às Secretarias Municipais para estabelecer como priorização este
sistema, dentro de uma visão estratégica de recursos físicos e humanos, estabelecendo treinamento para que no longo prazo
exista repercussão na otimização dos gastos em saúde. Atualmente se gasta mais com alta complexidade, indicando que muitas
vezes a prevenção está deixando a desejar. Programas de controle, com metas quantitativas e qualitativas, visando a promoção
à saúde e diminuindo consequentemente a necessidade de internações.
b) Hospitais Regionais
Efetivamente necessitamos de um mapa assistencial, sem paixões político-partidárias regionais, com o intuito de se verificar
a real necessidade dos serviços de saúde de cada região, expondo o papel das Regionais de Saúde. Estabelecer critérios para
a presença de Hospitais Regionais próprios ou conveniados. Urge uma definição da política a ser adotada com os Hospitais Regionais
construídos e não-funcionantes, bem como ampla recuperação dos Hospitais Regionais (Estaduais, Municipais ou Particulares)
que se encontram em sérias dificuldades financeiras, o que dificulta um maior investimento em equipamentos e recursos humanos.
Neste contexto cabe uma pergunta, será que existe necessidade de construção de Hospitais Regionais ou com economia de recursos
poder-se-ia aparelhar os Hospitais já existentes que atendem ao SUS? Trata-se de uma questão de lógica, mas que permeia a
juridicidade para que possa ser respondida. O que se pretende é a otimização dos recursos.
c) Hospitais Estaduais Universitários
Como não poderia distanciar-se da lógica hoje instalada no atendimento público, os Hospitais Estaduais Universitários
se encontram em situação precária e carecem de uma diferenciação, que lhes é devida. Estas Instituições tornaram-se verdadeiros
depósitos humanos, com internações de corredor, atendimentos em locais inapropriados, indicando a pletora do sistema e mais
uma vez demonstrando a falta de uma gestão que coloque a qualidade na atenção à saúde da população como cerne. Estabelecimento
de uma política que defina o tipo de gestão. A grande diferenciação destes Hospitais, além do aspecto de complexidade de serviços
oferecidos, é o comprometimento com a formação de recursos humanos que serão aproveitados no Sistema, o que requer uma visão
mais acadêmica do atendimento, podendo ensejar a uma maior permanência hospitalar. Muitos são os questionamentos, mas do ponto
de vista ético como formar profissionais em um ambiente inadequado, dentro do que se concebe em relação a Direitos Humanos?
d) Urgência e Emergência - Central de Regulação Médica e de Leitos Hospitalares - Vaga zero
A situação dos atendimentos de urgência e emergência, tanto no nível pré-hospitalar, quanto no hospitalar, estampa os
jornais frequentemente, demonstrando uma falta de um gerenciamento efetivo, com a colaboração de uma população desinformada.
Neste sentido a Central de Regulação Estadual foi criada como uma alternativa para amenizar os transtornos com a superlotação
de hospitais e melhor adequar a distribuição dos pacientes nas regiões do estado. Na realidade acabou por expor a carência
existente em relação ao número de leitos, sejam especializados ou não, bem como ao acesso aos profissionais e equipamentos
específicos necessários em todas as regiões. Hoje estamos trabalhando com o conceito de vaga zero que na realidade deve ser
entendido como uma medida provisória, constituindo-se obrigação do regulador prosseguir na busca de vaga adequada para o paciente,
em serviço que faça parte do sistema estadual ou regional de emergências de caráter público ou privado vinculado ou não ao
SUS, conforme pacto previsto na portaria 2048 do MS. Há que ficar claro que medidas provisórias não eximem o gestor de cumprir
com seu dever legal de implementar atividades com vistas a solucionar os pontos críticos do sistema conforme prevê a lei.
Logo o que é provisório não pode adquirir o caráter de definitivo como com freqüência acontece no setor saúde. Os sistemas
de urgência e emergência, recepcionados por unidades pré-hospitalares móveis (SAMU, SIATE, CONCESSIONÁRIAS) e também unidades
pré-hospitalares fixas (UPA, 24 Horas, Salas de Estabilização) devem ter vagas hospitalares formalmente contratualizadas para
a finalidade, sem transferir ao profissional médico o dever de prover as vagas necessárias, competência essa do Gestor de
Saúde.
e) Recursos Humanos
Não existe saúde sem profissionais que possam efetivamente dispor dos recursos existentes em benefício da sociedade. Grandes
são as queixas de que não existe disponibilização de médicos, ficando a população desassistida, tanto nas Unidades Básicas
de Saúde a Pronto Socorros e Pronto Atendimentos. Defendemos um Plano de Carreira para o médico, individualizado às suas particularidades,
desvinculado das outras profissões de saúde, que merecem o mesmo respeito as suas individualidades, bem como uma condição
de trabalho adequada, que certamente estimularia e facilitaria o preenchimento de tantos postos de trabalho que hoje se demonstram
insuficientes. Da mesma forma, manter um programa de capacitação e atualização do profissional de saúde, especialmente aos
que exercem os atendimentos nos setores de urgência e emergência.
f) Segurança
É crescente os relatos em relação à violência sofrida pelos profissionais de saúde nos seus locais de trabalho. Assédio
moral, ameaças e agressões físicas estão se tronando rotina e acabam por interferir no atendimento à população, visto que
muitos profissionais acabam por afastar-se daquele ambiente de trabalho. Necessário se fazer um plano efetivo, garantindo
a segurança nos estabelecimentos de saúde, evitando que mais um fator, dos muitos já existentes, prejudiquem ainda mais a
sociedade.
Estas são algumas das preocupações deste Conselho, que desde já, como sempre se pautou, coloca seus esforços a serviço
da Secretaria que V.Ex.ª representa, no sentido de uma parceria baseada em princípios éticos, para a construção de um sistema
de saúde justo, eficiente e que atinja ao anseio do povo paranaense.
Atenciosamente,
CONS. CARLOS ROBERTO GOYTACAZ ROCHA, PRESIDENTE.
CONS. ALEXANDRE GUSTAVO BLEY, VICE-PRESIDENTE