23/08/2006
Médicos viram alvo de processos de pacientes
Do consultório para o banco dos réus: essa tem sido a trajetória de um número cada vez maior de profissionais de saúde no
Estado do Rio. Segundo dados do Sindicato dos Médicos, o número de pacientes que resolvem ir à Justiça contra seus médicos
não pára de crescer. No ano passado, a assessoria jurídica da entidade atendeu 180 associados que estavam sendo processados,
na área cível ou criminal - um aumento de 63% em relação a 2004, quando 110 médicos pediram ajuda.
O advogado Lymark Kama-roff, especialista em responsabilidade civil médica, tem um prognóstico sombrio para a categoria.
Ele estima que um em cada sete médicos é processado no Rio. Há dez anos, essa relação seria de um para 25:
- Antigamente, os médicos não eram questionados, as pessoas não duvidavam de diagnósticos. Agora, a confiança foi deixada
de lado e a relação passou a ser de consumo.
Do outro lado do front, a Associação das Vítimas, de Erros Médicos, que presta atendimento jurídico a quem caiu nas mãos
de maus profissionais, diz que tem 1.200 processos em andamento e, devido à demanda, parou de aceitar novos casos.
- Parei em junho de aceitar mais vítimas porque não temos capacidade para atender a procura. Ajuizei 50 processos em 2005
e 35 até maio deste ano. A associação, infelizmente, não consegue dar conta - diz a presidente, Célia Destri.
No Conselho Regional de Medicina (Cremerj), a insatisfação dos pacientes também tem sido grande: a cada mês, são registradas
cerca de 200 queixas. De janeiro a julho, 160 reclamações viraram sindicâncias, investigação que pode resultar em abertura
de processo. Segundo o presidente da entidade, Paulo César Geraldes, há 892 processos e 1.251 sindicâncias em andamento. Para
atender a demanda, o Cremerj tem realizado mutirões de julgamentos e ampliou de oito para 12 os casos analisados mensalmente.
No ano passado, 93 médicos foram julgados. Quarenta e um foram absolvidos. Entre os 52 punidos, 24 sofreram advertência ou
censura confidencial; 20, censura pública; três foram suspensos e cinco tiveram o registro profissional cassado. De janeiro
a julho de 2006, 51 médicos foram absolvidos e 35 condenados.
Ginecologia é a especialidade com mais queixa
Cremerj culpa a falta de condições de trabalho da categoria
Para o presidente do Sindicato dos Médicos, a explicação para o aumento de processos contra a categoria é simples. Enfrentando
péssimas condições de trabalho na rede pública, ou cerceados pelos planos de saúde, que nem sempre autorizam as cirurgias
necessárias a um paciente, os médicos estariam, segundo Darze, cometendo mesmo mais deslizes.
- A saúde pública caminha para o buraco, sem equipamentos e remédios. Os planos de saúde não autorizam todos os procedimentos
pedidos pelos profissionais de saúde. Fica difícil para o médico, que precisa seguir um código de ética; trabalhar nessas
situações, que não poderiam gerar outra coisa senão um péssimo resultado. Há vítimas dos dois lados: os pacientes e os médicos
- avalia Darze.
Corregedor do Conselho Federal de Medicina, Roberto Luís D'Ávila acredita que a deterioração da relação médico-paciente
contribui para o aumento do número de queixas:
- Já vi erros grosseiros que não foram denunciados porque os pacientes disseram que sempre tiveram a atenção do médico,
e já vi condutas técnicas perfeitas que foram alvo de queixas porque o paciente dizia que o médico era inacessível, não atendia
telefonemas.
O presidente do Cremerj, Paulo César Geraldes, endossa.
- Muitos pacientes vêm para o Cremerj na tentativa de saber o que aconteceu. Muitas vezes, não confiam mais na palavra
do médico - lamenta.
Paciente pagou para retirar ovário que continua no lugar
Foram justamente as palavras - o que está em jogo na Justiça é se foram ditas ou não - que levaram a paciente Elice Espírito
Santo a processar sua ginecologista.
Segundo ela, a médica afirmou que faria uma cirurgia para retirar um dos seus ovários.
Oito meses depois da operação, Elice descobriu, ao fazer um exame de ultra-sonografia, que o órgão estava no lugar. A médica
diz no processo que a paciente entendeu mal e que só pretendia tirar um pedacinho do ovário. Elice ganhou a ação em primeira
instância, mas perdeu em segunda. Agora, o processo está no Supremo Tribunal Federal.
Segundo Célia Destri, da Associação de Vítimas de Erros Médicos, 40% dos casos atendidos pela entidade referem-se à especialidade
ginecologia/obstetrícia. Uma estatística que mudou a vida de Silvânia de Assis em outubro de 2004, quando ela deu à luz em
uma maternidade conveniada do SUS.
- Fiquei em trabalho de parto a noite toda e a médica só apareceu de manhã. Quando o bebê nasceu, estava roxo.
Passou
da hora e ficou sem oxigênio. Ele foi se apagando e morreu três dias depois. Estava tudo certo nos exames do pré-natal. Foi
erro - diz Silvânia, que agora tem medo de engravidar. - Fiquei traumatizada.
Médicos viram alvo de processos de pacientes
Do consultório para o banco dos réus: essa tem sido a trajetória de um número cada vez maior de profissionais de saúde
no Estado do Rio. Segundo dados do Sindicato dos Médicos, o número de pacientes que resolvem ir à Justiça contra seus médicos
não pára de crescer. No ano passado, a assessoria jurídica da entidade atendeu 180 associados que estavam sendo processados,
na área cível ou criminal - um aumento de 63% em relação a 2004, quando 110 médicos pediram ajuda.
O advogado Lymark Kama-roff, especialista em responsabilidade civil médica, tem um prognóstico sombrio para a categoria.
Ele estima que um em cada sete médicos é processado no Rio. Há dez anos, essa relação seria de um para 25:
- Antigamente, os médicos não eram questionados, as pessoas não duvidavam de diagnósticos. Agora, a confiança foi deixada
de lado e a relação passou a ser de consumo.
Do outro lado do front, a Associação das Vítimas, de Erros Médicos, que presta atendimento jurídico a quem caiu nas mãos
de maus profissionais, diz que tem 1.200 processos em andamento e, devido à demanda, parou de aceitar novos casos.
- Parei em junho de aceitar mais vítimas porque não temos capacidade para atender a procura. Ajuizei 50 processos em 2005
e 35 até maio deste ano. A associação, infelizmente, não consegue dar conta - diz a presidente, Célia Destri.
No Conselho Regional de Medicina (Cremerj), a insatisfação dos pacientes também tem sido grande: a cada mês, são registradas
cerca de 200 queixas. De janeiro a julho, 160 reclamações viraram sindicâncias, investigação que pode resultar em abertura
de processo. Segundo o presidente da entidade, Paulo César Geraldes, há 892 processos e 1.251 sindicâncias em andamento. Para
atender a demanda, o Cremerj tem realizado mutirões de julgamentos e ampliou de oito para 12 os casos analisados mensalmente.
No ano passado, 93 médicos foram julgados. Quarenta e um foram absolvidos. Entre os 52 punidos, 24 sofreram advertência ou
censura confidencial; 20, censura pública; três foram suspensos e cinco tiveram o registro profissional cassado. De janeiro
a julho de 2006, 51 médicos foram absolvidos e 35 condenados.
Ginecologia é a especialidade com mais queixa
Cremerj culpa a falta de condições de trabalho da categoria
Para o presidente do Sindicato dos Médicos, a explicação para o aumento de processos contra a categoria é simples. Enfrentando
péssimas condições de trabalho na rede pública, ou cerceados pelos planos de saúde, que nem sempre autorizam as cirurgias
necessárias a um paciente, os médicos estariam, segundo Darze, cometendo mesmo mais deslizes.
- A saúde pública caminha para o buraco, sem equipamentos e remédios. Os planos de saúde não autorizam todos os procedimentos
pedidos pelos profissionais de saúde. Fica difícil para o médico, que precisa seguir um código de ética; trabalhar nessas
situações, que não poderiam gerar outra coisa senão um péssimo resultado. Há vítimas dos dois lados: os pacientes e os médicos
- avalia Darze.
Corregedor do Conselho Federal de Medicina, Roberto Luís D'Ávila acredita que a deterioração da relação médico-paciente
contribui para o aumento do número de queixas:
- Já vi erros grosseiros que não foram denunciados porque os pacientes disseram que sempre tiveram a atenção do médico,
e já vi condutas técnicas perfeitas que foram alvo de queixas porque o paciente dizia que o médico era inacessível, não atendia
telefonemas.
O presidente do Cremerj, Paulo César Geraldes, endossa.
- Muitos pacientes vêm para o Cremerj na tentativa de saber o que aconteceu. Muitas vezes, não confiam mais na palavra
do médico - lamenta.
Paciente pagou para retirar ovário que continua no lugar
Foram justamente as palavras - o que está em jogo na Justiça é se foram ditas ou não - que levaram a paciente Elice Espírito
Santo a processar sua ginecologista.
Segundo ela, a médica afirmou que faria uma cirurgia para retirar um dos seus ovários.
Oito meses depois da operação, Elice descobriu, ao fazer um exame de ultra-sonografia, que o órgão estava no lugar. A médica
diz no processo que a paciente entendeu mal e que só pretendia tirar um pedacinho do ovário. Elice ganhou a ação em primeira
instância, mas perdeu em segunda. Agora, o processo está no Supremo Tribunal Federal.
Segundo Célia Destri, da Associação de Vítimas de Erros Médicos, 40% dos casos atendidos pela entidade referem-se à especialidade
ginecologia/obstetrícia. Uma estatística que mudou a vida de Silvânia de Assis em outubro de 2004, quando ela deu à luz em
uma maternidade conveniada do SUS.
- Fiquei em trabalho de parto a noite toda e a médica só apareceu de manhã. Quando o bebê nasceu, estava roxo. Passou
da hora e ficou sem oxigênio. Ele foi se apagando e morreu três dias depois. Estava tudo certo nos exames do pré-natal. Foi
erro - diz Silvânia, que agora tem medo de engravidar. - Fiquei traumatizada.
Fonte: O Globo / RJ - dia 20/08/06)