27/09/2012
Médicos suspendem atendimento por guias de planos de saúde em outubro
Conselho vê como ético e legítimo movimento que terá atendimentos eletivos só por reembolso de 10 a 24 de outubro.
Os médicos brasileiros articulam para outubro a maior mobilização desde o advento da Lei 9656, de junho de 1998, que dispõe
sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. Para protestar contra o descaso das operadoras na fixação do regramento
contratual, as quais contrariam assim exigência da própria Agência Nacional de Saúde Suplementar, os médicos decidiram suspender
o atendimento no período de 10 a 24. A medida alcança, assim, as operadoras de saúde que vêm demonstrando total desrespeito
com o seu usuário ao não negociarem com os médicos, como justificam as lideranças médicas, ressaltando que, nesse período
de15 dias, para que não haja desabastecimento na assistência, as consultas e demais procedimentos eletivos serão realizadas
na modalidade de reembolso, como previsto em lei.
O foco da reivindicação da categoria é o cumprimento das determinações legais que se refere ao estabelecimento de relação
comercial com o plano de saúde, aclarando regras e obrigações das partes, em especial na fixação do prazo desse contrato,
critérios e índices de reajuste para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro e horário de atendimento. São questões
que interferem na relação médico-paciente e que, sobretudo, alimentam os principais conflitos e deficiências na utilização
dos serviços da saúde suplementar. Como reflexo, cresce a cada dia o grau de insatisfação dos usuários, como atesta recente
pesquisa da Associação Paulista de Medicina, que detectou algum tipo de problema em 77% dos atendimentos.
CONTRATOS IRREGULARES
O movimento não alcança no primeiro momento os usuários do sistema Unimed, que terá sua análise na forma exigida pela
Lei das Cooperativas. No Paraná, ainda, os usuários dos planos de autogestão de Sanepar e Copel não serão afetados porque
as formalizações contratuais evoluíram. Como avaliado pelas comissões estaduais de defesa profissional, há um universo próximo
de 30 milhões de beneficiários dos planos e seguros de saúde que poderá ser envolvido na suspensão dos serviços. Neste contexto
estão as operadoras que negociam sem chegar a consenso (Unidas) e as que sequer iniciaram as negociações (Abramge e Fenasaude).
"É notório e incontestável o esforço das entidades médicas nacionais na tentativa da formulação de acordos com as operadoras
de saúde para a regularização de tais contratos e a recomposição dos honorários médicos, cuja valoração é muita baixa quando
não aviltante", diz trecho de nota divulgada pela comissão de defesa profissional no Paraná, a qual esclarece que, durante
os 15 dias, a cobrança do valor das consultas e procedimentos será realizada diretamente do paciente. Este, deve exigir o
devido reembolso na sede das operadoras de saúde e, na hipótese de negativa, comunicar a ANS e o Procon. Ainda de acordo com
representantes do movimento médico, todos os atendimentos de urgência e emergência serão mantidos sem quaisquer modificações.
Do mesmo modo, os serviços públicos não serão afetados, sendo alternativa àqueles que não desejarem o reembolso.
MOVIMENTO LEGÍTIMO
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná, Alexandre Gustavo Bley, avalia o movimento dos médicos como legítimo
para assegurar melhores condições de trabalho, o que inclui remuneração digna e explicitação de seus direitos e deveres. Ele
cita o Código de Ética Médica que, em seus princípios fundamentais, expressa que "para exercer a Medicina com honra e dignidade,
o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa", e ainda que "o trabalho do médico não
pode ser explorado por terceiros com objetivo de lucro" e que "o médico será solidário com os movimentos de defesa da dignidade
profissional, seja por remuneração digna e justa, seja por condições de trabalho compatíveis com o exercício ético-profissional
da Medicina e seu aprimoramento técnico-científico".
Ainda de acordo com o representante do CRM-PR, o movimento serve para esclarecer à sociedade que não há contratos celebrados
à vista da legislação entre médicos e operadoras, o que acaba se refletindo diretamente na atenção aos usuários dos serviços.
Alexandre Bley diz que, conforme dados da própria ANS e de pesquisas de instituições médicas ou de defesa do consumidor, a
demora na marcação ou na autorização da consulta, médico que se descredenciou e lista desatualizada de conveniados estão entre
as principais queixas dos beneficiários dos planos. Para ele, situações reparáveis com a formalização de instrumento jurídico
entre as partes e a valorização do trabalho médico. Cita que, sem a definição de um acordo, a responsabilidade está indevidamente
recaindo sobre o médico. "A opinião pública está iludida ao achar que o médico é o responsável pelo que está ocorrendo. A
responsabilidade é da operadora que, de forma protelatória, não cumpre as resoluções normativas da ANS, beneficiando-se das
limitações impostas aos usuários, que são os principais prejudicados", assinala.
Para o presidente do Conselho do Paraná, a restrição de liberdade imposta pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(Cade) às entidades médicas, impedindo-as de legitimar negociações que têm amparo no Código de Ética Médica, Código Civil
e Constituição Federal, fez elevar o grau de insatisfação dos médicos contra os planos, que se traduz pela expansão do movimento
em todo o País, com substancial reforço do uso das redes sociais. Assim, considera o engajamento pleno dos profissionais como
fundamental instrumento para balizar todas as negociações futuras com os compradores de serviços, sob pena de o trabalho médico
subjugar-se àqueles que o exploram sob interesse do lucro. "Os colegas são conclamados a seguir seus ditames éticos, que se
iniciam no zelo da atenção à vida e se completam no respeito à dignificação da Medicina", reforça o conselheiro, lembrando
ter sido escolhido o mês de outubro por ser o mês em que se comemora o dia do médico (18).
No que se refere à Unimed, Alexandre Bley entende que, apesar de a questão necessitar ser resolvida no âmbito da cooperativa,
vê com muita preocupação a atual postura administrativa, que está desvalorizando o trabalho dos médicos cooperados. "Espero
que a Unimed também demonstre boa vontade e busque valorizar seus profissionais, trazendo o nível de excelência que seus usuários
merecem", conclui.
Histórico
Algumas conquistas dos médicos surgiram após as três recentes mobilizações da categoria com foco na queda de braço entre
profissionais e operadoras. A primeira em 7 de abril de 2011 e a segunda em 21 de setembro do mesmo ano. A última mobilização
nacional aconteceu em 25 de abril, quando, além de protestarem, representantes das entidades médicas nacionais entregaram
formalmente à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) um documento com 15 propostas para estabelecer critérios adequados
para a contratação de médicos pelas operadoras de planos de saúde e para a hierarquização dos procedimentos estabelecidos
pela CBHPM.
Após cinco meses, ANS afirma ainda analisar proposta da categoria. Durante esse período, a Agência publicou a Instrução
Normativa nº 49, que foi considerada inócua pelas entidades, pois não tem o pressuposto da negociação coletiva.
Legislativo e sociedade
Em paralelo às negociações com a ANS e à mobilização nacional, o movimento médico também aposta na aprovação do Projeto
de Lei 6964/10, que garante o reajuste anual e torna obrigatória a existência de contratos escritos entre as operadoras e
seus prestadores de serviços. Atualmente em fase final de tramitação, o projeto se encontra na Comissão de Constituição e
Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.
O movimento médico conta ainda com o apoio da sociedade, no que diz respeito à assistência oferecida pelas operadoras
de planos de saúde e à interferência na autonomia profissional. Estudo da Associação Paulista de Medicina (APM) realizado
pelo Instituto Datafolha, mostra que 77% dos usuários de planos de saúde no estado de São Paulo enfrentaram problemas no atendimento,
como superlotação e longas esperas nos hospitais. O estado concentra hoje o maior número de beneficiários de planos de saúde
do país, com um universo de 10 milhões de pacientes da saúde suplementar.
Sobre os médicos e prestadores de serviço, a percepção de 66% dos usuários é de que os planos colocam restrições em diversas
etapas para realização de exames de maior custo e, para (53%), de que os planos restringem o tempo de internação hospitalar
ou UTI. Mais de 60% dos usuários ainda afirmam ter a imagem de que os planos de saúde pagam aos médicos um valor muito baixo
por consulta ou procedimento.
Saiba mais:
Conheça os cinco pontos da pauta de reivindicação da categoria médica:
1. Reajuste dos honorários de consultas e outros procedimentos, tendo como referência a CBHPM.
2. Inserção nos contratos de critério de reajuste, com índices definidos e periodicidade, por meio de negociação coletiva.
3. Inserção nos contratos de critérios de descredenciamento.
4. Resposta da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por meio de normativa, à proposta de contratualização, encaminhada
pelas entidades médicas.
5. Fim da intervenção antiética na autonomia da relação médico-paciente.
O que acontece?
- Durante 15 dias, entre 10 e 24 de outubro, os profissionais podem suspender o atendimento através das guias dos planos
de saúde.
- Os pacientes serão previamente informados da suspensão do atendimento, podendo ter suas consultas e procedimentos eletivos
reagendados.
- Os atendimentos de urgência e emergência serão mantidos.
Fonte: CRM-PR com informações da AMB