03/06/2006
Médicos à beira de um ataque de nervos
Vi dias atrás na TV um colega médico que perdeu a paciência com um paciente do SUS (Sistema ¿nico de Saúde). Não quero aqui
tomar partido ou defender ninguém. Porém, analisando o fato de uma maneira mais delicada, cheguei a uma conclusão que já me
incomodava desde minha formatura: chegamos ao fundo do poço. Cada vez estamos recebendo menos pelos nossos procedimentos que
perderam, além do valor, o prestígio, temos que trabalhar em vários empregos para poder pagar nossas contas (5, 6 e até 7
lugares, sem carteira assinada - sem férias ou 13º salário), temos que dar plantões sem remuneração nos hospitais tendo que
assumir todos os casos que são internados - sozinhos, o que, com o Samu, teve um aumento significante, e ainda manter nosso
consultório.
Os planos de saúde não reajustam nossos ganhos há pelo menos 9 anos e a nova tabela elaborada para compensar este déficit,
feita há 2 anos, ainda não foi implantada. O SUS nos paga pouco para assumirmos casos complicados, e também não reajusta seus
valores há muitos anos. Ainda por cima, somos obrigados a participar de pelo menos 2 congressos ao ano (que aumentam nossos
gastos) e temos que investir em material para não ficarmos defasados em relação ao que ocorre no mundo (tecnologia custa muito
dinheiro - quem não gosta de falar que foi operado por laser? Para citar um exemplo). E, como tiro de misericórdia, a Prefeitura
de Londrina agora nos obriga a pagar empresas privadas para recolher o lixo dos consultórios sem diminuir qualquer outro imposto!
Então, nossa semana fica assim: passar visita nos pacientes internados, fazer 5 ou mais ambulatórios de SUS (primeira
consulta e retornos de plantões), consultório, cirurgias (dos pacientes dos plantões, do SUS, do consultório). E ainda temos
que cuidar da nossa saúde e participar da nossa família.
Como alguém consegue manter a mente saudável nestas condições? Estamos no fundo do poço (assim como diversas outras profissões)
e nossos governantes nos estão dando as costas. Isso é perigoso, pois quando começamos a perder nosso rumo podemos fazer coisas
que estes mesmos governantes podem não gostar.
NOTA DO CRMPR
"Prezado Colega, ao ler suas declarações na Folha de Londrina, endosso-as plenamente. Posso lhe garantir que temos buscado
de forma incessante corrigir estas distorções. O aviltamento dos nossos valores, seguido de descaracterização da função do
médico, com a desvalorização da cidadania ("para pessoas de Segunda classe uma assistência também de segunda classe"), é o
quadro que nos apresenta e praticamente sem êxito em nossas frentes.
Esta situação de imobilismo tem que ser vencida com a real participação de todos nós, médicos, mostrando nossa indignação
pelos valores remuneratórios recebidos, pelas condições dos hospitais, pela cobrança por parte da sociedade, pelo número exagerado
de escolas médicas, a falta de uma carreira ou plano de cargos e salários, etc. Reafirmo suas palavras, certo de que estamos
trabalhando, embora nem sempre tão visível, em favor de mudança destes épices."
Hélcio Bertolozzi Soares, presidente do CRM-PR
N.R. O Jornal do CRM republica o artigo do médico londrinense por associá-lo à angústia de grande parte dos médicos paranaenses.
Também incorpora a resposta do presidente do Conselho passada ao missivista, como forma de demonstrar que o que está em curso
é uma luta de todos os médicos.