02/08/2006

Médico preso nos EUA não tem permissão para operar nem no Brasil

Luiz Carlos Ribeiro, acusado de prática ilegal da medicina e homicídio, tem registro de clínico-geral em MG
Clínico-geral com registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) de Minas Gerais. É o pouco que se sabe até agora sobre o médico Luiz Carlos Ribeiro, de 49 anos, preso na madrugada de segunda-feira em Framingham, nos EUA. Segundo o CRM, ele não tem autorização para atuar como cirurgião plástico no Brasil nem em nenhum outro lugar.

A Massachusetts Board of Registration in Medicine (equivalente ao CRM brasileiro) confirmou ontem que Ribeiro não tinha permissão para a prática médica no Estado e que também não havia feito pedido para tal. Por isso, está sendo acusado de prática ilegal da medicina, além de homicídio e porte de medicamentos e substâncias sedativas proibidas.

Sua detenção, nos EUA, ocorreu logo depois da morte da paciente Fabíola de Paula, de 23 anos. Ela faleceu no domingo, após se submeter a uma lipoaspiração no porão do prédio onde Ribeiro vivia. Ontem, a polícia prendeu Célia Sielemann. Ela é a dona do apartamento em cujo porão eram feitas as cirurgias.

Fabíola, que já havia feito uma microcirurgia de nariz com Ribeiro, teria agora pago US$ 3 mil pela lipo. Mesmo valor desembolsado por pelo menos outras duas pacientes na semana passada. A mineira Mariane Silva, de 24 anos, teve alta ontem do MetroWest Medical Center, hospital para o qual Fabíola também foi levada. A auxiliar de limpeza foi internada no domingo com infecção e febre, apresentadas após a lipo. Outra jovem segue internada.

Ribeiro estava no país com um visto de trabalho de 30 dias, segundo a imprensa americana. Mas há rumores entre a comunidade brasileira de que ele vive em Framingham há muito tempo. "Ainda não podemos divulgar o número de pacientes de Ribeiro nem seus nomes. Estamos investigando", disse ontem o policial Paul Shastany, que incentiva as vítimas a denunciarem o médico, mesmo que estejam em situação irregular no país.


JUSTIÇA

De acordo com informações do CRM mineiro, não existem no Brasil denúncias nem processos contra Ribeiro. Segundo Jader Bernardo Campomizzi, corregedor do conselho, por enquanto, a entidade não pode fazer nada em relação ao médico. "É um caso que aconteceu em outro país e está nas mãos da Justiça americana. Se ele voltar e as autoridades daqui forem notificadas, aí poderemos abrir um processo", diz.

A família da jovem vai pedir às autoridades brasileiras para que Luiz Carlos Ribeiro seja julgado nos EUA, onde foi estabelecida fiança de mais de US$ 300 mil para que ele e a mulher, Ana Maria Miranda, saiam da prisão. "Queremos justiça", afirmou ao Estado Fernanda de Paula, estudante de Direito e irmã mais velha de Fabíola. "Vamos fazer de tudo para impedir que ele venha a ser julgado no Brasil."

Nas palavras da irmã, Fabíola foi ingênua ao aceitar a intervenção nas condições que foram descritas: a cirurgia teria sido feita num porão e com agulhas não descartáveis. "O médico sabia o que fazia e não mediu as conseqüências do seu ato", justificou Fernanda. "Ele foi irresponsável, deve ser julgado com o rigor que merece."
Fernanda disse que ainda aguarda o resultado da autópsia, que só deve ser liberado no sábado - mesmo dia em que o corpo será trasladado para o Brasil -, para estudar a fundo o caso, que começou com a fantasia de Fabíola de ganhar um corpo perfeito, mas acabou em tragédia.

O enterro está previsto para ocorrer no próprio sábado, na pequena Sanclerlândia, uma localidade rural a 130 km de Goiânia (GO), onde a jovem nasceu e viveu até os 17 anos. A decisão foi anunciada pelo pai, Orlando Alves de Paula, um advogado de 56 anos com escritório na cidade. "Autorizei o traslado do corpo, que chegará por volta das 13 horas a Goiânia", disse ele, por telefone.


SONHO AMERICANO

Fernanda revelou que o enterro de Fabíola também significará o fim de um sonho da família de morar em Massachusetts. Ela contou que sua mãe, Beatriz, já pôs à venda todos os bens que tem em Framingham. O sonho começou há 13 anos, em 1993, quando sua avó materna, Maria Gomes, chegou à cidade americana para fazer trabalhos de limpeza.
Sua mãe é ex-servidora pública estadual que aproveitou as licenças-prêmio a que teve direito, na Secretaria da Fazenda, para se aventurar nos EUA, há oito anos. Desde então, até 18 membros da família chegaram a lotar o apartamento comprado com as economias.


O Brasil está em segundo, com cerca de 700 mil. Mas uma parte delas poderia ser evitada.

Segundo o secretário-geral da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), José Tariki, a divulgação de procedimentos estéticos, muitos sem comprovação científica, provoca uma corrida desenfreada aos consultórios, onde nem sempre o profissional informa que não há indicação para um tratamento cirúrgico. "Infelizmente, há joio e trigo. Precisamos separá-los. As pessoas se iludem com a redução de preços e vão atrás, mesmo quando não precisam de uma cirurgia", diz.

Para quem decide fazer uma plástica, Tariki alerta. "Por favor, busquem informações sobre o procedimento, o médico e o local onde a intervenção vai ser realizada", orienta, informando que isso deve ser feito consultando a SBCP e o Conselho Federal de Medicina, ambos com sites na internet (www.cirurgiaplastica.org.br e www.portalmedico.org.br), onde podem ser encontrados os nomes dos profissionais.

Levantamento feito em 2004, a pedido da SBCP, revelou que a maioria das 616 mil cirurgias plásticas realizadas naquele ano foi estética (59% ante 41% de intervenções reparadoras), com predominância de pacientes femininos (69%). A capital paulista liderou em número de procedimentos, 126 mil, e a maior demanda foi por lipoaspiração (54%) e cirurgia de mama (32%). Do total de cirurgias, surpreendentes 21% ocorreram em pessoas na faixa até 18 anos.

Especialista em transtornos alimentares, a psiquiatra Paula Melin avalia que a procura pelo corpo e o rosto perfeitos, seja na adolescência ou entre adultos, é reflexo de uma sociedade que está cada vez mais exigente e intolerante. "Independentemente de ter uma patologia psiquiátrica, o indivíduo hoje tem um nível de exigência muito alto. Ele quer ser como o modelo da revista, mas esquece que a foto é digital e a imagem, retocada. Agem como se o corpo fosse uma massinha de modelar."

E mesmo as modelos, que reproduzem o padrão de beleza difundido hoje, estão insatisfeitas com sua aparência, segundo uma pesquisa feita pelo psicólogo Marco Antonio de Tommaso com 140 modelos. Ele descobriu que 92% delas têm vontade de fazer lipoaspiração, 74% querem um implante de silicone e todas estão incomodadas com alguma coisa em seu visual.

"É uma patologia cultural. Todas se sentem inadequadas. Uma pesquisa da Unilever mostrou que apenas 2% das mulheres no mundo se definem como bonitas. No Brasil, só 1% delas", diz. "A pesquisa mostrou que elas discordam desse padrão imposto, querem que ele mude, se amplie, mas continuam perseguindo esse ideal. É uma busca irracional."


Fonte: O Estado de S.Paulo - 02/08/2006



Médico preso nos EUA foi processado em MG

Como dermatologista, Luiz Carlos Ribeiro sofreu processo indenizatório ao deixar manchas na pálpebra de paciente

Outra brasileira, acusada de alugar sua casa nos EUA para as supostas operações clandestinas, é detida ao tentar voltar para o país.

O médico Luiz Carlos Ribeiro, acusado de envolvimento na morte da brasileira Fabíola Barbosa de Paula, 24, ocorrida na madrugada de segunda-feira nos EUA, após complicações durante cirurgia de lipoaspiração, já sofreu ao menos um processo de indenização por uma paciente na Justiça de Minas Gerais. Ele era dermatologista em Belo Horizonte. O processo movido por Vera Lúcia da Silva foi encerrado com um acordo em dezembro do ano passado.

Ela contratou os serviços médicos de Ribeiro para tratar das manchas nas pálpebras inferiores, as chamadas olheiras, segundo Nara Rates dos Santos, uma das advogadas contratadas por Vera para cuidar do processo. Após o tratamento, a paciente teve de fazer cirurgia plástica corretiva. "Ele não explicou as conseqüências do tratamento com o ácido e não pediu à minha cliente que assinasse um termo de responsabilidade", explicou Nara Santos.


R$ 30 mil

O acordo, ocorrido entre as partes ficou em R$ 30 mil, de acordo com a advogada. Segundo Santos, nos 25 meses de tramitação do processo, Ribeiro não apareceu. Ele sempre foi representado por um de seus advogados. A Folha não conseguiu localizar nenhum deste advogados até o início da noite de ontem.

A polícia de Massachusetts, nos EUA, deteve ontem uma terceira pessoa suspeita de envolvimento na morte de Fabíola de Paula. A também brasileira Ana Pena Sielemenn, 40, foi detida sob acusação de porte ilegal de substância controlada.

Ela intermediaria a marcação de cirurgias clandestinas e teria alugado o porão da própria casa em Framingham (perto de Boston, Estado americano de Massachusetts) para o casal Luiz Carlos Ribeiro, 49, e Ana Miranda Ribeiro, 49, fazer operações. Ana Célia foi detida, segundo a polícia, ao tentar fugir para o Brasil. Ela foi encontrada ontem pela manhã num hotel na saída de Boston. Luiz Carlos é acusado por prática ilegal da medicina e tráfico de substâncias controladas. Ele pagou fiança e foi libertado ontem. Ana Maria, acusada do segundo crime, foi libertada na segunda. O casal e Ana Célia não têm advogados constituídos. Em depoimento, alegam inocência.


Fonte: Folha de S.Paulo - 02/08/2006

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