17/10/2013
Apesar do consenso a favor da matéria, governo e oposição divergiram quanto à forma de registro provisório dos profissionais vindos do exterior
O Senado aprovou nesta quarta-feira (16) o projeto de lei proveniente da medida provisória (MP 621/2013) que criou o Programa Mais Médicos, que permite a contratação de médicos estrangeiros e brasileiros formados no exterior para atuar em áreas pobres e remotas. Apesar do consenso a favor da matéria, governo e oposição divergiram quanto à forma de registro provisório dos profissionais vindos do exterior para o programa.
Na forma como foi aprovado pela Câmara dos Deputados, o texto do projeto (PLV 26/2013) transfere ao Ministério da Saúde a incumbência de fazer o registro dos médicos estrangeiros inscritos no programa. O dispositivo foi criticado pela oposição, que, através do senador José Agripino (DEM-RN), apresentou requerimento de destaque pela supressão dos parágrafos do projeto que tiravam dos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) a autoridade para emitir os registros.
O senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) chegou a classificar o dispositivo como avanço inconstitucional do Executivo, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) enxergou "intervenção estatal nunca vista", e, para Agripino, o projeto representa "humilhação" aos CRMs.
- É uma forma engraçada de deixar o CRM encostadinho. Por que isso? Por que respeitamos o Crea, respeitamos a OAB, mas deixamos isso? - indagou.
Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) sublinhou que o projeto resulta de entendimento do Congresso com a categoria e que o Conselho Federal de Medicina (CFM) manifestou satisfação com o Mais Médicos. Por sua vez, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) lembrou que o texto original da MP dava poder aos CRMs para registrar os médicos estrangeiros, mas as entidades estaduais, em sua avaliação, impunham exigências excessivas para emissão dos registros e impediam o exercício profissional de centenas de médicos.
Submetido a votação nominal, o requerimento recebeu 42 votos contrários e 15 favoráveis. O texto mantido estabelece que apenas a fiscalização do trabalho dos participantes do programa continuaria sendo feita pelos CRMs, e os médicos estrangeiros participantes do programa não poderão exercer a medicina fora das atividades do Mais Médicos.
Médicos cubanos
O consenso a favor do Mais Médicos não impediu questionamentos à oportunidade da vinda de médicos cubanos - o Executivo espera trazer 4 mil profissionais de Cuba até o fim do ano por meio de um acordo intermediado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Esses profissionais trabalharão nas regiões com menos proporção de médicos por habitante, com bolsa de R$ 10 mil, mais ajuda de custo para despesas de instalação (no valor de até três bolsas) e o pagamento das despesas de deslocamento até a cidade de trabalho.
Cássio Cunha Lima encaminhou voto a favor da matéria, mas classificou o Mais Médicos como parte de uma "engenhosa manipulação" do PT e enxergou o risco de que os cubanos atuem para doutrinar ideologicamente a população mais pobre. Mário Couto (PSDB-PA) criticou o acordo com Cuba, salientando que trata-se de uma ditadura, e declarou que a presidente Dilma Rousseff está "fora da realidade" do país por apresentar o Mais Médicos como solução para o atendimento de saúde.
João Ribeiro (PR-TO), que classificou o Mais Médicos como "grande tacada" de Dilma, opinou que será necessário trazer médicos do exterior enquanto o Brasil não formar profissionais em número suficiente. Ele lembrou o sucesso da vinda de 300 médicos cubanos para atuação em Tocantins. Eduardo Suplicy (PT-SP) acredita que os médicos brasileiros aprenderão com a experiência dos estrangeiros, e Humberto Costa (PT-PE) declarou que uma atenção básica organizada resolve 80% dos problemas de saúde de uma comunidade.
O caráter emergencial do Mais Médicos foi assinalado por Jader Barbalho (PMDB-PA), que, no entanto, lamentou a impotência dos médicos diante da pobreza dos pacientes. No mesmo sentido, Inácio Arruda (PCdoB-CE) lembrou que 700 municípios estavam sem profissionais de saúde, o que, em sua avaliação, prevalece sobre eventuais conflitos entre governo e médicos. José Agripino disse que o Mais Médicos é "um pedacinho" da solução, e Cristovam Buarque (PDT-DF) acredita que ainda seja "muito pouco" diante das carências.
Waldemir Moka (PMDB-MS) considera enganoso que a população pense que esses novos médicos serão a solução para o problema dos hospitais. Ele defendeu um plano de carreira que estimule a fixação de médicos no interior. Mário Couto acredita que os médicos têm vontade de atuar no interior, mas são desestimulados pelos baixos salários.
Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) afirmou que, ao apoiar a medida provisória, o Congresso deu uma lição de comprometimento com a saúde. Para ele, o Mais Médicos constitui um apoio importante para as cidades do interior.
- Temos que elogiar a coragem da presidente Dilma sua identificação com os mais pobres - afirmou.
Para Valadares, as críticas ao Mais Médicos vêm das mesmas forças políticas que, em 2008, derrubaram a Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF), o que, em seu cálculo, prejudicou o financiamento da saúde.
Cássio Cunha Lima considerou "falacioso" o argumento da falta de recursos, argumentando que o governo tem batido recordes de arrecadação de tributos. Ele disse que votaria novamente contra a CPMF avaliando que o povo paga demais ao governo.
Agripino pediu atenção ao problema do dinheiro para custeio do setor e pediu apoio à regulamentação da Emenda Constitucional nº 29, que estabelece percentuais mínimos a serem investidos na saúde pela União, estados, Distrito Federal e municípios. Jader Barbalho criticou a redução do investimento da União em saúde, o que sobrecarrega as unidades federadas, e culpou os parlamentares por aprovarem orçamentos inadequados. Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Aloysio Nunes também criticaram o subfinanciamento da saúde.
Revalidação
Um dos pontos mais polêmicos nos debates sobre a MP foi a necessidade de revalidação do diploma do médico estrangeiro. Segundo o texto aprovado, o estrangeiro não precisará revalidar o diploma nos três anos do programa. Os médicos estrangeiros somente poderão participar da prorrogação de três anos do Mais Médicos se integrarem "carreira médica específica", cuja definição depende de regulamentação em projeto de lei.
O registro dos médicos vindos do exterior será feito pelo Ministério da Saúde em substituição aos CRMs. Apenas a fiscalização do trabalho dos participantes do programa continuaria sendo feita pelos conselhos. Os médicos estrangeiros participantes do programa, porém, não poderão exercer a medicina fora das atividades do Mais Médicos.
Diferentemente do que estabelecia a redação original da MP, os médicos aposentados foram incluídos na categoria prioritária de contratação do programa. A medida provisória ainda modifica as regras para formação médica no Brasil. Os programas de residência médica deverão viabilizar, até 31 de dezembro de 2018, a oferta anual de vagas equivalentes ao número de graduados em medicina do ano anterior, consideradas as vagas de residência em medicina geral de família e comunidade e em residências médicas de acesso direto (genética médica, medicina do tráfego, medicina do trabalho, medicina esportiva, medicina física e reabilitação, medicina legal, medicina nuclear, patologia e radioterapia). Quanto ao internato - espécie de estágio exigido para a conclusão do curso de graduação - o texto estipula que ao menos 30% de sua carga horária serão destinados à atenção básica e ao serviço de urgência e emergência do SUS.
Fonte: Agência Senado com informações da Agência Câmara