14/09/2012

Luta por remuneração digna suspende atendimento a planos

Conselho vê como ético e legítimo movimento que terá atendimentos eletivos só por reembolso de 10 a 24 de outubro.



Os médicos brasileiros articulam para outubro a maior mobilização desde o advento da Lei 9656, de junho de 1998, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. Para protestar contra o descaso das operadoras na fixação do regramento contratual, as quais contrariam assim exigência da própria Agência Nacional de Saúde Suplementar, os médicos decidiram suspender o atendimento no período de 10 a 24. A medida alcança, assim, as operadoras de saúde que vêm demonstrando total desrespeito com o seu usuário ao não negociarem com os médicos, como justificam as lideranças médicas, ressaltando que, nesse período de15 dias, para que não haja desabastecimento na assistência, as consultas e demais procedimentos eletivos serão realizadas na modalidade de reembolso, como previsto em lei.


O foco da reivindicação da categoria é o cumprimento das determinações legais que se refere ao estabelecimento de relação comercial com o plano de saúde, aclarando regras e obrigações das partes, em especial na fixação do prazo desse contrato, critérios e índices de reajuste para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro e horário de atendimento. São questões que interferem na relação médico-paciente e que, sobretudo, alimentam os principais conflitos e deficiências na utilização dos serviços da saúde suplementar. Como reflexo, cresce a cada dia o grau de insatisfação dos usuários, como atesta recente pesquisa da Associação Paulista de Medicina, que detectou algum tipo de problema em 77% dos atendimentos.



CONTRATOS IRREGULARES



O movimento não alcança no primeiro momento os usuários do sistema Unimed, que terá sua análise na forma exigida pela Lei das Cooperativas. No Paraná, ainda, os usuários dos planos de autogestão de Sanepar e Copel não serão afetados porque as formalizações contratuais evoluíram. Como avaliado pelas comissões estaduais de defesa profissional, há um universo próximo de 30 milhões de beneficiários dos planos e seguros de saúde que poderá ser envolvido na suspensão dos serviços. Neste contexto estão as operadoras que negociam sem chegar a consenso (Unidas) e as que sequer iniciaram as negociações (Abramge e Fenasaude).


"É notório e incontestável o esforço das entidades médicas nacionais na tentativa da formulação de acordos com as operadoras de saúde para a regularização de tais contratos e a recomposição dos honorários médicos, cuja valoração é muita baixa quando não aviltante", diz trecho de nota divulgada pela comissão de defesa profissional no Paraná, a qual esclarece que, durante os 15 dias, a cobrança do valor das consultas e procedimentos será realizada diretamente do paciente. Este, deve exigir o devido reembolso na sede das operadoras de saúde e, na hipótese de negativa, comunicar a ANS e o Procon. Ainda de acordo com representantes do movimento médico, todos os atendimentos de urgência e emergência serão mantidos sem quaisquer modificações. Do mesmo modo, os serviços públicos não serão afetados, sendo alternativa àqueles que não desejarem o reembolso.



MOVIMENTO LEGÍTIMO



O presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná, Alexandre Gustavo Bley, avalia o movimento dos médicos como legítimo para assegurar melhores condições de trabalho, o que inclui remuneração digna e explicitação de seus direitos e deveres. Ele cita o Código de Ética Médica que, em seus princípios fundamentais, expressa que "para exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa", e ainda que "o trabalho do médico não pode ser explorado por terceiros com objetivo de lucro" e que "o médico será solidário com os movimentos de defesa da dignidade profissional, seja por remuneração digna e justa, seja por condições de trabalho compatíveis com o exercício ético-profissional da Medicina e seu aprimoramento técnico-científico".


Ainda de acordo com o representante do CRM-PR, o movimento serve para esclarecer à sociedade que não há contratos celebrados à vista da legislação entre médicos e operadoras, o que acaba se refletindo diretamente na atenção aos usuários dos serviços. Alexandre Bley diz que, conforme dados da própria ANS e de pesquisas de instituições médicas ou de defesa do consumidor, a demora na marcação ou na autorização da consulta, médico que se descredenciou e lista desatualizada de conveniados estão entre as principais queixas dos beneficiários dos planos. Para ele, situações reparáveis com a formalização de instrumento jurídico entre as partes e a valorização do trabalho médico. Cita que, sem a definição de um acordo, a responsabilidade está indevidamente recaindo sobre o médico. "A opinião pública está iludida ao achar que o médico é o responsável pelo que está ocorrendo. A responsabilidade é da operadora que, de forma protelatória, não cumpre as resoluções normativas da ANS, beneficiando-se das limitações impostas aos usuários, que são os principais prejudicados", assinala.


Para o presidente do Conselho do Paraná, a restrição de liberdade imposta pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) às entidades médicas, impedindo-as de legitimar negociações que têm amparo no Código de Ética Médica, Código Civil e Constituição Federal, fez elevar o grau de insatisfação dos médicos contra os planos, que se traduz pela expansão do movimento em todo o País, com substancial reforço do uso das redes sociais. Assim, considera o engajamento pleno dos profissionais como fundamental instrumento para balizar todas as negociações futuras com os compradores de serviços, sob pena de o trabalho médico subjugar-se àqueles que o exploram sob interesse do lucro. "Os colegas são conclamados a seguir seus ditames éticos, que se iniciam no zelo da atenção à vida e se completam no respeito à dignificação da Medicina", reforça o conselheiro, lembrando ter sido escolhido o mês de outubro por ser o mês em que se comemora o dia do médico (18).


No que se refere à Unimed, Alexandre Bley entende que, apesar de a questão necessitar ser resolvida no âmbito da cooperativa, vê com muita preocupação a atual postura administrativa, que está desvalorizando o trabalho dos médicos cooperados. "Espero que a Unimed também demonstre boa vontade e busque valorizar seus profissionais, trazendo o nível de excelência que seus usuários merecem", conclui.

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