09/04/2009
Lei dos Conselhos: o ônus da norma ultrapassada
Em 50 anos de existência, as normas que regem os CRMs e o CFM somente foram alteradas em 2004, em pontos limitados...
A falta de amparo legal coloca os Conselhos à margem do ordenamento jurídico, comprometendo, por vezes, seus integrantes
e dirigentes
"O engessamento das atividades e a transformação dos Conselhos em meros órgãos cartoriais atendem unicamente a interesses
de grupos particulares"
Os Conselhos Regionais e Federal de Medicina foram criados em 1958, ainda no governo do então presidente Juscelino Kubitschek.
Nestes 50 anos de existência, as normas somente foram alteradas por meio de legislação de 2004, mas apenas em alguns e limitados
pontos. No mesmo período, o Brasil saltou de pouco mais de 10 mil médicos em atividade para mais de 300 mil profissionais
registrados atualmente. No Estado de São Paulo, em cinco décadas, cresceu 17 vezes o contingente de médicos, passando de 6.000
para 100 mil profissionais, que hoje atendem a uma população usuária de 40 milhões de cidadãos.
O reconhecimento de firma em cartório para o exercício de voto; e a exigência de assembléia geral de médicos para aprovação
de contas e transações imobiliárias são alguns dos exemplos absurdos que demonstram o quanto estão desatualizadas a legislação
e a regulamentação dos conselhos. A realização de uma assembléia com capacidade de participação de 100 mil médicos, embora
irracional, está lá, prevista na lei cinquentenária.
Há quase 20 anos, por iniciativa do então deputado federal Sérgio Arouca, tramita no Congresso Nacional um projeto de
lei (PL) que pretende atualizar a lei de criação dos Conselhos de Medicina. Recentemente, a Comissão de Constituição e Justiça
detectou um vício de inconstitucionalidade. A matéria tratada no PL é de iniciativa exclusiva do Poder Executivo. Assim, o
PL, após tanto tempo de tramitação deverá ser remetido à Casa Civil da Presidência para, eventualmente, voltar a tramitar
no Legislativo. Destaca-se, ainda, o projeto de 1999, da ex-deputada federal Jandira Feghali, posteriormente apensado a outras
propostas, que pretendia nova organização, com ênfase no papel social e na ampliação do campo de atuação dos Conselhos; criação
do Conselho Pleno Nacional; alteração da composição dos Conselhos Regionais, que passariam a fixar o respectivo número de
integrantes, conforme limites estabelecidos; maior descentralização das atividades dos Conselhos Regionais, dentre outras
medidas necessárias.
No vácuo legislativo, para garantir a continuidade dos serviços prestados aos médicos e à sociedade, os Conselhos Regionais
de Medicina editaram normas infra-legais. No entanto, a falta de amparo legal coloca os Conselhos à margem do ordenamento
jurídico, comprometendo, por vezes, seus integrantes e dirigentes.
A situação se verifica em todas as unidades da federação que têm grande concentração de médicos, de serviços de saúde
e de cidadãos. Mas São Paulo, pela sua magnitude, é o Estado mais atingido, pois o Cremesp tem a responsabilidade de fiscalizar
a atuação de cerca de 100 mil profissionais e de 34 mil empresas registradas; abre mais de 3.000 sindicâncias e realiza mais
de 1.200 audiências por ano, sem contar a expansão natural de suas atividades sociais, representativas, políticas e administrativas,
para muito além das atribuições éticas, judicantes e de fiscalização.
O engessamento das atividades e a transformação dos Conselhos em meros órgãos cartoriais atendem unicamente a interesses
de grupos particulares. Não podemos impedir o cumprimento das responsabilidades legais e nem tampouco paralisar a modernização
dos Conselhos de Medicina, que devem estar cada vez mais próximo dos anseios da sociedade e das necessidades concretas da
população.
Artigo escrito pelo Dr. Henrique Carlos Gonçalves, Presidente do Cremesp