07/01/2009
Justiça condena laboratório a fornecer medicamento
Decisão obriga farmacêutica a devolver ao Estado valores gastos com medicação de criança que participou de estudo
O laboratório que realiza pesquisas em seres humanos é responsável por fornecer o medicamento testado ao paciente mesmo
após o estudo finalizado. O entendimento é do juiz José Antônio Daltoé Cezar, da 2.ª Vara da Infância e da Juventude de Porto
Alegre (RS), que condenou um laboratório internacional a devolver aos cofres públicos valores gastos com a medicação fornecida
a uma criança que havia participado de um ensaio clínico.
O menino Kauã de Godoy Chaves Pereira, de Canoas (RS), era portador de uma doença rara e progressiva (mucopolissacaridose
tipo I), decorrente da deficiência da enzima alfa-L-iduronidase.
A criança, que já morreu, submeteu-se a um tratamento experimental no Hospital de Clínicas de Porto Alegre com o remédio
Laronidase. À época, precisava de cerca de 12 frascos mensais do medicamento, a um custo de US$ 7.200 ao mês.
O estudo foi patrocinado pelo Laboratório Biomarin/ Genzyme, de março a agosto de 2005, com fornecimento do remédio até
abril de 2006. Após o período, a família ajuizou ação para que o Estado do Rio Grande do Sul fornecesse a droga.
O Estado forneceu a medicação, mas questionou judicialmente se era ético permitir que o laboratório se utilizasse dos
pacientes para o desenvolvimento de pesquisas que visem a obter registro de suas drogas e, alcançando o seu objetivo, os abandonassem,
remetendo ao poder público o custeio de medicamento de alto valor.
Na sentença, de 156 páginas, o juiz Cezar acolheu as teses do Estado e determinou que as empresas Genzime do Brasil Ltda.,
Biomarin Pharmaceutical Ltda. e Genzyme Corporation deverão pagar ao Estado a quantia de R$ 72,9 mil devidamente corrigida
e atualizada até a data do pagamento. Cabe recurso da decisão.
Riscos da pesquisa
Para o juiz, todo ensaio clínico envolvendo humanos implica riscos ao sujeito da pesquisa e graves e sérias responsabilidades
àquele que a ministra. "É intuitiva a noção de que os laboratórios denunciados são responsáveis pela manutenção do tratamento
daquelas pessoas-ainda mais em se tratando de criança- que serviram de sujeito de pesquisa no experimento", diz a sentença.
O laboratório alega que a droga testada tem eficácia reconhecida na Europa e EUA e que a pesquisa em Porto Alegre não
teve caráter experimental, mas finalidade de aprimoramento quanto à dosagem.
A empresa argumentou também que a intenção era fornecer o remédio gratuitamente, por tempo limitado, até que fosse possível
a compra ou o reembolso aos pacientes. Para o juiz, no termo de consentimento informado não estava prevista a hipótese de
limite no tempo para o fornecimento do medicamento.
Fonte: Folha de São Paulo