04/06/2019
Pai e filho dedicaram-se ao ensino e exercício da Medicina; história da família passa pela própria história do desenvolvimento do Estado do Paraná e constituição do CRM-PR
A história de vida do médico pioneiro paranaense Haroldo Trevisani Beltrão (CRM-PR 214) e de sua família passa pela própria história do desenvolvimento do Estado do Paraná. Filho do colonizador e engenheiro civil Francisco Gutierrez Beltrão – importante figura política paranaense que deu nome à cidade de Francisco Beltrão –, e de Lavínia Trevisani Beltrão, Dr. Haroldo seguiu com excelência o legado de seus ascendentes, tanto em relação à carreira na Medicina, como também ao Magistério, atuando como professor livre-docente na Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Nascido em 1904, na cidade de Curitiba, o Prof. Haroldo Trevisani Beltrão foi o quarto de nove irmãos, dois deles falecidos ainda na infância. Seu irmão caçula, Dr. Lineu Trevisani Beltrão (CRM-PR 518), também foi médico em Curitiba, falecendo no ano de 1995, aos 81 anos. Em 1988, ele tinha sido homenageado pelo Conselho de Medicina, que lhe conferiu o Diploma de Mérito Ético-Profissional na passagem do Jubileu de Ouro e uma trajetória exemplar. Um dos filhos dele, Dr. Lineu Prado Beltrão (CRM-PR 4790), seguiu seus passos na profissão e se formou em 1975 pela PUCPR, escolhendo a Pediatria como especialidade.
Origem com imigrante italiano
A matriarca da família, D. Lavínia, era filha do médico italiano Francisco Lucas Trevisani, nascido em Modena em 22 de julho de 1850 e que imigrou ao Brasil ainda no século XIX, para a cidade paranaense de Palmeira, a cerca de 70 quilômetros da Capital. Ali, D. Lavínia conheceu aquele que seria o futuro marido, Francisco Gutierrez Beltrão, o qual, anos depois, se tornaria um dos fundadores da UFPR, no ano de 1912.
Em 1929, o Dr. Haroldo Trevisani Beltrão formava-se na Universidade Federal do Rio de Janeiro, antiga Faculdade de Medicina do Brasil. Casado com Izabel de França Beltrão, com ela teve dois filhos: Luiz Fernando Bittencourt Beltrão (CRM-PR 212), que seguiu os passos do pai na profissão e se formou em 1956, e o Prof. Dr. Paulo Bittencourt Beltrão, que presidiu o Conselho Estadual de Educação.
Ao longo de sua carreira médica, o Dr. Haroldo Trevisani Beltrão participou ativamente das atividades em defesa da classe. No ano de 1952, foi nomeado presidente do Departamento de Puericultura e Pediatria da Associação Médica do Paraná (AMP), órgão que originaria, anos depois, a Sociedade Paranaense de Pediatria (SPP) – os primeiros títulos de pediatria seriam concedidos pela SPP somente em 1967, a 40 médicos especialistas.
Juntamente com o filho Dr. Luiz Fernando, o Dr. Haroldo inscreveu-se no CRM-PR no dia 14 de agosto de 1958. Compôs a chapa concorrente ao primeiro pleito para indicação de conselheiros efetivos e suplentes do Conselho do Paraná, para o período de 1959 a 1963. Empossado em 30 de maio de 1959 como membro efetivo, assumiu depois a função de 2º tesoureiro para a gestão de dezembro de 1961 a novembro de 1963.
Ainda no ano de 1959, fez parte da comissão constituída para equipar o Hospital de Clínicas da UFPR, após a sua construção. Presidido pelo médico Milton de Macedo Munhoz e com a participação do engenheiro Ewaldo Nickel e do também médico Eloi Vicente Bettega, o grupo planificou a utilização do hospital de dimensões inéditas para o Paraná da época. Após a inauguração, Dr. Haroldo fez parte da diretoria do HC entre os anos de 1961 e 1965, como diretor da Divisão Médica.
Dr. Haroldo faleceu em 1969, aos 65 anos. Em 1973, o município de Curitiba, por meio da lei nº 4.717/1973, determinou que o médico denominasse um dos logradouros públicos da capital (atual Largo Prof. Haroldo Trevisani Beltrão, localizado no bairro Água Verde). É também patrono da cadeira de número 20 da Academia Paranaense de Medicina, a qual foi ocupada, posteriormente, por seu filho.
Luiz Fernando Bittencourt Beltrão
Seguindo com brilho o exemplo profissional do pai, o Dr. Luiz Fernando Bittencourt Beltrão (CRM-PR 212) construiu carreira tanto no exercício da Medicina como também no seu ensino e na atuação em órgãos de classe. Nascido em Ponta Grossa, em 1933, formou-se pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) em 1956, tornando-se um dos pioneiros da cirurgia pediátrica no Estado. Era casado com D. Vilma Beltrão, com quem teve quatro filhos: Luiz Roberto, Carlos Eduardo, Vivianne e Claudio José.
Especializou-se em cirurgia pediátrica na França, Rio de Janeiro e São Paulo, exercendo a especialidade no Hospital de Crianças César Pernetta (precessor do Hospital Infantil Pequeno Príncipe), além de consultório particular. No hospital, projetou-se como profissional de elevada qualificação, atendendo pacientes de todo o Estado e influenciando a formação de uma nova geração de cirurgiões pediatras, conforme relato do amigo e ex-presidente da Sociedade Paranaense de Pediatria, Dr. Diether Henning Garbers.
Colecionou, ao longo de sua carreira, os mais altos postos nas entidades médicas representativas do Paraná e do Brasil. Assim como seu pai, o Dr. Luiz Fernando presidiu o Departamento de Puericultura e Pediatria da Associação Médica do Paraná (1963-1964), que depois ganharia a denominação de Sociedade Paranaense de Pediatria, e foi conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Paraná entre os anos de 1973 e 1978, ocupando a função de 2º secretário entre os anos de 1973 e 1976.
Foi também presidente da Associação Médica do Paraná (AMP) no triênio 1977-1979; acadêmico titular da Academia Paranaense de Medicina (APM) a partir de 1979; presidente da Associação Brasileira de Cirurgia Pediátrica (CIPE) entre os anos de 1982 e 1984; diretor do Setor de Ciências da Saúde da UFPR (1986-1990); e patrono da cadeira 16 da Academia Nacional de Cirurgia Pediátria (ANCIPE).
Em 2003, em parceria com o pediatra Diether Garbers, publicou o livro “Uma história da pediatria no Paraná”. No ano de 2006, Dr. Luiz Fernando foi homenageado pelo CRM-PR com o Diploma de Mérito Ético-Profissional, concedido a profissionais que tenham completado 50 anos ininterruptos de atividade sem qualquer sanção disciplinar e com exemplar conduta médica.
“Por suas atitudes humanas, cristãs e de bondade, projetou-se nacionalmente, tendo participado de inúmeros Congressos. Foi nesta fase que nossa relação com Luiz Fernando cresceu”, afirmou Dr. Garbers em nota de pesar publicada pela SPP por ocasião de seu falecimento, em 2009. “Dialogar e trabalhar em conjunto era para nós uma satisfação imensa, tamanha relação de amizade que juntos construímos”, relatou, relembrando ainda sua “memória prodigiosa e vontade ilimitada ao trabalho.”
Em depoimento ao Jornal da CIPE, também em 2009, a cirurgiã pediátrica Marlene de Almeida ressaltou o “invejável currículo profissional” do colega. Dr. Luiz Fernando faleceu aos 75 anos, deixando boas lembranças: “O sorriso frequente, em que assinalava que a vida deveria ser vista sempre pelo lado positivo, e a palavra certa no momento oportuno serão as lembranças marcantes para todos os que tiveram a chance de conviver com ele”, relatou.
Curiosidades
O engenheiro Francisco Gutierrez Beltrão foi homenageado emprestando nome a Francisco Beltrão, um dos maiores entre os 42 municípios da região Sudoeste do Paraná. Por sinal, no dia 29 de maio de 2019 foi completado o 80º aniversário da morte de Francisco, nascido em Paranaguá em novembro de 1875. Ele faleceu em Ponta Grossa, em 1939, mas foi sepultado em Curitiba. Diplomado em 1897 pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, foi deputado estadual do Paraná e secretário de Obras Públicas do Governo estadual e diretor-presidente da Sociedade Técnica e Colonizadora Engenheiro Beltrão.
O irmão dele, o também engenheiro civil Alexandre Gutierrez Beltrão (1896-1987), é quem, segundo registros históricos, dá nome a outro município paranaense, Engenheiro Beltrão, que fica na microrregião de Campo Mourão, no Noroeste. Contudo, há fontes que indicam que um dos filhos de Francisco, o também engenheiro Duílio Trevisani Beltrão, é quem estaria reverenciado na denominação daquela cidade. Herdeiro na direção da colonizadora, Duílio foi fundador e primeiro prefeito de Tamboara, também no Noroeste.
Francisco Gutierrez Beltrão, o pai do Drs. Haroldo e Lineu, tem ancestrais que remontam à colonização portuguesa, com raízes em Pernambuco. O pai dele, Francisco Cunha Machado Beltrão, foi o precursor da família no Paraná. Formado em Direito pela Faculdade de Recife em 1861, dois anos depois foi investido da função de juiz municipal de Paranaguá, seguindo depois para o Rio Grande do Norte. Retornou ao Sul em 1885 e foi juiz de Direito em várias comarcas do Paraná e Santa Catarina, neste estado aposentando-se como desembargador, em 1887. Encerrada a carreira na magistratura, voltou a residir em Curitiba, dedicando-se à advocacia e à política. Ocupava a cadeira presidencial do Congresso Estadual do Paraná, quando sofreu infarto fulminante, em março de 1903, ano e meio antes do nascimento do neto Haroldo.