20/07/2015
Campo Mourão não tem programa de residência e apenas 150 leitos no SUS, 100 a menos que o mínimo exigido
Parte das 36 cidades brasileiras que receberam aval do Ministério da Educação (MEC) para abrigar novos cursos de Medicina não cumpre requisitos básicos de infraestrutura exigidos em edital da própria pasta para a aprovação das novas vagas de graduação. Levantamento feito pelo Estado em 11 desses municípios mostra que alguns têm número de leitos públicos inferior ao exigido pelo MEC ou não têm programa de residência ou hospital de ensino, outros dois critérios do edital.
No último dia 10, o governo federal anunciou os nomes das instituições privadas escolhidas para abrir 2.290 novas vagas. Agora, as entidades têm de três a 18 meses para oferecer os cursos. A expansão das escolas médicas é uma das diretrizes do programa Mais Médicos. A meta do governo federal é ofertar 11.447 novas vagas de Medicina até o fim de 2017, das quais 4.637 foram abertas.
Como pré-requisitos previstos no edital, publicado em 2013, os municípios deveriam ter mais de 70 mil habitantes, não ser capitais nem ter curso de Medicina. Também era exigida estrutura mínima de saúde, como existência de cinco leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) para cada aluno do curso, além de serviço de urgência e emergência, programa de residência, entre outros detalhes.
Dados das prefeituras contatadas pela reportagem mostram que, das 11 cidades pesquisadas, três não têm nenhum programa de residência: Rio Claro (SP), Cubatão (SP) e Campo Mourão (PR). As duas últimas, ao lado de Mauá, no ABC paulista, e Piracicaba, interior, não respeitam o número mínimo de leitos por aluno. Na cidade paranaense, por exemplo, há 150 leitos no SUS, quando o mínimo exigido seria 250, considerando 50 vagas do curso.
A falta de um hospital-escola é o problema mais prevalente. Das 11 cidades ouvidas, apenas duas têm unidades de ensino: Jaú (SP) e Passos (MG).
O diagnóstico já havia sido feito e repassado ao governo por especialistas contratados pelo MEC para visitar as cidades. Após avaliar as estruturas desses municípios, no fim do ano passado, os especialistas informaram que, das 39 cidades pré-selecionadas inicialmente, só nove reuniam todas as condições para abrigar o curso.
Para o presidente da Associação Brasileira de Educação Médica (Abem), Sigisfredo Brenelli, o parecer foi ignorado pelo MEC. “Nosso relatório não foi usado. Ele foi engavetado e, praticamente, todas essas cidades receberam a autorização para abrir cursos. Estamos preocupados porque achamos que parte delas não tem infraestrutura física e de recursos humanos para oferecer um curso com qualidade técnica e ética.”
A divergência fez a Abem publicar uma carta à comunidade acadêmica contra a aprovação de todos os municípios. “Na formação médica, o aluno tem de lidar com todos os cenários de aprendizagem, desde a atenção básica até um hospital universitário. Ter hospital de ensino e programas de residência indicam que o local tem profissionais com a qualificação mínima para ensinar”, ressalta ele.
Justiça
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), Bráulio Luna Filho, diz que o órgão entrará na Justiça para tentar impedir a abertura dos cursos. “Em primeiro lugar, tem a questão da falta de estrutura. Se uma cidade não cumpre esses requisitos, é lógico que a formação médica vai ser insuficiente. Outro ponto é que algumas instituições privadas autorizadas a abrir as novas vagas já têm cursos de Medicina em outras cidades e as avaliações são ruins.” Das 36 cidades que receberão as novas graduações, 13 ficam no Estado de São Paulo.
Cumprimento de acordo de municípios
O MEC informou que as prefeituras “assinaram termo de adesão que representa o compromisso” em oferecer a estrutura necessária para o funcionamento do curso. A pasta vai monitorar as instituições e os municípios para garantir o cumprimento do acordo.
Sobre a falta de hospitais de ensino, o MEC afirma que o município deve indicar centro médico “com potencial” de ser certificado como tal. Já sobre a falta de leitos, diz que Mauá e Piracicaba têm a quantidade necessária e que Campo Mourão firmou parceria com cidades vizinhas para atingir o índice. Ressalta que municípios que ainda não têm programa de residência são obrigados a desenvolvê-lo.
Fonte: O Estado de S.Paulo