25/07/2013

Governo admite rever dois anos extras nos cursos de Medicina

Bombardeado com críticas sobre o programa Mais Médicos, governo já admite rever sua decisão de ampliar curso de Medicina com os dois anos extras de serviços prestados no SUS

Lançado há 16 dias pela presidente Dilma Rousseff via medida provisória, o Mais Médicos tem dois eixos: fixar médicos brasileiros e estrangeiros em regiões carentes desses profissionais, e ampliar o curso de medicina com dois anos de trabalho na rede pública de saúde.

A proposta conquistou a resistência de médicos, parlamentares e faculdades de medicina públicas e privadas.

Após reunião com o CNE (Conselho Nacional de Educação), na quarta-feira (24), os ministros Alexandre Padilha (Saúde) e Aloizio Mercadante (Educação) falaram sobre soluções alternativas que serão estudadas.

"Você teria dois anos adicionais, obrigatoriamente para todos os estudantes de medicina, como residência médica e iniciaria seu desenvolvimento --porque algumas têm mais de dois anos-- no âmbito do SUS. Em vez de serem dois anos a mais de graduação, a recomendação da comissão de especialistas do MEC é que fossem dois anos de residência médica", afirmou Mercadante.

Segundo o ministro, a ideia dos especialistas é manter a graduação com os seis anos atuais e tornar obrigatório o início da residência médica --na área de especialidade escolhida pelo formado-- logo após a conclusão dos seis anos de graduação. Hoje não há vagas de residência para todos os formados, e a residência médica é optativa.

Uma proposta nesse sentido deve ser formalizada ao governo pela comissão de especialistas até a próxima semana, disse Mercadante.

"Vamos aguardar a proposta deles, para MEC e Ministério da Saúde se posicionarem. Mas eu fiquei muito otimista, porque a medida provisória do Mais Médicos já previa que os dois anos [poderiam] ser tratados como residência médica."

A ideia, no entanto, se choca com o modelo divulgado pelo governo há pouco mais de duas semanas. Isso porque o discurso inicial era o de manter o aluno na graduação por dois anos a mais, prestando serviços básicos à população, em postos de saúde e no Samu. E, não, já participando de atividades em uma área de especialização.

Mercadante não negou que há contradição entre a nova proposta em estudo e o que vinha sendo defendido pelo ministro da Saúde. "É, ele falou, na graduação seria [serviço na] atenção básica, urgência e emergência. Mas, desde o início, a medida provisória do Mais Médicos aventava a possibilidade da residência médica [considerar os dois anos extra da graduação para abater um período da residência]. Se for [por uma] residência médica, será urgência e emergência e atenção básica, mas já será também focada na área específica da formação que o profissional irá se desenvolver."

MUDAR OS SEIS ANOS DA GRADUAÇÃO

Outra possibilidade no radar do Executivo é ampliar o contato do aluno de medicina com a rede básica de saúde do SUS ainda nos primeiros seis anos de graduação.

"As escolas médicas já nos apresentaram propostas, por exemplo, de mudança dentro dos seis anos do curso de medicina, ampliar o internato [última fase da graduação atual de medicina]. A USP, por exemplo, está com um processo muito positivo para ampliar para 3 anos seu internato", disse Padilha.

"O central, qual é? Ampliar o período que o médico em formação fica no ambiente fora do hospital, dentro do SUS e acompanhando o mesmo paciente por um período prolongado", repetiu o ministro.

Questionado sobre se o governo poderia abrir mãos dos dois anos extra propostos, Padilha afirmou que "o debate vai para o CNE".

O programa Mais Médicos foi uma dos cinco "pactos" sugeridos pelo governo Dilma Rousseff a prefeitos e governadores como forma de responder à onda de protestos de rua de junho.

O outro, o plebiscito para a convocação de uma assembleia constituinte para a reforma política, durou menos de 24 horas por ser inconstitucional. Seu substituto, a ideia de um plebiscito para definir os pontos da reforma a serem debatidos no Congresso, fracassou em seguida por falta de apoio na própria base do governo.

* * *

Nova proposta ainda carece de detalhes cruciais

Residência obrigatória muda plano original e pode ser uma boa saída, mas ainda depende de ser esmiuçada

A entrada do Conselho Nacional de Educação (CNE) na querela do programa Mais Médicos abre espaço para uma discussão menos ruidosa e menos desinteligente de um dos pontos mais polêmicos do plano do governo federal, o acréscimo de dois anos à formação obrigatória para exercer a medicina.

A proposta original, ampliar de seis para oito anos o próprio curso de graduação com um segundo ciclo de serviço em unidades básicas do SUS, recebeu muitas críticas.

Foi considerada autoritária por abranger também estudantes de faculdades particulares, não só das públicas e gratuitas, e por eventualmente vir a forçá-los a trabalhar em cidades ou bairros que não escolheram.

Além do mais, o pagamento de R$ 10 mil mensais seria na forma de bolsa, portanto sem os benefícios previstos na legislação trabalhista.

Pareceu duvidoso, ainda, que o governo fosse capaz de coordenar centenas de cursos para oferecer efetiva supervisão aos recém-formados enviados para o cenário de batalha em que se converteu a atenção básica de saúde. Na prática, a iniciativa foi tomada como uma forma barata de reforçar equipes nos postos de atendimento.

Avança agora a proposta de transformar os dois anos adicionais numa residência médica e torná-la obrigatória. Como esses cursos práticos de formação de especialistas --que duram em geral de dois a cinco anos-- são hoje complemento imprescindível da formação médica, cada vez mais especializada, sua universalização é considerada por muitos a melhor solução.

Dos quase 400 mil médicos do país, 88 mil trabalham sem possuir título de especialista. São oferecidas a cada ano cerca de 11 mil vagas de residência, para mais de 15 mil formandos, e mesmo assim várias delas ficam ociosas por falta de candidatos interessados. O governo federal tem planos de criar mais 12 mil vagas até 2017, que no entanto mal cobrirão as outras 11 mil de graduação que também já anunciou.

Faltam detalhes cruciais, além disso. Quais instituições sediarão os programas de residência? Como se articularão com as unidades básicas de saúde? Quem definirá as especialidades prioritárias? Como serão selecionados os residentes no sistema obrigatório? E assim por diante.

O novo conceito só poderá ser avaliado à medida que a proposta do CNE for enfim esmiuçada. Com ela, porém, muda radicalmente a ideia original --e nada impede que seja para melhor.

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Em meio a críticas, braço da OMS diz apoiar programa Mais Médicos

Em meio a uma chuva de críticas de médicos, políticos e escolas de medicina direcionadas ao programa Mais Médicos, a OPAS (braço da Organização Mundial da Saúde para as Américas) saiu em defesa da proposta do governo Dilma Rousseff.

Em nota publicada em seu site, a OPAS afirma que "vê com entusiasmo o recente pronunciamento do governo brasileiro sobre o programa Mais Médicos".

"Para a OPAS/OMS, as medidas de levar médicos, em curto prazo, para comunidades afastadas e de criar, em médio prazo, novas faculdades de medicina e ampliar a matrícula de estudantes de regiões mais deficientes, assim como o numero de residências médicas, são corretas, pois países que têm os mesmos problemas e preocupações do Brasil, estão colhendo resultados da implementação dessas medidas. Em longo prazo, a prática dos graduandos em medicina, por dois anos no sistema público de saúde, deve garantir, juntamente com o crescimento do sistema e outras medidas, maior equidade no SUS", diz o texto publicado na semana passada.

O programa tem dois eixos principais: fixar médicos brasileiros e estrangeiros no interior do país e nas periferias das grandes cidades, e ampliar o curso de medicina, com dois anos extra de serviços prestados na rede pública de saúde.

Hoje, porém, o governo admitiu que pode rever a ampliação do curso de medicina com os dois anos extras de serviços prestados no SUS (Sistema Único de Saúde) após a resistência de médicos, parlamentares e faculdades de medicina públicas e privadas.

"Em vez de serem dois anos a mais de graduação, a recomendação da comissão de especialistas do MEC é que fossem dois anos de residência médica", afirmou o ministro Aloizio Mercadante (Educação).

Fonte: Folha de S. Paulo

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