18/09/2019
Ao publicar a Resolução CFM nº 2232/19, o Conselho reitera o compromisso com o respeito à dignidade da pessoa humana, atendendo a uma antiga demanda de médicos e de pacientes
Aos pacientes maiores de idade, capazes, lúcidos, orientados e conscientes, é facultado o direito de recusa à terapêutica proposta pelo médico em qualquer tratamento eletivo. Da mesma forma, é garantido ao médico o direito a objeção de consciência, quando, diante da recusa terapêutica do paciente, o médico, eticamente, deixa de realizar condutas que, embora permitidas por lei, são contrárias aos ditames de sua consciência. Estes são os pilares da Resolução CFM nº 2232/19, publicada nesta segunda-feira (16) no Diário Oficial da União.
“Esta Resolução regulamenta relevante conquista da sociedade brasileira, materializada na Constituição Federal, nas leis em geral e no Código de Ética Médica. O Conselho Federal de Medicina, ao aprová-la, cumpre, mais uma vez, o seu compromisso com o respeito à dignidade da pessoa humana, atendendo a uma antiga demanda de médicos e de pacientes”, comemora o relator da norma e também 1º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Ribeiro.
A regra, que entra em vigor de imediato, estabelece normas éticas para a recusa terapêutica por pacientes e objeção de consciência na relação médico-paciente. Segundo explica o relator, o direito à recusa terapêutica deve ser respeitado pelo médico, desde que ele informe ao paciente os riscos e as consequências previsíveis da sua decisão, podendo propor outro tratamento disponível.
“Não tipifica infração ética de qualquer natureza, inclusive omissiva, o acolhimento, pelo médico, da recusa terapêutica prestada na forma prevista nesta Resolução, tampouco caracteriza a omissão de socorro prevista no Código Penal. O contrário: o tratamento forçado poderia caracterizar crime”, esclarece. Em alguns casos, no entanto, a recusa terapêutica não deve ser aceita pelo médico, quando houver caracterização de abuso de direito.
Exceções
São considerados casos de abuso de direito, segundo a Resolução, aqueles em que a recusa terapêutica pode colocar em risco a saúde de terceiros. Além disso, a recusa não aplica ao tratamento de doença transmissível ou de qualquer outra condição semelhante que exponha a população a risco de contaminação. Quando manifestada por gestante, a recusa terapêutica também deve ser analisada na perspectiva do binômio mãe e feto, podendo o ato de vontade da mãe caracterizar abuso de direito dela em relação ao feto.
Em situações de risco relevante à
saúde, o médico também não deve aceitar a recusa terapêutica de paciente menor de idade
ou de adulto que não esteja no pleno uso de suas faculdades mentais, independentemente de estarem representados ou
assistidos
por terceiros. Além disso,
em situações de urgência e emergência que caracterizarem iminente perigo de morte, o médico
deve adotar todas as medidas necessárias e reconhecidas para preservar a vida do paciente, independentemente da recusa
terapêutica.
“Havendo discordância insuperável entre o médico e o representante, assistente legal ou familiares do paciente quanto à terapêutica proposta, ele deve comunicar o fato às autoridades competentes, como Ministério Público, Polícia, Conselho Tutelar e etc, visando o melhor interesse do paciente”, enfatiza Mauro Ribeiro.
Objeção de consciência
A Resolução regulamenta ainda a objeção de consciência como direito do médico de se abster do atendimento diante da recusa terapêutica do paciente. A Resolução ressalva, no entanto, que, na ausência de outro médico, em casos de urgência e emergência e quando a recusa em realizar o tratamento trouxer danos previsíveis à saúde do paciente, a relação não pode ser interrompida por objeção de consciência. Nesses casos, o médico responsável deve adotar o tratamento indicado, independentemente da recusa terapêutica.
“A interrupção da relação do médico com o paciente por objeção de consciência impõe ao médico o dever de comunicar o fato ao diretor técnico do estabelecimento de saúde, visando garantir a continuidade da assistência por outro médico, dentro de suas competências”, ressalta o artigo 9º da norma. Em caso de assistência prestada em consultório, o médico deve registrar no prontuário a interrupção da relação com o paciente por objeção de consciência, dando ciência a ele, por escrito, e podendo, a seu critério, comunicar o fato ao Conselho Regional de Medicina.
Consentimento
De acordo com o relator, o Código de Ética Médica atribuiu ao paciente a condição de parte principal da relação com o médico, legitimada em um vínculo de respeito mútuo que se materializa no consentimento livre e esclarecido. O documento, geralmente assinado pelo paciente ou responsável, é recomendado quando há a necessidade de formalizar o consentimento ao médico sobre a realização ou não de determinado procedimento diagnóstico ou terapêutico, após haver recebido informações pertinentes.
“O consentimento livre e esclarecido não foi concebido como instrumento de proteção contra riscos da profissão, como se fosse um seguro de responsabilidade civil para proteger o médico, mas, sim, como garantia da autonomia e da dignidade do paciente”, completa o 1º vice-presidente. O relator destaca, ainda, que a recusa terapêutica “deve ser prestada, preferencialmente, por escrito e perante duas testemunhas quando a falta do tratamento recusado expuser o paciente a perigo de morte”.