29/08/2008
Entidades alertam sobre medicina estética
Três entidades enviaram um comunicado aos médicos do país para alertar que a medicina estética não existe como especialidade
médica. O documento assinado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) e pela AMB (Associação Médica Brasileira) -as mais altas
entidades médicas do Brasil- e pelo Ministério da Educação -que fiscaliza os cursos de medicina- informa ainda que o médico
que põe no consultório a placa "especialista em medicina estética" comete uma infração ética grave.
Os cirurgiões plásticos apoiaram o manifesto e fizeram um alerta ainda mais grave. Segundo o presidente da Sociedade Brasileira
de Cirurgia Plástica, José Tariki, os pacientes que se submetem a operações com médicos que se apresentam como especialistas
em estética podem correr risco de vida.
Essa mobilização é uma resposta à fundação de entidades de medicina estética e à criação de pós-graduações lato sensu
(especialização) na área. A Sociedade Brasileira de Medicina e Cirurgia Plástica Estética criou um curso no Rio, dentro da
Universidade Veiga de Almeida. A Sociedade Brasileira de Medicina Estética oferece pós em seis capitais, pela faculdade Souza
Marques.
"Isso é uma invenção. São pessoas que se reuniram e criaram sociedades ou cursos com esses nomes. Elas não podem conferir
título de especialista", diz José Luiz Gomes do Amaral, presidente da AMB. Para ter diploma médico, os alunos ficam seis anos
na universidade. Para se especializar, passam pela residência médica. Os cirurgiões plásticos, por exemplo, cumprem cinco
anos de residência. Depois, para ter o título de especialista, ainda precisam ser aprovados numa prova oficial -aplicada pela
associação da especialidade.
As pós-graduações em medicina estética, por outro lado, duram apenas dois anos e se concentram em procedimentos específicos,
como aplicação de toxina botulínica, lipoaspiração, implante de mama, plástica de nariz e peeling cirúrgico.
"O especialista de verdade ganhou uma formação completa na residência, passou por UTI, viu doenças de todo tipo. Sabe
ver se o paciente que vai fazer lipoaspiração tem uma hérnia que precisa ser corrigida. Toma cuidado para não perfurar o intestino.
O médico que cursa essas pós-graduações tem formação segmentada. Depois de operar três pacientes ele está apto? Eu acho que
não", diz Tariki, da Cirurgia Plástica.
No final de 2005, uma advogada de 37 anos morreu em São Paulo depois de submeter-se a uma lipoaspiração com um médico
que se dizia especialista em medicina estética. Ele não tinha formação em cirurgia. O médico foi condenado pelo Conselho Regional
de Medicina e apelou ao CFM. O julgamento ainda não terminou.
De acordo com Tariki, a medicina estética não pode existir porque os procedimentos que ela oferece já são feitos pela
cirurgia plástica e pela dermatologia, especialidades médicas reconhecidas. "Pegam o filé do filé das duas áreas. Por que
não atendem queimados em hospitais públicos? Porque, nessa área que eles querem, o mercado é grande e o dinheiro é fácil."
Antonio Gonçalves Pinheiro, um dos diretores do CFM, diz que o recém-formado deve resistir à tentação do "dinheiro fácil".
"O risco é grande. Ele pode deixar o paciente morrer por não saber o que fazer diante de uma complicação." O Brasil é o segundo
país que mais faz plásticas no mundo. Só perde para os Estados Unidos. Entre 2004 e 2006, o número de brasileiros que se submeteram
a cirurgias plásticas saltou de 616 mil para 700 mil. A mais popular é a lipoaspiração.
"Não há nada de errado com cirurgias estéticas", diz Ivo Pitanguy, 82, referência mundial em plástica. "O errado é você
se dizer especialista em estética." As entidades de medicina estética atribuem o alerta a uma disputa por mercado.
TRABALHO:
MÉDICO DEVE EVITAR ÁREA EM QUE NÃO É ESPECIALISTA, DIZ ENTIDADE
A legislação brasileira permite que o médico, após seis anos de faculdade, atue em qualquer área da medicina, incluindo
a cirurgia. Ele pode, teoricamente, trabalhar como cirurgião plástico, mas não pode intitular-se como tal. Isso seria uma
infração ética -o código da profissão proíbe que o profissional se apresente como especialista sem ter o respectivo título.
As entidades oficiais, porém, recomendam que atue na área em que é especialista. Não sendo, as chances de ser condenado num
processo de erro médico, por imperícia, imprudência ou negligência são muito maiores.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo