28/05/2015
Tema foi discutido no 1º Fórum Sobre a Judicialização da Medicina, promovido pela Escola de Magistratura do Paraná (Emap), com o apoio do TJPR e em parceria com o CRM-PR
“Com o aumento da quantidade de idosos e do mercado de planos de saúde, somando a dificuldade de financiamento e expansão do setor, se não tiver uma transição agora do modelo de assistência e investimento não teremos capacidade de leitos para toda a população que precisará num futuro muito próximo”, afirmou o diretor executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) e ex-diretor da ANS, Carlos Figueiredo.
A previsão foi feita durante a palestra sobre o sistema de saúde no Brasil, proferida no 1º Fórum Sobre a Judicialização da Medicina, realizado pela Escola de Magistratura do Paraná (Emap), com o apoio do Tribunal de Justiça do Paraná e em parceria com o CRM-PR. Figueiredo, que também é médico, argumentou que a mudança rápida na pirâmide etária brasileira está trazendo grande impacto para a assistência à saúde, tanto pública quanto privada. O sistema público já está em colapso. E o privado caminha para um futuro instável.
O envelhecimento crescente da população e a mudança de perfil clínico e epidemiológico geram cuidados de longa permanência que necessitam de investimento e qualificação hospitalar. “Pessoas acima de 50-60 anos têm incidência maior de doenças crônicas e demandam maior utilização dos serviços de saúde, gerando filas de espera e maior taxa de internação”, afirmou. A frequência de internação na faixa etária acima dos 60 anos é seis vezes mais alta do que as faixas mais jovens.
“A transição de pirâmide que estamos vivendo num espaço curto de tempo, países desenvolvidos levaram cerca de 100 anos para mudar. Em cerca de 30 anos viveremos essa mudança e teremos uma população idosa muito maior”. Dados do IBGE apontam que os idosos no Brasil deverão representar 26,7% da população em 2060, numa proporção 3,6 vezes maior do que a atual.
Outro aspecto que contribui para o inchamento do sistema privado é a mudança da pirâmide social. O crescimento da classe média e de empregos formais, que oferecem planos aos funcionários, impactou no crescimento do número de beneficiários das operadoras. “As pessoas chegam ao sistema privado, depois de um longo período de dificuldade de acesso no sistema público de saúde, com necessidade de serviços muito intensa, com demanda maior do que o esperado pelo histórico de pouco atendimento no público. Isso traz maior utilização dos serviços, gerando impacto no crescimento dos custos do setor”. O mercado privado é essencialmente financiado por planos coletivos. Mais de 60% da demanda vêm de empresas. Os planos individuais representam cerca de 20% apenas da fatia do mercado.
Nesse cenário de alta demanda por um histórico sem acesso ao sistema de saúde, a cada 100 reais pagos em mensalidade, 84 reais retornam em prestação de serviços. Os custos estão altos. As despesas com internação representam metade dos gastos assistenciais. Um dado interessante, segundo levantamento da Anahp, é que das 18 cidades onde a saúde suplementar mais cresce, sete estão no Nordeste.
Figueiredo afirma que um dos maiores impedimentos para a expansão do setor – com a devida proporção correta para absorver essa demanda que virá em breve – é a dificuldade de financiamento. “Os hospitais têm muita dificuldade de acesso a crédito adequado para financiamento e investimento comparados a outros setores, como automobilístico e agricultura”, contou.
A quantidade de pessoas que ingressam nos planos de saúde cresce continuamente numa proporção maior do que o aumento de leitos. “Isso vem ocorrendo ano após ano e é preocupante. O número de vidas crescendo sem o correspondente de leitos gera superlotação e uma dificuldade maior de acesso aos serviços hospitalares, especialmente aos de qualidade”, explica Figueiredo.
De acordo com dados da Anahp, os hospitais têm apresentado taxa de ocupação em torno de 85%. Alguns passam dos 100%. Os números revelam um segmento em que a quantidade de vidas assistidas cresce, mas a rede não acompanha no ritmo necessário.
Além do problema de financiamento, o modelo de remuneração do serviço hospitalar é muito desgastado e fragmentado. “Temos um relacionamento difícil e contínuo com as operadoras de saúde. Há um desequilíbrio grande na remuneração do prestador. A participação das diárias e taxas, por exemplo, é de 20% na fonte dos hospitais. A maior parte do lucro vem da comercialização de materiais, medicamentos, órteses e próteses”, contou.
“O modelo de financiamento no país foi se desgastando ao longo do tempo e as diárias e taxas não foram reajustadas. Anos ainda não conseguimos amadurecer formas mais adequadas que gerem incentivos corretos para melhor assistência a saúde e desenvolvimento necessário”.
Solução
Figueiredo prevê que a situação deve melhorar com a possibilidade de abertura de capital estrangeiro para investimento. Ainda, uma revisão do modelo assistencial é urgente, focada na prevenção, diminuindo custos assistenciais de tratamento de doenças que poderiam ser evitadas.
“Hoje não pagamos por saúde, pagamos por tratamento de doenças. Isso é uma discussão nacional de modelo assistencial, como fazer com que as pessoas tenham mais saúde e não como tratar as doenças”, pontuou.
Outro ponto, relacionado à gestão da saúde pública, que também interfere na privada, é a formação dos gestores. “Há uma quantidade imensa de gestores que não possuem nível superior. Pessoas sem formação decidem o que acontece com o dinheiro da saúde. Não falta só dinheiro, falta gestão também”, completou, sugerindo que as autoridades pensem mais em capacitação para a educação e gestão do dinheiro da saúde pública.
Números
De acordo com a Anahp, o Brasil é o sétimo maior sistema de saúde do mundo quando se trata de despesas totais com saúde. Ao mesmo tempo, é o terceiro maior mercado de saúde privada, perdendo apenas para Estados Unidos e China.
O Brasil gasta 9,3% do PIB com saúde, enquanto Estados Unidos gastam 17,9% e Alemanha 11,3%. A fonte de despesa é 46,4% pública e 53,6% privada. Enquanto isso, no Reino Unido, 82,5% da fonte de despesa é pública.
O setor privado brasileiro representa mais da metade da população. As despesas com internação pelo SUS custam um bilhão ao ano, enquanto no sistema privado somam mais de 50 bilhões. “Temos um problema grave de financiamento da saúde em nosso país”, apontou Figueiredo. É interessante ressaltar que 70% dos leitos existentes são do SUS.
Hoje temos 2,4 leitos por mil habitantes. O Japão, que vive já vive consequências do envelhecimento da população, tem mais de 13 leitos por mil habitantes.