Falta de condições de tratamento no próprio município obriga pacientes a fazerem viagens exaustivas para as grandes cidades
O brasileiro roda em média 169 quilômetros para ter acesso a atendimento médico especializado. É o que aponta o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) na pesquisa Regiões de Influências das Cidades, que analisa as relações de dependência
entre os municípios. Com o paranaense não é diferente. Milhares cumprem a rotina de embarcar num ônibus cedido pela prefeitura,
ainda de madrugada, para retornar no final do dia, desgastados pelo tratamento médico e pela viagem. Só em Curitiba, a rede
pública recebe em média 56 mil pacientes de fora da capital todos os anos.
Para dar suporte aos municípios que precisam encaminhar os pacientes para outras cidades, o Ministério da Saúde criou
em 1999 uma política de atendimento médico fora do território de origem. É o Tratamento Fora do Domicílio (TFD). Os recursos
são repassados pelo governo federal de acordo com a tabela do SUS. Em casos de internamentos, o repasse é feito diretamente
ao hospital.
Para viajar, o paciente precisa apresentar a consulta agendada e assinada pelo médico. A prefeitura paga o transporte,
a alimentação e o pernoite.
Mas, na maioria das vezes, apenas o transporte é garantido. Ponta Grossa, a 117 quilômetros da capital, manda pelo menos
1,7 mil pessoas por mês, entre pacientes e acompanhantes, para Campo Largo e Curitiba. Eles ganham apenas um lanche na saída.
O serviço era administrado em parceria com a Câmara Municipal. Mas denúncias de favorecimento político levaram a coordenação
para a prefeitura, que faz os agendamentos. Para a diretora de Serviço Social, Ângela Barszcz, coordenadora do serviço, o
transporte recebe mais elogios do que reclamações. "Agora temos um espaço adequado para os pacientes". Eles são recebidos
em um clube e têm um colchonete para descansar até às 4h30, horário de partida do ônibus.
Pacientes de Arapoti, no Norte Pioneiro, também recorrem a Curitiba. Todos os dias, 22 pessoas viajam 250 quilômetros
para chegar à capital. Com os doentes de Palmeira, nos Campos Gerais, não é diferente. Um ônibus com 32 pacientes percorre
83 quilômetros até os hospitais de Curitiba. Uma pequena parcela segue para Ponta Grossa para os serviços de hemodiálise.
O secretário municipal de Palmeira, Fabiano Cassanta, explica que não há como evitar as viagens. "O município tem hospital
privado e filantrópico, há alguns especialistas, mas quando o assunto é cirurgia a situação complica. Só as mais simples são
realizadas aqui."
De acordo com o prefeito de Moreira Salles, no Norte do estado, coordenador do consórcio Paraná Saúde, Hugo Berti, todos
os municípios paranaenses dependem de Curitiba para tratar seus pacientes. Aos prefeitos, cabe cumprir as normas da política
do TFD. Apesar de ficar a 529 quilômetros de Curitiba, a prefeitura também encaminha pacientes para a capital. "Estamos inaugurando
nesse ano uma maternidade que custou R$ 3 milhões. As viagens vão ter de continuar, mas pelo menos as crianças poderão nascer
aqui."
Mínimo é de 54 quilômetros
O estudo do IBGE, que pela primeira vez mediu a distância percorrida em busca de saúde, mostra que há quatro níveis de
deslocamento: 54, 108, 144 e 169 quilômetros. Os percursos aumentam conforme o nível de complexidade do tratamento. Nas regiões
Sudeste e Sul, segundo a pesquisa, os fluxos são menores porque os serviços de saúde estão mais bem distribuídos.
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Dez anos de estrada
Sônia de Fátima Rocha tem 39 anos e mora em Ponta Grossa, nos Campos Gerais. Aos 30 anos, iniciou uma rotina que mantém
até hoje. Ela viaja constantemente para Curitiba para fazer tratamento de lúpus no sangue e labirinto. O lúpus é uma doença
crônica que ataca o sistema imunológico, além de afetar o funcionamento de outros órgãos, como o rim. Para evitar seções de
hemodiálise, ela é submetida à pulsoterapia, que dura duas horas e é semelhante à quimioterapia. O tratamento provoca vômitos
e dores no corpo que, aliados ao cansaço da viagem à capital, deixam Sônia debilitada.
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Fonte: Gazeta do Povo