Governo tenta controlar mobilização de profissionais, mas quem não pode esperar paga do próprio bolso, busca o serviço
público ou vai ao tribunal
A briga dos médicos com as operadoras de planos de saúde em busca de honorários mais justos está obrigando o consumidor
a bancar o negociador para ser atendido, ou mesmo buscar o Poder Judiciário. Uma das maiores ameaças da categoria até o fim
do mês de maio, quando termina o prazo determinado nacionalmente para negociações com as operadoras, é o descredenciamento.
Os 40 médicos de Ivaiporã tomaram essa atitude, causando um aumento de 30% na procura aos postos de saúde da cidade; já
os 78 cirurgiões cardiovasculares do estado resolveram formar uma cooperativa. Na mesma esteira estão cerca de 60 médicos
das cidades de União da Vitória e Porto União (SC), que estão pedindo individualmente sua saída dos planos, e os 161 endocrinologistas
do Paraná, que fixaram R$ 100 por consulta clínica como condição para permanecer nos planos de saúde.
E o movimento deve continuar, apesar das medidas recentes da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça
proibindo novas paralisações e a adoção da Classificação Brasileira Hierar¬quizada de Procedimentos Médicos (CBHPM) como critério
mínimo de negociação com as operadoras.
Coopcárdio
Oficializada como pessoa jurídica em 2010, a Cooperativa de Cirurgiões Cardiovasculares do Paraná (Coopcárdio-PR), com
sede em Ponta Grossa, nos Campos Gerais, já teria provocado, no mês passado, cerca de dez liminares na Justiça, segundo seu
diretor-presidente, o médico Marcelo Freitas - a
Gazeta do Povo confirmou, no entanto, apenas uma, emitida no início
de abril pelo Plantão Judiciário do Fórum Cível.
Diante da necessidade de uma cirurgia e da inexistência de cirurgião cardiovascular credenciado, o paciente-consumidor
tem duas opções: pagar do próprio bolso intervenções que passam de R$ 20 mil e tentar o reembolso com o plano depois; ou tentar
garantir o pagamento por parte do plano antecipadamente na Justiça, com uma liminar. Na decisão a que a
Gazeta do Povo
teve acesso, a avaliação foi de que, ao não oferecer outras alternativas - outros profissionais para fazerem o procedimento
-, o plano é obrigado a pagar o que é pedido. "Na desavença entre médicos e operadoras, é o Judiciário que tem de garantir
os direitos do consumidor", avalia o promotor de Justiça da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor de Curitiba, Clayton
de Albuquerque Maranhão.
Precedente aberto
Segundo Maranhão, as decisões criariam uma jurisprudência favorável ao movimento dos cirurgiões cardiovasculares e de
outras especialidades que sigam o mesmo caminho, mas também apontariam para um futuro preocupante: um cenário em que mais
médicos se descredenciem, trazendo transtornos ao consumidor - uma possibilidade bem real, afirma o médico Benno Kreisel,
presidente da Associação dos Hospitais do Paraná, vice-presidente da Federação Brasileira de Hospitais e pesquisador da remuneração
da saúde suplementar. "A partir do segundo semestre, a perspectiva é de um acirramento dessa disputa entre médicos e operadoras,
talvez também com os hospitais e clínicas entrando na briga, e um número maior de descredenciamentos", prevê.
Mesmo a liminar não é certeza de que o paciente evitará o prejuízo, já que ela é apenas uma primeira decisão da Justiça.
"As chances de a decisão se reverter são pequenas, mas existem. E aí, como eu ficaria se tivesse de tirar do meu bolso depois,
sendo que eu já pago plano de saúde?", questiona o técnico em eletrônica Alessandro (nome fictício), que precisa de uma cirurgia
para trocar uma válvula defeituosa do coração - um problema congênito - por outra mecânica. Ele procurou quatro cirurgiões
diferentes no estado, mas todos estão descredenciados. Também tentou negociar o pagamento dos honorários com seu plano, mas
não consegue acordo. Ainda sem sintomas, Alessandro está conseguindo esperar - já faz um mês e meio - mas diz se sentir usado
por médicos e planos. "Pago o meu plano e tenho direito de ser assistido. Ao mesmo tempo me sinto forçado pelos médicos a
procurar a Justiça. Eles querem isso para criar uma jurisprudência, mas não acho certo", argumenta. O plano de Alessandro
faz parte da União Nacional da Instituição de Autogestão em Saúde (Unidas). O contrato da Coopcárdio-PR com as 24 operadoras
filiadas à entidade foi estendido em mais 30 dias, devido ao bom andamento das negociações. Pode ser que, então, Alessandro
consiga finalmente marcar sua cirurgia.
Serviço
O Ministério Público pede que a população relate casos como o de Alessandro pelo e-mail
href="mailto:consumidor@mp.pr.gov.br" target="_blank">consumidor@mp.pr.gov.br.
Fonte:
Gazeta do Povo