28/11/2010

Compromisso com a saúde e com os pacientes

Os médicos do Brasil, felizmente, têm uma inserção constante nas discussões sobre políticas de saúde. Nem sempre são ouvidos, é verdade. Entretanto, fazem sua parte ao opinar e dar idéias para solucionar os problemas crônicos da assistência e ao defender condições adequadas para o exercício da medicina.
Há gestores mal intencionados que jogam contra, afirmando tratar-se simplesmente de lobby. Pura má fé. O fato é que, ao intervir politicamente, os médicos apenas reforçam o juramento de Hipócrates; saem em defesa de uma de medicina de qualidade e de seus pacientes.

Veja o que ocorre, por exemplo, no sistema suplementar. É um setor que abarca cerca de 44 milhões de pessoas. Todas pagando mensalidades bem generosas com o sonho de ser bem atendida no caso de uma necessidade de saúde. O problema é que não é bem isso que têm com retorno. Ao contrário, os órgãos de defesa do consumidor sempre trazem na liderança de seus rankings de reclamações planos e seguros saúde.

Nesse momento, no meio médico, existe uma mobilização para a moralização do setor. Não poderia ser diferente. Recente pesquisa Datafolha, encomendada pela Associação Paulista de Medicina (APM), atesta que 93% da classe sofrem interferências das empresas na prática diária. São pressões para reduzir solicitações de exames, de internações, entre outros tantos procedimentos. Em suma: um atentado contra a prática da medicina e um risco até à vida dos pacientes.

Diante de situações como esta, não podemos mesmo calar. O mesmo vale para a questão dos honorários vis pagos atualmente tanto na área pública quanto na suplementar. Um profissional que recebe algo em torno de R$ 20 por uma consulta (e que não cobra o retorno) das operadoras é obrigado a se desdobrar em inúmeros empregos para perfazer um rendimento minimamente digno. O desvio leva a atendimentos expressos, falhas de diagnóstico, estresse do médico e outros complicadores que só prejudicam a assistência à comunidade.

No Sistema Único de Saúde, vale um parêntese, os honorários são ainda piores, assim como o conjunto da obra. O financiamento insuficiente gera distorções perigosas, como hospitais sucateados, filas de meses para marcar consultas, carência de medicamentos, dificuldade de atrair profissionais para periferias, áreas remotas e de difícil acesso. Todo mundo conhece a extensão do problema e o explora ao extremo em campanhas eleitorais.

No entanto, logo após encerrada a contagem de votos, viram as costas à população e nada fazem para solucioná-lo. Uma prova disso é o folhetim em que se transformou a regulamentação de Emenda Constitucional 29. Aprovada há dez anos, a EC 29 ainda aguarda normatização para que fiquem bem claros os índices a serem destinados à saúde por cada nível de governo: Federação, estados e municípios. A regulamentação também é essencial para definir o que são de fatos investimentos em saúde, o que impedirá desvios para outros setores.

Quando perguntados, os membros do Congresso Nacional, em maioria, dizem ser favoráveis à regulamentação da Emenda. Desculpe, mas fica no ar, no mínimo, uma incoerência gritante. Se todos (ou quase) são favoráveis, porque a matéria está parada há uma década?

Enfim, quando os médicos se mobilizam, é para alertar a população e a mídia sobre problemas como esse e muitos outros. É mais do que bom senso e direito de cidadão. É compromisso com a medicina, com a saúde e com os pacientes.


Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica

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