26/11/2013

Comissão aponta situação caótica nos hospitais do país

Entidades médicas, parlamentares e membros do MP, OAB e CNJ apresentam relatório sobre a situação de oito grandes hospitais de emergências

Pacientes internados em macas pelos corredores ou em colchões sobre o chão e casos que se assemelham aos de uma enfermaria de guerra. Este é o panorama dos principais hospitais públicos de urgência e emergência visitados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), numa ação desenvolvida com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM/CD). O relatório preliminar das visitas foi apresentado durante o seminário “O Caos no Atendimento de Urgência e Emergência no Brasil”, realizado na terça-feira (26), no Congresso Nacional. O encontro reuniu autoridades, parlamentares e representantes da sociedade para discussões sobre as causas e possíveis soluções para os problemas do setor.

Durante o evento, o 2º vice-presidente do CFM e coordenador da Comissão Nacional Pró-SUS, Aloísio Tibiriçá Miranda, lembrou que a Portaria nº 2.048/2002, do Ministério da Saúde, aprovou o regulamento técnico dos sistemas estaduais de urgência e emergência e que, desde então, inúmeras outras normas foram editadas a fim de organizar e reorganizar a rede. “O problema é que a maior parte das iniquidades detectadas persiste, de modo que pouco haveria a acrescentar ao arcabouço legal, a não ser na indicação de que estas regras sejam implantadas com o devido senso de urgência”, declarou Tibiriçá.

Para ele, é preciso que o Executivo Federal acate imediatamente as recomendações elencadas no relatório parcial, não apenas no que diz respeito à infraestrutura e financiamento, mas, principalmente aquelas relacionadas à remuneração dos prestadores de serviços e valorização dos profissionais. “É preciso enfrentar a questão de recursos humanos para emergências, promovendo a formação adequada em programas específicos de residência médica e a criação de planos de carreira no Sistema Único de Saúde (SUS), além de privilegiar o concurso público e a contratação pelo regime estatutário, garantindo os adicionais de insalubridade aos profissionais que atuam nas urgências”, citou Tibiriçá, ao resgatar as recomendações do Grupo.

As informações coletadas relatam a situação de oito hospitais de urgências médicas do SUS: Arthur Ribeiro de Saboya em São Paulo (SP), Souza Aguiar no Rio de Janeiro (RJ); Hospital Geral Roberto Santos em Salvador (BA); Pronto Socorro João Paulo II em Porto Velho (RO); Pronto Socorro Municipal Mario Pinotti em Belém (PA); Hospital de Base em Brasília (DF); Hospital Nossa Senhora da Conceição em Porto Alegre (RS); e Pronto Socorro Municipal de Várzea Grande (MT). As visitas contaram com o apoio de Conselhos e Sindicatos de profissionais da saúde, Ministério Público e Ordem dos Advogados do Brasil, que selecionaram os hospitais visitados a partir do consenso entre as os membros do GT.

RECOMENDAÇÕES

Após o seminário, a Comissão recomendará ao Executivo Federal que, dentre outras providências, adote efetivamente a Política Nacional de Atenção às Urgências, ampliando a participação no financiamento do SUS; amplie a abrangência do programa ‘SOS Emergência’, para incluir todos os serviços públicos do país; e fortaleça os sistemas de referência e contra-referência e a informatização dos serviços, para que estes se dediquem aos casos realmente urgentes.

A CDHM deve ainda requisitar ao Tribunal de Contas da União (TCU) que realize auditorias nos serviços de urgência de todo o país. Em paralelo, a Comissão deverá apoiar a tramitação de proposições que buscam modificar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – para permitir a contratação de mais profissionais da saúde –, além daquelas que buscam a criação de planos de carreira no serviço público de saúde e que ampliem a participação da União no financiamento do setor.

GARGALOS DO SUS

Mauro Ribeiro, conselheiro do CFM pelo estado de Mato Grosso do Sul e coordenador da Câmara Técnica de Urgência e Emergência, acompanhou de perto os trabalhos do Grupo de Trabalho e relata que muitos dos problemas encontrados devem-se a questões estruturais, ainda não adequadamente resolvidas pelo SUS. “São problemas que estão ferindo a dignidade e os direitos dos cidadãos brasileiros, previstos na Constituição Federal”, disse.

De acordo com o relatório preliminar do GT, os serviços de urgência e emergência enfrentam um duplo gargalo, sendo o primeiro deles o congestionado atendimento e o desconforto na porta de entrada dos serviços. Para esse gargalo, segundo o documento, também contribui a excessiva centralização do atendimento de emergência em poucos serviços, em relação ao tamanho da população e da área territorial de cobertura. Esses mesmos elementos também estão envolvidos no segundo gargalo, que, segundo a Comissão, é a dificuldade em dar solução aos casos de usuários que conseguem ser atendidos. “O resultado é que se gera uma ‘fila’ também para sair do serviço, retroalimentando a situação de carência, pois novos usuários, em princípio, não poderiam ser admitidos até que os outros tivessem seus casos resolvidos”, destaca o documento.

FINANCIAMENTO

O subfinanciamento do setor foi apontado pelo Grupo como “a expressão maior da falta de prioridade” dada ao setor, o que obriga as políticas específicas a se adaptarem aos recursos que são disponibilizados. Para expor esse quadro, o GT recorreu a uma recente análise do CFM que, com base em dados do próprio governo, observou que o Ministério da Saúde deixou de aplicar quase R$ 94 bilhões no SUS ao longo dos últimos 12 anos. Ao relacionar o total pago pelo Ministério da Saúde com o PIB, o Conselho verificou que, nesse período, a proporção de gasto desse ministério, praticamente, não ultrapassa 1,9%.

Além disso, o relatório dá conta de que o subfinanciamento do sistema tem sido agravado pelo baixo nível de ressarcimento que planos de saúde tem realizado ao SUS em razão dos atendimentos que deveria oferecer, mas que são realizados pela rede pública. “É preciso considerar que aproximadamente 25% dos atendimentos nas urgências envolveriam usuários de planos de saúde. Essa situação também se agrava pelo baixo nível de execução orçamentária federal em ações de grande relevância para o SUS e para a assistência às urgências e emergências”, conclui.

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