Norma publicada nesta terça (11) destaca a inexistência de estudos que demonstrem a magnitude dos riscos associados à terapia
hormonal androgênica em níveis acima dos fisiológicos
Fica vedada a prescrição médica de terapias
hormonais com esteroides androgênicos e anabolizantes (EAA) com finalidade estética, para ganho de massa muscular
e/ou melhora do desempenho esportivo, seja para atletas amadores ou profissionais, por inexistência de comprovação
científica suficiente que sustente seu benefício e a segurança do paciente. É o que define o Conselho
Federal de Medicina (CFM) por meio da Resolução nº 2.333/2023, publicada nesta terça-feira (11) no Diário
Oficial da União (DOU).
Já em vigor, a norma destaca a inexistência de
estudos clínicos randomizados de boa qualidade metodológica que demonstrem a magnitude dos riscos associados
à terapia hormonal androgênica em níveis acima dos fisiológicos, tanto em homens quanto em mulheres,
além da ausência de comprovação científica de condição clínico-patológica
na mulher decorrente de baixos níveis de testosterona ou androgênios.
“O uso indiscriminado de terapias hormonais com EAA, incluindo
a gestrinona, com objetivos estéticos ou para o ganho de desempenho esportivo, é hoje uma preocupação
crescente na medicina e para a saúde pública, uma vez que, de acordo com as mais recentes evidências científicas,
não existem benefícios notórios que justifiquem o aumento exponencial do risco de danos possivelmente
permanentes ao corpo humano em diferentes órgãos e sistemas com sua utilização”, alerta
a relatora e conselheira federal Annelise Menegusso.
Riscos
O CFM também chama a atenção para os riscos potenciais do uso de doses
inadequadas de hormônios e a possibilidade de efeitos colaterais danosos ainda que com o uso de doses terapêuticas,
especialmente em casos de deficiência hormonal não diagnosticada apropriadamente, seguindo diretrizes e recomendações
em vigor.
Dentre os inúmeros efeitos adversos possíveis,
estão os cardiovasculares, incluindo hipertrofia cardíaca, hipertensão arterial sistêmica e infarto
agudo do miocárdio, aterosclerose, estado de hipercoagulabilidade, aumento da trombogênese e vasoespasmo, doenças
hepáticas como hepatite medicamentosa, insuficiência hepática aguda e carcinoma hepatocelular, transtornos
mentais e de comportamento, incluindo depressão e dependência, além de distúrbios endócrinos
como infertilidade, disfunção erétil e diminuição de libido.
A percepção do CFM é corroborada pelas
Sociedades Brasileiras de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Medicina do Esporte e do Exercício (SBMEE), Cardiologia
(SBC), Urologia (SBU), Dermatologia (SBD), Geriatria e Gerontologia (SBGG) e pelas Federações Brasileiras de
Gastroenterologia (FBG) e das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), que emitiram nota
conjunta pedindo ao CFM a regulamentação do uso de esteroides anabolizantes e similares para fins estéticos
e de performance.
Deficiência
A Resolução CFM nº 2.333/23 regulamenta que a prescrição
médica de terapias hormonais está indicada em casos de deficiência específica comprovada, de acordo
com a existência de nexo causal entre a deficiência e o quadro clínico, cuja reposição hormonal
proporcione benefícios cientificamente comprovados, sendo “vedada ao médico a prescrição
de medicamentos com indicação ainda não aceita pela comunidade científica”. O uso de terapias
hormonais com a finalidade de retardar, modular ou prevenir o envelhecimento permanece vedado pela Resolução
CFM nº 1.999/2012.
Com esse entendimento, a prescrição de EAA é
justificada para o tratamento de doenças como hipogonadismo, puberdade tardia, micropênis neonatal e caquexia,
podendo ainda ser indicada na terapia hormonal cruzada em transgêneros e, a curto prazo, em mulheres com diagnóstico
de Desejo Sexual Hipoativo.
O CFM também define que, no exercício da medicina,
fica proibida a prescrição e divulgação de hormônios anunciados como “bioidênticos”
em formulação “nano” ou com nomenclaturas de cunho comercial sem a devida comprovação
científica de superioridade clínica para a finalidade prevista nesta resolução, assim como de
Moduladores Seletivos do Receptor Androgênico (SARMS) para qualquer indicação. A vedação
está de acordo com o entendimento atual da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), expresso
na Resolução nº 791/21.
Forma abusiva
A conselheira Annelise Menegusso alerta que é crescente o número
de pessoas utilizando tais medicações de forma ilícita e que, “concomitante ao uso de EAA, há
um aumento da administração do hormônio do crescimento (GH) de forma abusiva por atletas, amadores e profissionais,
como droga ergogênica, motivo pelo qual o GH encontra-se incluído na lista de substâncias anabolizantes
(C5) da Anvisa, assim como no rol de drogas proibidas no esporte pela Agência Mundial Anti-Doping (WADA)”.
Segundo ela, drogas ergogênicas tendem a melhorar o desempenho
físico retardando a fadiga, impulsionando o ganho de massa muscular (propriedade anabolizante) e a quebra de gordura
(propriedade lipolítica).
O texto aprovado pelo CFM determina ainda que ao médico
permanece proibida a adoção experimental de qualquer tipo de terapêutica não liberada para uso
no Brasil sem a devida autorização dos órgãos competentes e sem o consentimento do paciente ou
de seu responsável legal, que devem estar devidamente esclarecidos.
A restrição também se estende para a realização
de cursos, eventos e publicidade com o objetivo de estimular o uso ou fazer apologia a possíveis benefícios
de terapias androgênicas com finalidades estéticas, de ganho de massa muscular ou de melhora na performance esportiva.
Esse item assume relevância diante da proliferação de atividades de extensão, educação
continuada e pós-graduação sobre terapias hormonais cuja base é o treinamento de profissionais
para prescrição de hormônios e outros tratamentos ainda sem comprovação científica.
Fonte: CFM