O procedimento pode ser empregado para o tratamento de casos de diabetes mellitus tipo 2, desde que não tenha sido controlada
por meio de intervenções clínicas
O Conselho Federal de Medicina (CFM) reconheceu, através
da Resolução nº 2.172/2017, a cirurgia metabólica como opção terapêutica para
pacientes portadores de diabetes mellitus tipo 2 (DM2) que tenham índice de massa corpórea (IMC) entre 30 kg/m2
e 34,9 kg/m2, desde que a enfermidade não tenha sido controlada com tratamento clínico. O texto foi enviado
ao Diário Oficial da União e entrará em vigor após sua publicação.
Pelos critérios estabelecidos, além de ter
IMC entre 30 kg/m2 e 34,9 kg/m2, pacientes poderão ser elegíveis para se submeter a esse procedimento se apresentarem:
idade mínima de 30 anos e máxima de 70 anos; diagnóstico definido de diabetes tipo 2 a menos de 10 anos;
apresentar refração comprovada ao tratamento clínico; e não possuir contraindicações
para o procedimento cirúrgico proposto.
Com
a edição da Resolução nº 2.172/2017, a autarquia objetiva contribuir para que seja expandida
a possibilidade de redução das taxas de morbimortalidade no Brasil por meio do controle da doença. O
CFM ressalta que o tratamento cirúrgico não exclui a possibilidade de associação de agentes farmacológicos
para evitar recidiva ou complicação da doença.
Epidemia
A
incidência de DM2 é uma das principais causas de acidente cardiovascular (AVC), síndrome coronariana,
insuficiência renal e cegueira, tendo atingido neste século status de epidemia. No Brasil, o número de
pessoas diabéticas em 2015, com idade entre 20 e 79 anos, atingiu a marca de 14,3 milhões, havendo a expectativa
de que em 2040 chegue a 23,3 milhões de pessoas. A média do IMC desses pacientes no País é de
30 kg/m2.
Na avaliação do
CFM, estudos sobre os mecanismos de ação das intervenções cirúrgicas sobre o tubo digestivo
demonstram efeitos antidiabéticos diretos, independentes da perda ponderal, diminuindo a resistência hepática
e periférica à ação da insulina, além de aumento da liberação deste hormônio
por células do pâncreas.
Pela
regra aprovada, a indicação cirúrgica se dará por dois médicos especialistas em endocrinologia,
mediante parecer fundamentado que ateste a refração ao tratamento clínico otimizado com uso de antidiabéticos
orais e/ou injetáveis, além de mudanças no estilo de vida do paciente.
Técnicas
O CFM definiu também que a cirurgia metabólica
para pacientes com DM2 se dará, prioritariamente, por derivação gastrojejunal em Y-de-Roux (DGJYR). Somente
em casos de contraindicação ou desvantagem da DGJYR, a gastrectomia vertical (GV) será a opção
disponível. Nenhuma outra técnica cirúrgica é reconhecida para o tratamento desses pacientes.Para a realização da cirurgia metabólica,
o médico deve ter o registro de qualificação de especialista (RQE) no Conselho Regional de Medicina (CRM)
do estado onde atua nas áreas de cirurgia geral ou cirurgia do aparelho digestivo. Tal informação é
pública e pode ser consultada no Portal Médico (www.portal.cfm.org.br),
no campo destinado à busca por médico.Somente hospitais de grande porte que realizem cirurgias de alta complexidade, que contém com plantonista
hospitalar 24h e Unidade de Terapia Intensiva (UTI), além de equipes multidisciplinares e multiprofissionais experientes
no tratamento de diabetes e cirurgia gastrointestinal, poderão ser escolhidos para realização de cirurgia
metabólica. A descrição hospitalar está definida na Portaria n º 425/2013 do Ministério
da Saúde.Equipes
Para garantir a segurança do paciente,
o Conselho Federal de Medicina definiu ainda que as equipes multidisciplinares e multiprofissionais envolvidas no tratamento
cirúrgico de pacientes com DM2 devem ser compostas minimamente por: cirurgião geral ou do aparelho digestivo,
endocrinologista, cardiologista, pneumologista, enfermeiro, psicólogo, fisioterapeuta e nutricionista.
Quando necessário, o médico responsável
poderá requisitar a participação de gastroenterologista, nutrólogo e equipe multiprofissional
de terapia nutricional, psiquiatra, angiologista ou qualquer outro especialista ou profissional da área da saúde.
A estruturação se deu por analogia ao disciplinado pela Portaria do Ministério da Saúde para Cirurgia
Bariátrica (Portaria MS nº 424 e 425/2013).
De acordo com os estudos analisados, a cirurgia metabólica é segura e apresenta resultados positivos
de curto, médio e longo prazos, diminuindo a mortalidade de origem cardiovascular, conforme demonstram estudos prospectivos
pareados com mais de 20 anos de seguimento, séries de casos controlados, além de estudos randomizados e controlados.
Secundariamente ainda gera perda ponderal significativa e sustentada a longo prazo, importante para o controle metabólico
independentemente do IMC basal.
Reconhecimento
Em 2011, a International Federation of Diabetes
(IFD) introduziu a cirurgia metabólica nos algoritmos de tratamento de diabetes mellitus tipo 2 como alternativa para
pacientes com IMC entre 30 kg/m2 e 35 kg/m2 desde que a doença não tenha sido controlada apesar de tratamento
medicamentoso otimizado e associada a fatores de risco para doença cardiovascular.
Nos anos de 2013 e 2014, a American Society for Metabolic and Bariatric Surgery (ASMBS)
e a International Federation for the Surgery of Obesity and Metabolic Disorders (IFSO), respectivamente, recomendaram a cirurgia
para pacientes com DM2 e IMC entre 30 kg/m2 e 34,9 kg/m2, sem controle da doença após tratamento clínico
e mudança no estilo de vida.
O National
Institute for Health and Care Excellence (NICE) passou a recomendar, em 2014, o tratamento cirúrgico para pacientes
com mesmo perfil desde que o diagnóstico da doença seja inferior a 10 anos.
Por fim, em 2016, 49 associações médicas de diferentes países
revisaram as recomendações para o tratamento da diabetes e reconheceram a cirurgia metabólica como opção
para o tratamento de diabetes mellitus tipo 2 em pacientes com IMC entre 30 kg/m2 e 34,9 kg/m2 e inadequado controle glicêmico
após tratamento clínico.
Conheça os critérios para elegibilidade
e contraindicações
Pacientes
que cumprirem os critérios clínicos definidos pela Resolução nº 2.172/2017, mas possuírem
histórico de doença mental deverão receber avaliação abrangente específica por psiquiatra
e psicólogo. Em casos de contraindicação cirúrgica, ela deve ser emitida por psiquiatra quando
o paciente for: abusador de álcool, dependente químico ou depressivo grave com ou sem ideação
suicida.
A contraindicação
poderá se dar também a portadores de qualquer outra doença mental através de avaliação
do psiquiatra, que poderá fazê-la de forma definitiva ou até que a doença seja controlada por meio
de tratamento.
Caso não haja contraindicação
e o paciente cumpra todos os requisitos para elegibilidade ao tratamento, deverá ser elaborado o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE) especificando riscos, taxa de mortalidade, complicações e necessidade de acompanhamento
clínico regular no pós-operatório por equipe multidisciplinar.
Os candidatos à cirurgia metabólica, além de ter o IMC entre 30
kg/m² e 34,9 kg/m², também deverão cumprir todos os seguintes pré-requisitos: idade mínima
de 30 anos e máxima de 70 anos; diagnóstico definido a menos de 10 anos; refração ao tratamento
clínico; e inexistência de contraindicações para o procedimento cirúrgico proposto.
Segundo o CFM, a refração ao tratamento
clínico, citada no texto da nova norma, se caracteriza pela não obtenção do controle metabólico,
após acompanhamento regular com endocrinologista por, no mínimo, dois anos, abrangendo mudanças no estilo
de vida, dieta e exercícios físicos, além do uso de antidiabéticos orais e/ou injetáveis.
Acompanhamento pós-operatório
faz parte das exigências da Resolução
Sendo o diabetes mellitus tipo 2 (DM2) uma doença crônica e progressiva, os pacientes
que se submeterem à cirurgia metabólica deverão ter acompanhamento pós-operatório obrigatoriamente
multiprofissional e multidisciplinar, obedecendo também a protocolo proposto pelas sociedades especializadas no cuidado
dos pacientes diabéticos e pós-cirurgias bariátricas.
O acompanhamento deve prever suporte ao estilo de vida a longo prazo além do monitoramento
rotineiro de micronutrientes e estado nutricional de acordo com diretrizes nacionais e internacionais.
Estudos clínicos comprovam a importância do controle
glicêmico nos pacientes portadores de DM2, na prevenção das complicações da doença
e na melhora da qualidade de vida. Nesse sentido, o CFM indica também a associação de medicamentos pertinente
à evolução glicêmica, dos lípides e hipertensão arterial.
Nesse acompanhamento pós-operatório, exames de imagem
e laboratoriais periódicos para verificação de eventuais deficiências de micronutrientes, prevendo
sua suplementação, devem ser realizados em todos os pacientes. Complicações microvasculares devem
ser monitoradas periodicamente e sem limite de tempo.
O DM2, assim como a obesidade em qualquer grau, são fatores predisponentes para outras doenças
metabólicas, como osteopenia/osteoporose. Quaisquer intervenções sobre o tubo digestivo alto podem também
contribuir para o aparecimento ou piora destas condições.