08/11/2017

CFM anuncia novas regras para o uso de técnicas de fertilização no país

Resolução 2.168/2017 atualiza normas; pacientes em tratamento oncológico também foram contemplados

O Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou nesta quinta-feira (9) a atualização das normas para utilização das técnicas de reprodução assistida (RA) no Brasil. Por meio da Resolução CFM nº 2.168/2017, com publicação prevista no Diário Oficial da União ainda esta semana, a autarquia editou regras sobre temas como: descarte de embriões, gestação compartilhada e de substituição. Dentre as novidades, destaca-se a inclusão de questões sociais na avaliação médica para utilização de RA. Pacientes em tratamento oncológico também foram contemplados.

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            para ampliarJosé Hiran Gallo, conselheiro do CFM. (Foto: CFM)

A Resolução CFM nº 2.168/2017 permite que pessoas sem problemas reprodutivos diagnosticados possam recorrer a técnicas disponíveis de reprodução assistida, como o congelamento de gametas, embriões e tecidos germinativos. Dessa forma, os pacientes ganham a possibilidade de planejar o aumento da família, segundo um calendário pessoal, levando em conta projetos de trabalho ou de estudos. Também são beneficiados pacientes que, por conta de tratamentos ou desenvolvimento de doenças, poderão vir a ter um quadro de infertilidade.

Gestação

Dentre os destaques introduzidos na norma, que entra em vigor nos próximos dias, o CFM ainda estendeu a possibilidade de cessão temporária do útero para familiares em grau de parentesco consanguíneo descendente. Até então, de primeiro a quarto graus, somente mãe, avó, irmã, tia e prima poderiam participar do processo de gestação de substituição. Com a mudança na regra, filha e sobrinha também podem ceder temporariamente seus úteros. Pessoas solteiras também passam a ter direito a recorrer a cessão temporária de útero.

O Plenário do Conselho Federal de Medicina definiu ainda no texto da Resolução o conceito de gestação compartilhada, opção já anteriormente contemplada para casos de união homoafetiva feminina. De acordo com o documento, considera-se que os casos que se enquadram nesta situação são aqueles em que o embrião obtido a partir da fecundação de oócito(s) de uma mulher é transferido para o útero de sua parceira, ainda que não exista diagnóstico de infertilidade.

Descarte
Outro ponto alterado pela Resolução CFM nº 2.168/2017 é a redução de cinco para três anos no período mínimo para descarte de embriões. O novo critério vale tanto em casos de expressa vontade dos pacientes quanto em situação de abandono, caracterizada pelo descumprimento de contrato pré-estabelecido firmado pelos pacientes junto aos serviços de reprodução assistida que costumam relatar a não localização dos responsáveis pelo material genético criopreservado.

Por decisão da Câmara Técnica de Reprodução Assistida, que preparou o texto da nova norma, o qual foi aprovado pelo Plenário do CFM, a alteração no prazo para descarte ocorreu para manter o texto em sintonia com a Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105/2005), que permite a utilização para pesquisa de embriões congelados há três anos ou mais.

Ética

O texto ainda ratifica que a idade máxima para participação como doador em processos de RA será de 35 anos para mulheres e de 50 anos para homens. No caso da transferência do embrião para o útero de paciente, não podem se submeter a este tratamento mulheres com mais de 50 anos. Exceções devem ser justificadas pelo médico assistente, que deverá embasar sua decisão e ainda comprovar que a interessada está ciente dos riscos aos quais será exposta.

Da mesma forma, a Resolução CFM nº 2.168/2017 reafirma que o número máximo de embriões a serem transferidos será quatro, podendo ser menor de acordo com a idade da paciente: até 35 anos (máximo de dois embriões); entre 36 e 39 anos (até três embriões); e com 40 anos ou mais (limite de quatro embriões).

Vale ainda destacar que os interessados em participar de processos de reprodução assistida, no Brasil, estão proibidos e podem ser penalizados se for constatado o comércio de embriões; a prática de seleção de embriões por conta de características biológicas; e a redução embrionária em caso de gravidez múltipla, por exemplo, continuam vigentes.

Finalmente, ressalta-se a importância do termo de consentimento livre e esclarecido e a defesa da autonomia de médicos e de pacientes que ganharam destaque na Resolução CFM nº 2.168/2017, com citações em vários pontos do documento e uma orientação objetiva de que casos não previstos na norma deverão obrigatoriamente receber autorização do CRM com jurisdição no estado, cabendo recurso ao CFM.

Planejamento familiar

Dentre os pontos aperfeiçoados pela Resolução CFM nº 2.168/2017, chamam a atenção aqueles que beneficiam pessoas sem problemas reprodutivos ou que passarão por tratamentos com drogas que podem, como efeito adverso, levar à infertilidade. A escolha do Conselho Federal de Medicina de aprovar essa regra levou em consideração diferentes aspectos relacionados à mudança no comportamento social e mesmo nos indicadores epidemiológicos.

Números produzidos por fontes oficiais ajudam a compreender melhor o impacto das medidas. Por exemplo, com pacientes oncológicos, que estão sujeitos a perda da fertilidade após serem submetidos a tratamentos quimioterápicos ou radiológicos, compõem um contingente com potencial de crescimento, em especial pelo avanço das técnicas de tratamento.

Com a mudança, cientes desses desdobramentos possíveis, essas pessoas poderão optar por processos de reprodução assistida no período em que estiveram totalmente aptos, congelando gametas, embriões e tecidos germinativos e prosseguindo o processo após a alta médica.  

Assim, a medida do CFM, aprovada pelo Plenário, traz alento a milhares de pacientes que se tratam de câncer, uma doença que avança nos indicadores epidemiológicos. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), no biênio 2016-2017 devem ser registrados 596 mil novos casos de câncer. Os principais tipos que ocorrerão no País serão, por ordem de incidência, os de pele não melanoma (para ambos os sexos), o de próstata e o de mama.

Outros cânceres cuja incidência merece destaque são os do intestino grosso (terceiro mais incidente entre as mulheres e o quarto entre os homens); pulmão (terceiro entre os homens e quinto entre as mulheres), colo do útero (quarto mais comum nas mulheres); estômago (quinto entre os homens e sexto entre as mulheres); e cavidade oral (sexto mais comum entre os homens).

Entre os homens, são esperados 295.200 novos casos de câncer, e entre as mulheres, 300.870. Excluindo-se o câncer de pele não melanoma (175.760 casos previstos, que correspondem a 29% do total estimado), esses números caem, respectivamente para 214.350 e 205.9960. Atualmente, o câncer é a segunda maior causa de morte no Brasil, com 190 mil óbitos por ano.

Maternidade tardia

Por outro lado, a Resolução do CFM, ao permitir que os indivíduos planejem o melhor momento para terem seus filhos, reflete uma mudança no comportamento da sociedade. Em dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2015, já se apontava a tendência de que as mulheres estão sendo mães mais tarde. Em 2005, 30,9% dos nascimentos eram concentrados em mães com idades de 20 a 24 anos. Em 2015, o percentual nessa faixa etária caiu para 25,1%. Os nascimentos em mães do grupo de 25 a 29 anos entre 2005 e 2015 mantiveram-se estáveis, passando de 24,3% para 24,5%.

Contudo, os números evidenciam o aumento da representatividade de mães entre 30 e 39 anos (de 22,5%, em 2005, chegando a 30,8%, em 2015) e a redução dos registros de filhos de mães mais jovens. No grupo de mães de 15 a 19 anos, o percentual de nascimentos caiu de 20,3%, em 2005, para 17%, em 2015.

Segundo o IBGE, em 2015, na Região Norte, as mulheres tiveram filhos mais novas, com 23,3% dos nascimentos entre mães de 15 a 19 anos, e 29,7% relativos a mães de 20 a 24 anos. Já os nascimentos relativos a grupo de mulheres com 30 a 34 anos concentraram-se no Sudeste (22,4%) e Sul (22%), bem como na faixa de 35 a 39 anos, com 12,3%, no Sudeste, e 11,7%, no Sul. Para o instituto, o conhecimento das diferenças regionais é de grande relevância para elaboração e implantação de políticas públicas.

“A partir dessa atualização, pacientes portadores de neoplasias malignas com risco de infertilidade terão a possibilidade de procriar após o tratamento. Mulheres e homens saudáveis também poderão planejar o momento ideal de suas vidas para se tornarem mães e pais, postergando-o com consideráveis níveis de sucesso através do congelamento de gametas”, ressaltou o diretor-tesoureiro do CFM e coordenador da Comissão de Reprodução Assistida,

clique para ampliar>clique para ampliarMembros da câmara técnica, na entrevista à imprensa. (Foto: CFM)

Avanço no uso de técnicas
O uso das técnicas de reprodução assistida, regulamentadas pela Resolução CFM nº 2.168/2017, tem crescido de forma consistente no País. É o que mostra o 10º Relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), elaborado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que compila números dos procedimentos realizados ao longo de 2016. No período, foram realizados 33.790 ciclos, com a transferência de 67.292 embriões para o útero de pacientes ou voluntárias.

As informações foram coletadas em 141 serviços cadastrados, em todas as regiões brasileiras, conhecidos também como clínicas de reprodução humana assistida. Os dados informam ainda o descarte de 55.381 embriões e a produção de 311.042 oocitos. No ranking nacional, os estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul se destacam pela maior produtividade neste segmento.

O relatório revela, também, que a taxa média de clivagem (como é chamada a divisão que dá origem ao embrião) nas clínicas brasileiras foi de 96%. Os valores apresentados foram compatíveis com valores preconizados em literatura, que é de acima de 80%. Já a taxa média de fertilização foi de 73% (ver Quadro 2). O percentual é compatível com os valores sugeridos em literatura internacional, que variam de 65% a 75%.

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