05/12/2005

Brasil e suas escolas médicas

"Não somos responsáveis apenas pelo que fazemos, mas também pelo que deixamos de fazer". Moliére





Certa vez, lá pelos idos de 1989, em meio a um movimento reivindicatório da categoria médica baiana, o governador do Estado, ao ser abordado pela imprensa local, indagando dele o que faria se os médicos entrassem em greve ou pedissem demissão coletiva, teria dito, com certa dose de ironia e desprezo: "Para mim, médico é como sal; branco, barato e encontro em todo o lugar".


Da mesma forma, na década de 60, quando os médicos, que não eram tantos como hoje, resistiam a trabalhar por preço vil, um ministro de Estado teria dito: "Providenciaremos a formação rápida e efetiva de tantos deles que, logo, todos virão de joelhos procurar trabalho a qualquer preço".


E isso parece ter se consumado. O Brasil acaba de alcançar um número recorde de escolas médicas. Com 149 cursos de medicina ultrapassou os EUA, perdendo apenas para a China com 150 escolas de medicina. Somente neste início de século foram criados 54 novos cursos de medicina, quase um por mês, elevando o número de vagas nos vestibulares para 13.153.


As causas dessa avalanche estão na LDB, de 20/12/96, e no Decreto 2.306, de 19/08/97, que proporcionaram condições extremamente liberais para que Estados e municípios pudessem decidir livremente sobre a criação de escolas de medicina e outras na área da saúde. A competência da União, fixada no Artigo 10, inciso IX da LDB, foi limitada exclusivamente ao sistema federal de Ensino Superior.


Ainda mais, uma sutil alteração feita pelo Decreto 1.302, de 8 de novembro de 1994, no apagar das luzes do governo Itamar Franco, tirou do Conselho Nacional de Saúde a prerrogativa de julgar a necessidade social dos cursos da área de saúde e emitir parecer vetando ou não novas escolas de medicina. Hoje, o ministro da Educação tem praticamente o poder total e, independente de qualquer posição que o CNS venha tomar, poderá aprova-las em caráter irrevogável e definitivo.


Por outro lado, um levantamento estatístico demonstrou que a maioria dos cursos recém-criados o foi por decisão interna dos Conselhos das Universidades particulares. Dos 149 cursos de medicina, 81 são do setor privado (54,36%). Isso prova que o poder político e econômico fala mais alto que a necessidade social desses cursos.


Nosso entendimento leva a dizer que o Brasil não necessita de mais escolas médicas, e sim de melhores escolas; não precisa de mais médicos, e sim de médicos bem preparados e qualificados.


O que não se pode permitir é que interesses políticos ou econômicos transformem os que integram uma profissão tão digna quanto sublime, em mercadoria ou máquinas... muito menos em sal.



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