16/07/2012

Atravessadores da saúde

Há tempos atrás, nem tão poucos nem tão muitos, períodos de inflação e controle de preços, ouvíamos falar diariamente dos famigerados ATRAVESSADORES.


Aproveitadores do sistema comercial que ATRAVESSAVAM os alimentos, hortaliças, verduras do produtor ao destino final, comprando dos primeiros a preços indescentemente baixos e revendendo aos segundos com taxas enormes, multiplicando seu ganho e explorando ambas as pontas do negócio. ERAM ELES QUE GANHAVAM O DINHEIRO.


Eram, entretanto, necessários para rodar a mercadoria, transportando-as às gôndolas de pequenos e médios mercados com rapidez. Ocupavam o nicho de mercado que surgia frente ao crescimento do consumo, falta de organização e primariedade dos pequenos e médios produtores, falta de associaitivismo dos mesmos e de mecanismos eficientes de controle dos órgãos governamentais.


Direitos do consumidor? Procons? CADEs? Não existiam ou eram inoperantes. Jornais e Fantásticos denunciavam e a população era convocada a FISCALIZAR. Por vezes "blitz" eram realizadas e uns poucos bode-expiatórios eram sacrificados.


E como era boa a oportunidade de adquirir os produtos diretos do produtor. Escolher as batatas ainda com terra, os tomates mais maduros ou os mais verdinho, as folhas retiradas diretamente do chão, os temperos e ainda levar uma "muda", conversar com o agricultor averiguando sua higiene, qualidade, honestidade, comprar exatamente o que se precisava E PAGAR O PREÇO JUSTO. Criar uma relação com o produtor que já passava a conhecer os gostos, manias, defeitos e qualidades dos fregueses. Que saudades dos: " - O que vai hoje dona Maria? - Hoje vai O DE SEMPRE seu João".


Pois esses exemplos de ontem, me remetem ao estado da SAÚDE SUPLEMENTAR no Brasil de hoje.


OS AGENTES DESTE SUPLEMENTO À SAÚDE de uma população, tão necessários para cobrir os furos e irresponsabilidades dos governos cegos à Carta Magna e por isso coniventes, SÃO OS VERDADEIROS ATRAVESSADORES DA SAÚDE.


Compram os serviços baratos de hospitais, clínicas, médicos, dentistas, fisioterapeutas e demais não menos importantes profissionais da saúde, formulando e impondo preços, pagando como e quando querem, com normas e burocracias crescentes e protelativas, revendendo-os aos consumidores a preços elevados, com reajustes atrelados a índices, idade, carências, contratos discutíveis, etc.


Um equilíbrio entre os lados desta relação é fundamental para que TODOS fiquem satisfeitos, porém o que vivemos há algum tempo é a deterioração deste equilíbrio. Consumidores (pacientes) pagam muito e produtores (médicos) ganham pouco. Ouvimos e dizemos isto todos os dias em nossos consultórios.


Então, quem está ganhando? Quem está ganhando é o ATRAVESSADOR.


Médico da família, aquele que atende a todos? Médico que acompanha a doença desde o inicio, sabe suas nuances e personalizações? Horário de atendimento quando o paciente precisa e está com a dor? Consulta completa com anamnese e exame físico dignos, diminuindo a necessidade de abusos dos exames complementares? Tratamento das doenças e não dos sintomas? Uma conversinha sobre como vai a família e os meninos que estão crescendo? E isto tudo pelo preço justo? Já está dando saudades.


Do outro lado convivemos com um verdadeiro cerceamento do exercício pleno da medicina. Necessidade de extensos e repetidos relatórios, justificativas e auditorias não independentes; restrição a exames e procedimentos nem sempre de maior custo; perda da primazia na escolha de materiais e medicamentos adequados ao maior benefício ao paciente; controles "administrativos" e divulgação dos mesmos com fins de intimidação; ausência de reajustes e de benefícios claros e cristalinos como insalubridade, 13º salário, seguros, etc.; bloqueio a novas tecnologias, independente dos benefícios que possam trazer em termos de custos, recuperação melhor e mais rápida; Glosas de procedimentos já realizados; atrasos nos pagamentos de contas médicas ou hospitalares sem justificativas ou remuneração do atraso e tantos outros empecilhos.


Resultado?


Os protagonistas desta cena, PACIENTES E MÉDICOS, viraram meros COADJUVANTES submetidos a todo tipo de interferência na sua SAGRADA RELAÇÃO.


Os pacientes, então, são submetidos a longas esperas por uma consulta. E com um médico que não conhecem. E que no retorno já será outro, pois aquele primeiro já se descredenciou ou foi descredenciado. E que os atendem rápido, pois existem mais um sem número de consultas (metas do dia) lá fora a esperá-los. E que mal lhes olham nos olhos ou lhes dão as mãos. E que escrevem rápido com letras ininteligíveis, pois as horas urgem. E Esperam 5, 10, 20 dias por uma liberação de exame ou cirurgia, quando não negados pela bem treinada secretária do plano de saúde. Sem dizer os planos que proliferam como água, e que SÓ DÃO DIREITO A CONSULTA, sem exames ou procedimentos. E outros que chegam a repassar ao profissional o valor de 16 reais por consulta; 5 reais por sessão de fisioterapia; 70 reais por uma procedimento anestésico.


Os bons profissionais não se dignam a continuar trabalhando nestas condições. E nem podem! Eles estão deixando de atender os beneficiários de convênios e planos de saúde para VOLTAREM AOS PRIMÓRDIOS do consultório. Neste ambiente retomam a verdadeira RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE com tempo e remuneração adequados para a satisfação plena de ambos os lados da mesa de exames.


E SEM ATRAVESSADORES !!!


Ah! Como era bom comprar as verduras diretamente do produtor!


Artigo escrito pelo médico ortopedista Décio de Conti.

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