31/01/2023
Ludhmila Abrahão Hajjar
Estabelecer verdades médicas exige investigações cuidadosas e repetidas por meio de experimentos bem planejados.
A História da Medicina está ligada às primeiras civilizações. Ainda que tenhamos o registro de práticas para lidar com ferimentos e doenças, como a trepanação craniana há mais 10 mil anos atrás, atribui-se à medicina egípcia o título de a mais antiga do mundo. Assim, o primeiro médico da história seria Imhotep (2655 a.C. – 2600 a.C.), que deixou um tratado com 48 casos médicos, organizados em secções, como diagnóstico e possibilidade de tratamento, no papiro de Edwin Smith. Chegamos hoje em 2023 denominando a Medicina como uma prática racional, rigorosa e sustentada pela ciência. Nós, médicos da atualidade, devemos atuar para prevenir, diagnosticar e tratar adequadamente os pacientes, para amenizar a dor e o sofrimento humano. A evolução da medicina nos traz muito mais possibilidades, de aumentar a eficiência do diagnóstico e das intervenções terapêuticas e favorece a nossa habilidade para selecionar o melhor caminho a ser seguido para cada paciente no conceito da medicina personalizada e de precisão.
Para a prática da Medicina, trazemos desde a Antiguidade, o conceito que os praticantes da arte de curar devem ser respeitados principalmente por seu compromisso com as necessidades de seu paciente e que ao lado da competência técnica e científica é necessário um compromisso com o humanismo e a ética. Hoje, devido à imensa complexidade técnico-científica da Medicina, cada vez mais é exigida a multidisciplinaridade, a ligação dos saberes, a compreensão das heterogeneidades e desejos dos pacientes e dos familiares; enfim, devemos agir e prosseguir como pontes ou elos.
Em 1992, surgiu o conceito da medicina baseada em evidências científicas, que muito nos auxilia na tomada da melhor decisão para o paciente. Ela reúne toda a fundamentação que a ciência traz para eleger para aquele paciente a melhor estratégia diagnóstica e de tratamento. Mais recentemente, somam-se à Medicina baseada em evidências, a medicina digital, a medicina de precisão e a inteligência artificial, inovações que ainda vão trazer mais segurança e melhores resultados aos pacientes. Porém, a revolução do conhecimento científico, a prática da ultra especialização e a competividade do mercado de trabalho, em um mundo em crise ética-social e moral, infelizmente colocam o paciente em uma vulnerabilidade maior, em um tempo que deveríamos oferecer ao paciente uma Medicina mais resolutiva e com melhores desfechos a longo prazo.
Defendemos e ensinamos nas escolas médicas a responsabilidade com a vida dos nossos pacientes, o compromisso com a ciência, buscamos levar a informação adequada, e ao mesmo tempo, aprendemos todos os dias com nossas experiencias a valorizar os desejos dos pacientes e de seus familiares, dentro de uma visão humanística e ética deve liderar nossas ações. Todos tendem a acreditar naquilo que os outros nos dizem a respeito de suas experiências pessoais. Mas separar causa e efeito de uma coincidência pode ser difícil. Se as pessoas lhe contarem que o produto X curou o câncer, a artrite ou qualquer outra doença, ou que o composto em questão que muitas vezes se trata de um misto de medicamentos, sais minerais e vitaminas não avaliados e não testados de maneira adequada, busque analisar melhor a informação. Procure reconhecer no profissional a postura correta de recomendar estratégias de investigação e de tratamento já validadas, seguras e comprovadas.
Estabelecer verdades médicas exige investigações cuidadosas e repetidas por meio de de experimentos bem planejados, e não por meio de relatos de coincidências percebidas erroneamente como causa e efeito. É por isso que a evidência científica é criada a partir de estudos progressivamente mais complexos, e que não raramente, necessitam de 10 a 15 anos para chegarem a uma conclusão. A saúde é o estado de completo bem-estar físico, mental e social, e seu alcance depende de uma série de medidas, que envolvem o autocuidado, a boa alimentação, a prática regular de exercícios físicos, os bons hábitos de vida e a realização periódica de avaliação médica e de exames. Um frasco de medicamentos ou um composto não têm a capacidade de isoladamente prevenir doenças e de evitar o envelhecimento. Portanto, a Medicina em 2023 deverá ainda ser mais eficiente se tivermos como princípios a evidência científica em um ambiente de inovação e humanista.
*Ludhmila Abrahão Hajjar (CRM-SP 103.034 e CRM-DF 11.571) é Intensivista e cardiologista; professora de cardiologia da FMUSP, chefe da cardiologia da ICESP e coordenadora da cardio-oncologia do InCor (SP).
**Coluna Receita de Médico, publicada no jornal O Globo (RJ) em 31 de janeiro de 2023.
***As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.